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Concentração, Financiamento e Integração Vertical na área dos Veículos Autónomos

Concentração, Financiamento e Integração Vertical na área dos Veículos Autónomos - Opinião de Marc Amblard

Os Veículos Autónomos (AV) atingiram o ponto mínimo da ‘depressão da desilusão’ (trough of disillusionment) do Hype Cycle da Gartner de 2019-2020. Desde meados do ano passado, observamos uma aceleração do financiamento e da valorização das empresas, o que levou a algumas aquisições. Mais importante, isto está a dar ainda mais destaque a alguns players importantes, que aceleram o desenvolvimento da tecnologia e a implementação de projetos-piloto. Além disso, este grupo seleto de empresas está a agregar um número crescente de fabricantes, quer de veículos ligeiros, quer de pesados, à sua volta – estes estão a mudar o seu foco para os veículos elétricos (EV) e para o desenvolvimento de software.

Os ‘grandes’ da condução autónoma angariaram milhões nos últimos meses

Nos últimos 9 meses, cinco das maiores empresas de desenvolvimento de Sistemas de Condução Autónoma (Autonomous Driving System – ADS) angariaram um total de quase 4 mil milhões de dólares. A Cruise beneficiou da maior ronda de investimento, com 2,75 mil milhões de dólares arrecadados, em grande parte da Microsoft e da gigante Walmart, atingindo uma valorização que ronda os 30 mil milhões de dólares! Da mesma forma, Aurora, Pony.ai, WeRide e Didi angariaram, cada uma, valores entre 300 e 400 milhões, nos últimos meses.

Também podemos suspeitar que os fabricantes que estabeleceram parcerias com estas empresas se tenham comprometido a efetuar elevadas contribuições financeiras pelo direito de acesso a tecnologia para os pilotos, a médio prazo, e para produção, a longo prazo.

Outra solução para angariar fundos é abrir o capital. A start-up sino-americana TuSimple, fabricante de camiões autónomos, acaba de ser introduzida no mercado de ações dos EUA, angariando cerca de 1,1 mil milhões de dólares e atingindo uma valorização de 8,5 mil milhões. Da mesma forma, a Argo AI, da qual Ford e Volkswagen detêm, cada uma, 40%, considera fazer o mesmo ainda este ano. Isto poderia reduzir a pressão sobre os dois fabricantes, já que a Argo AI precisa de garantir financiamento para a sua expansão.

Noutras áreas no campo de veículos autónomos, as empresas de sistemas Lidar também têm estado muito ativas na frente financeira. Pelo menos seis abriram o capital, fundindo-se com SPACs [special-purpose acquisition company – empresas formadas estritamente para captar recursos com o objetivo de adquirir uma empresa existente] e angariaram cerca de dois mil milhões de dólares, em conjunto, nos últimos 9 meses. As empresas de Lidar tiraram proveito da ‘onda SPAC’ e da renovação da ‘moda’ dos AV, conseguindo aumentar a sua avaliação entre 1,4 e 3,4 mil milhões de dólares.

As avaliações acima mencionadas beneficiam de um grande crescimento dos mercados financeiros, mas são difíceis de justificar, especialmente para start-ups de Lidar que têm uma proposta de valor reduzida e ambições de mercado coincidentes. No entanto, estas avaliações permitem injeções de dinheiro significativas (com diluição limitada), que irão acelerar o desenvolvimento de soluções AV para transporte de passageiros e mercadorias.

Os ‘grandes’ estão a integrar-se verticalmente

As grandes rondas de financiamento também fornecem aos criadores de ADS os meios para dominarem melhor os principais componentes das suas soluções.

Enquanto a Waymo desenvolveu internamente os seus próprios Lidars, radares e câmaras e especificou o seu hardware, outros integraram progressivamente start-ups de sensores. No ano passado, a Cruise adquiriu a Astyx (radar), para complementar a Strobe (Lidar), adquirida em 2017. Da mesma forma, a Aurora ganhou o controlo das start-ups de Lidar Blackmore (2019) e Ours (2020).

As principais empresas de ADS também desenvolveram as suas próprias soluções de simulação e de mapeamento e estão a especificar a sua plataforma computacional para garantir uma melhor integração geral. Os players de ADS, como a Waymo, a Argo AI ou a WeRide, fornecerão, aos fabricantes de veículos seus clientes, arquiteturas de referência para a combinação de sensores e tecnologia de computação e mapeamento.

Para alguns players, a integração vertical vai além da tecnologia de condução autónoma, para incluir veículos. Do lado do transporte de passageiros, Cruise (com a GM e a Honda) e Zoox apresentaram os seus robotáxis e pretendem operar este negócio de mobilidade. Da mesma forma, Navya, Easymile e outros lançaram os seus próprios autocarros autónomos há alguns anos. Quanto ao transporte de mercadorias, já começaram a operar os veículos de entregas last mile da Nuro e Neolix.

No início deste ano, a Cruise fez uma jogada interessante, com a aquisição da Voyage, sediada em Silicon Valley, o que pode ser considerada integração vertical derivada. A decisão não pode ser justificada pela tecnologia de condução autónoma da Voyage, mas sim pelo seu acesso ao mercado – a Voyage tem em circulação autocarros autónomos, em comunidades de aposentados nos EUA. Estes locais provavelmente serão também usados para testar o robotáxi Origin da Cruise.

Agregação à volta de um grupo seleto de ‘grandes’ da condução autónoma

As fabricantes realocaram parcialmente o seu orçamento dedicado à Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) de veículos autónomos para acelerar o desenvolvimento de veículos elétricos, um dado obrigatório tendo em conta as normas regulamentares de CO2 e as tendências de mercado, bem como para desenvolver as competências de software, outro movimento crítico.

Tendo em conta os montantes e o tempo necessários para colocar no mercado tecnologia AV sólida – as principais empresas de ADS gastam alegadamente entre 500 a 1000 milhões de dólares por ano – os fabricantes beneficiam se trabalharem em conjunto com equipas de especialistas para desenvolverem a sua tecnologia de condução autónoma.

Como consequência, observamos a concentração de fabricantes à volta dos principais criadores de sistemas de condução autónoma, nos últimos meses (ver diagrama abaixo).

Dependendo do seu foco, a maioria das principais empresas de ADS têm parcerias com fabricantes de veículos de passageiros ou de camiões. No entanto, a Waymo e Aurora conseguiram firmar colaborações com os dois tipos de fabricantes – veículos ligeiros e pesados – que correspondem aos seus objetivos duais.

Embora os fabricantes estejam, em geral, a colocar o seu ‘futuro AV’ nas mãos das principais empresas de ADS, continuam, paralelamente, a avançar incrementalemente nos seus planos de sistemas de assistência à condução. A maioria está a implementar soluções de Nível 2, e alguns aventuram-se no Nível 3, como é o caso da Honda e da Mercedes, depois da tentativa da Audi ter sido limitada pelos regulamentos. Mas a meta de longo prazo de atingir o Nível 4 envolverá algum tipo de parceria com os criadores de ADS.

Em suma, tem-se tornado óbvio que o desenvolvimento, intensivo em capital, da tecnologia de ADS e AV será conduzido por um conjunto de empresas que oferecerão ADS aos fabricantes de veículos automóveis, ou desenvolverão as suas próprias frotas de veículos autónomos.  

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