Joaquim Ramos Pinto
Presidente da Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA)
Rute Candeias
Responsável pela pasta dos assuntos do Oceano na Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA)
Uma responsabilidade de cada cidadão e de toda a sociedade.
Diretiva Europeia sobre o Plástico descartável
Ao abrigo da diretiva europeia que proíbe a comercialização de plásticos descartáveis nos estados membros europeus e pela transposição desta legislação para a lei portuguesa, a partir de dia 3 de julho estes produtos passaram a ser proibidos em Portugal: entre outros produtos de ou com plástico, talheres, palhinhas, cotonetes, agitadores, varas de balões ou esferovites para recipientes de comida
Recorde-se que em 2019 Portugal tinha se antecipado à legislação europeia com uma proposta de lei sobre este assunto, mas o surgimento da pandemia veio atrasar a sua aprovação e torná-la menos ambiciosa.
A ASPEA considera que o problema da contaminação do oceano pelo lixo de plástico é um assunto de extrema importância que tarda pela demora na regulamentação e que deverá ser encarado como uma das prioridades políticas nomeadamente através da implementação de campanhas de Comunicação e Educação Ambiental com expressão mediática, a exemplo de outras campanhas.
A Era do Descartável
Embora a promulgação desta lei seja um passo importante no combate à poluição de plástico, há vários aspetos a ter em consideração para que consigamos caminhar para uma economia verdadeiramente circular.
Hoje em dia, nos países desenvolvidos, a maioria dos produtos, sobretudo na área da tecnologia e indústria têm uma curta duração, fruto de um estilo de vida acelerado em que se tem pressa para vender, pressa para se ganhar dinheiro, pressa para se consumir, pressa para se adquirir o modelo mais avançado ou a aquela roupa que está agora na moda.
Não nos podemos esquecer que os recursos naturais são limitados e que o planeta não suporta a quantidade de resíduos que são produzidos a um ritmo frenético e inconsciente.
Mais do que proibir, é fundamental levar a sociedade a repensar nos seus hábitos diários, nas suas escolhas e incentivar as pessoas a fazer parte da solução de uma forma verdadeiramente responsável, logo na opção da compra, recusando produtos em embalagens de plástico.
Quando se proibe a utilização dos plásticos descartáveis, mas se incentiva a sua substituição por outro descartável (de papel ou de material biodegradável), poderemos estar a criar outros problemas: o papel e cartão, quando contaminados por gordura não são recicláveis no circuito do papel e não nos podemos esquecer que continuam a ter origem num recurso natural que poderá ter como destino um aterro. Por outro lado as soluções supostamente biodegradáveis, para além de não terem um circuito de reciclagem dedicado e como tal poderem dar azo a contaminação da reciclagem de outros resíduos, revelam-se insatisfatórias pelo tempo de degradação destes materiais, de muitos meses ou anos. As pessoas que adquirem estas supostas soluções alternativas, fazem-no convencidas que estão a contribuir para a solução, mas será que estão? Irão continuar a colocar os cotonetes de bambu na sanita? E onde deverão depositar o saco biodegradável transparente feito de amido de milho?
Os R’s
Na nossa opinião, os R’s que deverão ser enfatizados são “recusar”, “repensar”, “reutilizar”, “responsabilizar-se”, “recuperar” e então por fim, “reciclar” aquilo que não conseguimos evitar consumir e que não conseguimos reutilizar ou reparar.
Em relação à reciclagem, o nosso país ainda está muito aquém das metas estabelecidas. A União Europeia estabeleceu que em 2025 os Estados-membros devem chegar a uma taxa de 55% na reciclagem efetiva e em 2030, essa taxa passa para 65%.Seria importante perceber porque é que a taxa de reciclagem continua tão baixa. Apesar das várias campanhas que têm sido realizadas quer nos meios de comunicação social quer em projetos educativos, a taxa efetiva de reciclagem não chega aos 24%, com apenas 13% a corresponder ao que vem dos ecopontos (*1).
(*1) Fonte notícia da TSF, Agosto de 2020.
A Reciclagem na Suécia
Nos países do Norte da Europa, a reciclagem faz parte da vida de toda a população. Na Suécia, p.ex.. a taxa de reciclagem é superior a 90%, com parte dos resíduos utilizados na produção de energia elétrica. A Suécia é muito rígida na gestão dos seus resíduos, penalizando os cidadãos que não separam o lixo corretamente ou que produzem grandes quantidades de lixo, com o agravamento das taxas de recolha. Por outro lado, a Suécia compensa os cidadãos que têm melhor desempenho com a redução na taxa de eletricidade e nos custos dos transportes públicos.
A Pandemia Covid-19 e o plástico de uso único
A pandemia de covid-19 veio agravar ainda mais esta questão da contaminação de plástico no Oceano: as máscaras descartáveis que se encontram frequentemente abandonadas na rua e são arrastadas para o mar; o aumento da utilização de plástico descartável por questões de higiene e segurança alimentar e o aumento do uso de embalagens nos serviços take way e nas compras online.
Importa frisar que o plástico não é um inimigo, o plástico é um material indispensável nas nossas vidas que nos trouxe conforto e comodidade, que nos permite prevenir o desperdício alimentar, que é utilizado na medicina ou na prevenção de contaminações. O problema principal é o plástico de uso único, o qual muitas vezes podemos evitar, e a forma como gerimos os nossos resíduos.
Impacto nos Ecossistemas Marinhos
Estima-se que cerca 15 milhões de toneladas métricas de plástico cheguem ao oceano todos os anos e que roubam a vida a milhares de organismos marinhos, por ingestão, por sufocamento ou por ficarem presos, inclusive em artes de pesca abandonadas. As grandes vítimas são sobretudo aves marinhas, tartarugas e mamíferos marinhos, mas todos os organismos são afetados.
Oferta Educativa da ASPEA
A ASPEA, aborda esta questão do plástico marinho no programa educativo de oficinas pedagógicas Educoceano que é realizado nas escolas e que entre várias atividades, inclui uma limpeza de praia. É também um dos temas do projeto Blue Wave, projeto financiado pelos EEAGrants em que a ASPEA é parceira e o MARE da Universidade de Coimbra é a entidade promotora. O projeto inclui ações de formação para professores, oficinas pedagógicas para alunos, limpezas de praia e um concurso de empreendedorismo para jovens.
Às vezes é preciso dar um passo atrás para se darem dois passos em frente
Talvez esteja na altura de repensar como se vivia há 50 anos atrás e desafiarmo-nos a eliminar alguns objetos descartáveis do nosso dia-a-dia. O consumidor tem muito poder, e é quem dita as leis do mercado. Comprar a granel, utilizar sacos reutilizáveis, evitar alimentos embalados, utilizar um cantil de água, são alguns dos hábitos que poderá desafiar-se a adotar. Primeiro estranha-se, depois entranha-se.
Nós na ASPEA aceitámos o desafio “menos plástico no nosso dia-a-dia”, junte-se a nós!
Sabia que…
- Uma palhinha de plástico descartável é produzida em menos de 1 minuto, utilizada pouco mais de 5 minutos e que poderá demorar cerca de 300 anos a desagregar-se.
- Um dos alimentos favoritos das tartarugas marinhas são as medusas. Dentro de água, ao sabor das ondas um saco de plástico assemelha-se a uma medusa e é com frequência, erroneamente consumido pelas tartarugas.
- No plástico à deriva incrustam-se pequenos organismos que irão conferir “sabor a mar” ao plástico, pelo que muitos animais o confundem com alimento.
- Por ano são produzidas cerca de 300 milhões de toneladas de resíduos plásticos, o equivalente praticamente ao peso de toda a população humana?
- Os têxteis são uma das principais fontes de poluição por microplásticos para ambientes aquáticos: um grama de roupa sintética liberta 400 fibras microplásticas a cada 20 minutos de utilização, podendo resultar na perda total de mil milhões de fibras por ano para um casaco que pesa cerca de um quilo?
Joaquim Ramos Pinto. Licenciado em Educação do Ensino Básico pela Universidade de Aveiro; Diploma de Estudos Avançados obtido pela Universidade de Santiago de Compostela, onde iniciou doutoramento no âmbito do Programa Interuniversitário de Doutoramento em Educação Ambiental e a frequentar, atualmente, a etapa de tese do Programa de Doutoramento em Educação. Professor em mobilidade ao abrigo do protocolo entre o Ministério da Educação e Ministério do Ambiente, na coordenação de projetos de Educação Ambiental de âmbito nacional, Europeu e CPLP. Integrou a comissão organizadora e científica de várias jornadas, conferências e congressos de Educação Ambiental de âmbito nacional e internacional, e onde apresentou várias comunicações. Tem várias publicações em livros e revistas no âmbito de projetos e investigações que desenvolveu. Atualmente é presidente da Associação Portuguesa de Educação Ambiental
Rute Candeias. Licenciada em Biologia Marinha pela Universidade do Algarve, pós-graduada em Etologia e em Ciências e Tecnologias do Ambiente e formadora certificada. É responsável pela pasta dos assuntos do Oceano na Associação Portuguesa de Educação Ambiental – ASPEA e trabalha há cerca de 20 anos como Educadora Ambiental em projetos próprios ou para outras entidades, nomeadamente em assuntos ligados à Conservação dos Oceanos e à literacia científica. Tem desenvolvido vários projetos relacionados com as alterações climáticas, com os resíduos e com o lixo marinho em particular.