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Green Future-AutoMagazine

O novo portal que leva até si artigos de opinião, crónicas, novidades e estreias do mundo da mobilidade sustentável

GFAM

Voz ao Utilizador - Best Of 2020

Voz ao Utilizador 2020 – Best Of

Ao longo do ano, a equipa do Green Future AutoMagazine deu voz a vários utilizadores de veículos elétricos – pessoas com perfis muito distintos, mas que têm em comum o facto de se terem rendido à mobilidade do futuro.

Recorde as aventuras e experiências dos convidados nesta edição especial da rubrica ‘Voz ao Utilizador’.

Opinião de Pedro Gil de Vasconcelos

E quando só houverem quatro manequins e muitos fatos?

Opinião de Pedro Gil de Vasconcelos

A pujança de um mercado pode definir-se pela quantidade de marcas que nele operam. O mercado cresce na razão directa da quantidade de negócio que é capaz de realizar e naturalmente quanto mais negócio, mas capacidade de atrair novos operadores e investidores. Claro que estes só existem se existirem consumidores que os suportem.

Para os consumidores a proliferação de marcas é boa. Têm mais escolhas, mais e diferentes produtos e a tendência natural é que os preços sejam mais difíceis de serem concertados pelos protagonistas do mercado. Ou seja, num panorama comercial realmente livre e em crescimento a cartelização é um exercício difícil de concretizar.

Por outro lado, um mercado maduro tende a criar os chamados ‘gigantes’. Se olharmos para, por exemplo, o panorama de media nos finais do século passado, notamos isso. Os órgãos de comunicação social, os principais, garantiram a sobrevivência unindo-se em redor de grandes grupos que juntaram rádios, jornais e estações de televisão. A chegada da Net a isso obrigou e esses mesmos grandes grupos passaram também a deter uma importante fatia desse negócio. 

Perdeu-se pluralidade e se olharmos além, vemos que também se perdeu independência. Os recentes acontecimentos nos Estados Unidos são disso um bom exemplo. Para os consumidores a perda de liberdade é real. A escolha é limitada, cada vez mais limitada.

Ora no sector automóvel estamos a assistir a algo parecido. O mercado amadurece mais rapidamente do que era previsto. Novas tendências, modelos de negócio que ‘caducam’, diferentes produtos ditam novas visões de mobilidade.

Por exemplo, a necessidade de realizar revisões ao motor em cada 10, 20 ou 30 mil quilómetros, deixa de existir com a proliferação de motores eléctricos. O modelo de negócio dos concessionários tem que se reinventar e o dos fabricantes também.

O recente anúncio da fusão do Grupo Fiat, que já detinha quase tudo quanto era marca italiana e que ‘absorveu’ a Chrysler, a Dodge e a Jeep, com a Peugeot é um bom exemplo de como a maturidade deste mercado se está a transformar em concentração. No fundo, este é mais um acto da ‘novela’ de fusões a que temos assistido nos últimos anos. A sobrevivência a isso obriga.

Quando o mercado crescia, quem comprava um certo modelo sabia que estava a comprar algo que era distinto, havia uma personalidade MG, Jaguar, Alfa-Romeu, Porsche e até nos utilitários havia a mística italiana e francesa e a construção de Saabs ou Volvos era financiada com coroas suecas. 

A realidade hoje é completamente diversa, quase me fazendo lembrar um desfile de moda, em que muitos convidados ficaram de fora e em que três ou quatro costureiros se entendem para acertarem os pormenores dos desfiles em que apresentam as novidades:

 Um fato de fino corte italiano vestido por um manequim alemão, um americano que vive em Itália e veste uma roupa feita em frança. Enquanto lá atrás, nos bastidores, três ou quatro manequins vão trocando de roupa, colocando perucas e maquilhagens para parecerem muitos.

O público maravilha-se com tantas escolhas e do lado de fora do recinto aguarda-os um mundo que se move cada vez mais depressa.

Por opção do autor, este texto não foi escrito de acordo com as regras do novo Acordo Ortográfico.

Pedro Gil de Vasconcelos é licenciado em Cinema e Audiovisuais, tendo sido jornalista da RTP, onde participou e liderou diversos projetos, muitos deles ligados à mobilidade. Atualmente, lidera a Completa Mente – Comunicação e Eventos Lda.

Procura leva Volvo a triplicar capacidade de produção de elétricos

A Volvo Cars anuncia o aumento da capacidade de produção de automóveis elétricos na sua fábrica de Gent, na Bélgica, como resposta ao aumento de procura da gama de modelos eletrificados ​Recharge, cujas vendas, em percentagem do total de unidades comercializadas pela marca, mais que duplicaram em 2020, relativamente ao ano anterior. 

Em 2022, estima-se que a capacidade de produção de viaturas elétricas na fábrica de Gent seja o triplo do valor atual, ocupando cerca de 60% da capacidade total da unidade.

Depois do XC40 Recharge, o primeiro automóvel 100% elétrico da marca sueca, a fábrica belga da Volvo Cars prepara-se para receber um segundo modelo elétrico a bateria, que terá por base a plataforma CMA. O início de produção está previsto iniciar-se ainda este ano.  Além do XC40 Recharge, a fábrica de Gent produz atualmente uma versão híbrida plug-in do mesmo modelo.

“O nosso futuro é elétrico e os clientes estão a apreciar a nova gama Recharge. À medida que continuamos a eletrificar a nossa linha e a aumentar a nossa capacidade de produção elétrica, Gent está a tornar-se numa fábrica pioneira na nossa rede de produção global”, afirma Javier Varela, diretor de Operações Industriais Globais e Qualidade da Volvo Cars.

O Volvo XC40 Recharge é o primeiro 100% elétrico da marca sueca.

A marca sueca ambiciona tornar-se numa referência entre os construtores de veículos elétricos premium, nos próximos anos, período no qual irá apresentar vários modelos. Em 2025, espera que 50% das suas vendas mundiais sejam de automóveis elétricos, com a restante quota a ser preenchida por modelos híbridos.

Embora Gent seja a primeira fábrica da Volvo Cars a produzir automóveis totalmente elétricos, a empresa também tem planos para aumentar a capacidade de produção destas unidades noutros locais do mundo.

No mês passado, a Volvo também anunciou que irá montar motores elétricos na sua fábrica de motores em Skövde, na Suécia, sendo aqui que pretende estabelecer a produção interna destes motores, em meados da década.

Fonte: Volvo Cars

Nio lança sedan ET7 e anuncia baterias de estado sólido para 2022

Durante o Nio Day, realizado a 9 de janeiro, a startup chinesa Nio apresentou o seu quarto automóvel elétrico, o ET7, um sedan baseado no concept car Nio ET Preview, apresentado em 2019 no Salão Automóvel de Xangai.

Com um design fundamentalmente desportivo, um desempenho muito apreciável e um conjunto de características tecnologicamente avançadas, o ET7 é disponibilizado – para já – com duas opções de bateria: 70 kWh, que confere uma autonomia de mais de 500 quilómetros, e 100 kWh, que permite percorrer mais de 700 quilómetros (NEDC).

O automóvel utiliza um motor síncrono de íman permanente de 180 kW no eixo dianteiro, e um motor de indução de 300 kW no eixo traseiro, para uma potência combinada de 480 kW e 850 Nm de binário. Acelera dos 0 aos 100 km/h em 3,9 segundos.

A nível de tecnologia, está equipado de série com suspensão pneumática inteligente, aquecimento, ventilação e massagem em todos os bancos, tejadilho de vidro, painel de instrumentos de 10,2 polegadas e ecrã central de 12,8 polegadas, além de 23 colunas de som. A Nio destaca ainda as janelas sem moldura e as saídas de ar invisíveis, tanto nos bancos dianteiros como nos bancos traseiros. O Nio ET7 é também, alegadamente, o primeiro automóvel a utilizar uma chave digital UWB.

Um dos grandes destaques do ET7 é a tecnologia de condução autónoma, que inclui várias soluções de última geração: 33 sensores integrados na carroceria, doze sensores de ultra-sons, onze câmaras, cinco radares, duas unidades de posicionamento e LiDAR. Os recursos de software são disponibilizados por assinatura, com uma mensalidade de 680 yuan (cerca de 86,5 euros).

Bateria de estado sólido em 2022

A Nio também anunciou oficialmente que disponibilizará, como opção para os seus automóveis elétricos, uma inovadora tecnologia de baterias de estado sólido, com capacidade de 150 kWh, a partir do quarto trimestre de 2022.

A startup chinesa começou com a bateria de 70 kWh em 2018, introduzindo a bateria de 84 kWh no ano seguinte. No final de 2020, passou a disponibilizar baterias de 100 kWh.

Os automóveis mais antigos dos (agora) quatro modelos da Nio podem ser atualizados com uma bateria de maior capacidade, o que também deverá acontecer com as novas baterias de 150 kWh. Por exemplo, o NIO ES8 de 2018, de primeira geração, poderá atingir uma autonomia de mais de 730 quilómetros (NEDC) com esta bateria de estado sólido. Os modelos de anos posteriores, mais eficientes, atingirão um alcance ainda maior: 850 quilómetros no caso do NIO ES8, 900 quilómetros para o NIO ES6, e 910 quilómetros para o EC6.

Já o novo Nio ET7, quando equipado com a bateria de 150 kWh, será capaz de percorrer mais de 1.000 quilómetros (NEDC) com uma carga única.

A marca chinesa afirma que as novas baterias de estado sólido de 150 kWh têm uma densidade de energia ultra-alta de 360 ​​Wh/kg, 50% superior à densidade da atual bateria de 100 kWh.

A marca chinesa de automóveis elétricos planeia chegar ao mercado europeu ainda em 2021.

Mercedes-Benz EQS estreia sistema MBUX Hyperscreen

Revelado em 2018 no atual Classe A, o MBUX (Mercedes-Benz User Experience) equipa atualmente mais de 1,8 milhões de automóveis ligeiros de passageiros da marca bávara. A segunda geração deste sistema, que integra capacidade de aprendizagem com recurso a inteligência artificial, foi lançada no Classe S. Agora, em 2021, o sedan 100% elétrico Mercedes-Benz EQS estreará, como opção, o MBUX Hypersecreen, um sistema de informação e entretenimento num ecrã curvilíneo de 56 polegadas que se estende a toda a largura do habitáculo.

O interface é adaptável e integra oito núcleos de processamento (CPU), 24 gigabytes de memória RAM e 46,6 gigabytes por segundo de largura de banda RAM. Configurável até sete perfis, é “o cérebro e o sistema nervoso do carro”, nas palavras de Sajjad Khan, CTO do Daimler Group. “O MBUX Hyperscreen tem continuamente a capacidade de conhecer melhor o cliente, oferecendo infoentretenimento personalizado e à medida, sem que o ocupante tenha de clicar ou ‘fazer scroll‘ em qualquer situação”, acrescentou.

Mercedes-Benz Vision EQS

O ecrã não funciona apenas para o condutor, mas também para o passageiro, que tem a sua própria área dedicada – aqui, as funções de entretenimento só estão disponíveis durante o movimento se a legislação nacional o permitir. Se o banco do passageiro não estiver ocupado, este painel assume uma função decorativa, apresentando um padrão animado com as estrelas da Mercedes-Benz.

O sistema usa tecnologia OLED neste painel e também no painel central. Para o condutor, uma nova versão digital do “display clássico do cockpit” com gráficos estilizados num esquema de cores de azul/laranja.

Através do que a marca germânica denomina ‘camada zero’, as aplicações mais importantes são sempre fornecidas no nível superior e numa vista descritiva. O sistema oferece inúmeras funções completas, e de forma a reduzir as etapas de interação, a Mercedes-Benz desenvolveu um interface de utilizador que recorre a inteligência artificial para disponibilizar opções em função da situação e do contexto.

O sistema MBUX apresenta proativamente determinadas funções em momentos particulares, com a perceção em função do contexto a ser constantemente otimizada pelas alterações na zona circundante e pelo comportamento do utilizador. Mais de vinte funções adicionais – por exemplo, um programa de massagem ativa que sugere níveis de regulação da altura da suspensão – são automaticamente fornecidas no momento em que são relevantes.

Uma câmara multifuncional e um sensor de luz ajudam a adaptar a iluminação às condições ambientais. O ecrã é construído em silicato de alumínio, resistente a riscos, com uma placa de cobertura com dois revestimentos, para reduzir os reflexos e facilitar a limpeza. Pontos de ruptura pré-determinados e uma estrutura em favo de mel garantem a segurança dos utilizadores em caso de acidente.

Fonte: Mercedes-Benz

Opel inicia o ano com campanha centrada nos elétricos

A Opel arranca para o novo ano com a inauguração, no dia 11 de janeiro, da campanha ‘Electric Days’, centrada nos seus modelos elétricos e híbridos plug-in, para clientes particulares e empresariais, que inclui reduções de preços até 6.000 euros e manutenção sem encargos durante três anos.

O Opel Corsa-e elétrico a bateria e o Opel Grandland X Hybrid plug-in são os modelos centrais da campanha dirigida aos clientes particulares. A marca germânica adiciona uma valorização de retoma aos incentivos públicos para a compra de veículos elétricos. É ainda acrescentado um programa completo de manutenção sem custos durante três anos, em ambos os modelos.

Para clientes empresariais, a campanha abrange o Opel Corsa-e, o Opel Grandland X Hybrid, o Opel Zafira-e e o furgão elétrico Vívaro-e. Prevê contratos de 48 meses/60.000 quilómetros com condições especiais que incluem Assistência em Estrada 24 Horas, substituição ilimitada de pneus e manutenção sem custos. No âmbito desta campanha ‘Electric Days’, as rendas mensais propostas pela Opel através da Free2MoveLease são também mais vantajosas: 278 euros para o Corsa-e, 368 euros para o Grandland X Hybrid, 450 euros para o Zafira-e e 349,50 euros para o comercial Vívaro-e (montantes sem IVA).

A campanha estará em vigor durante o mês de janeiro de 2021.

Eletrificação da gama acelera em 2021

A atual linha de produtos da Opel com motorização elétrica inclui cinco modelos em múltiplas versões: o Opel Corsa-e a bateria, o Opel Grandland X Hybrid (plug-in, tração dianteira, 225 cavalos), o Opel Grandland X Hybrid4 (plug-in, tração integral, 300 cavalos), o Opel Zafira-e a bateria (monovolume de passageiros até nove lugares) e o comercial Opel Vívaro-e a bateria (furgão comercial Cargo, Cabina Dupla, Plataforma e versão de passageiros).

Em 2021, a Opel acrescentará à gama de modelos elétricos os modelos Mokka-e, Combo-e Life, e os comerciais Combo-e e Movano-e. Este ano, a marca alemã passará também a ter uma oferta completa de soluções de motorização elétrica em toda a sua gama de veículos comerciais.

Em 2024, todos os modelos Opel possuirão pelo menos uma versão eletrificada, a bateria ou híbrida plug-in.

Fonte: Opel

Eletrificados representam já 30% das vendas da BMW em Portugal

Durante o ano de 2020, o BMW Group reforçou a sua estratégia de eletrificação, tendo feito uma aposta significativa numa frota mais ecológica e sustentável, com o lançamento de doze veículos eletrificados.

Em 2020, foram transacionados 145.417 automóveis de passageiros e 29.208 motos em Portugal, o que corresponde a uma quebra superior a 31% face a 2019. As três marcas do BMW Group – BMW, Mini e BMW Motorrad – venderam 14.415 unidades em Portugal (-27% face a 2019), acima do desempenho médio do mercado.

A BMW registou 10.519 unidades vendidas em Portugal em 2020, o que corresponde a um decréscimo de 25% face ao ano de 2019 – uma performance superior ao mercado automóvel, que registou uma quebra de 35%.

De acordo com a BMW, a constante aposta na gama de novos produtos eletrificados foi uma das principais razões pelo bom desempenho da marca durante este ano, representando atualmente 30% das suas vendas totais, com 3.099 unidades vendidas em 2020 – um aumento de 23% em relação ao ano de 2019.

É de registar que o modelo BMW 330e berlina foi o híbrido plug-in mais vendido no mercado nacional em 2020, com 1.169 unidades matriculadas.

Mini: modelos eletrificados já representam 30% das vendas da marca em Portugal

A Mini registou um total de 1.794 unidades vendidas, o que corresponde a um decréscimo de 30% face a 2019. Este resultado continua a ser condicionado pelo facto de já não existirem motorizações a gasóleo nos modelos Mini (3 e 5 portas) e Mini Cabrio, assim como pelo contexto de pandemia.

A Mini lançou em 2020 o seu primeiro modelo totalmente elétrico, o Mini Cooper SE 3 Portas (Mini Electric). O modelo revelou-se um sucesso comercial, terminando o ano com 235 unidades vendidas, que correspondem a 13% do total de vendas da marca britânica em Portugal.

O modelo mais vendido foi o Mini Countryman, tendo registado um total de 601 unidades, 368 das quais na versão híbrida – a mais vendida da marca pelo segundo ano consecutivo. Atualmente, os modelos Mini eletrificados representam 30% do total das vendas da marca em Portugal.

Fonte: BMW

Entrevista com Lincoln Paiva

Entrevista: Lincoln Paiva, fundador e presidente do Instituto Green Mobility no Brasil

Por Carolina Caixinha

O Green Future AutoMagazine entrevistou Lincoln Paiva, presidente e fundador do Instituto Green Mobility do Brasil e especialista em Gestão de Cidades na Universidade de São Paulo.

Como presidente e fundador do Instituto Green Mobility no Brasil, pode partilhar com os leitores do Green Future quais os aspetos mais relevantes da instituição, no sentido da preservação do nosso planeta, de um futuro mais verde e da construção de cidades mais inteligentes?

Quando fundei o Green Mobility, em 2008, há 12 anos, imaginava que a solução para as cidades, sob o ponto de vista da sustentabilidade do planeta, passaria por uma modificação na motorização dos carros, no powertrain, numa economia de baixo carbono e na alteração da matriz energética. Desde então percebi que não se tratava apenas da tecnologia, mas também do comportamento dos seres humanos. A tecnologia já nós temos. No Brasil os carros são híbridos, circulam com uma mistura de álcool e gasolina, e os carros elétricos estão disponíveis – contudo, são ainda muito caros num país onde 30% da população vive abaixo do limiar de pobreza. Seria preciso estudar melhor as regulamentações, o papel dos veículos na cidade, as infraestruturas de transporte e as nossas práticas ecológicas. 

Quando se ‘apaixonou’ e começou a trabalhar na temática da mobilidade urbana sustentável? Foi por imperativos profissionais ou académicos? Ou achou que estávamos num ponto em que precisávamos rapidamente de agir a favor do nosso planeta?

Na verdade, em 2007, tive uma oportunidade profissional para transferir o meu trabalho de São Paulo para Lisboa. Naquela época, quando o IPCC [Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas] tinha divulgado o relatório sobre mudanças climáticas, eu era já especialista em emissões de gases com efeito de estufa, realizando relatórios ambientais. Fui morar para o bairro do Príncipe Real em Lisboa e não tinha a menor possibilidade de comprar um carro, que aliás era muito mais barato do que no Brasil. Contudo, não tinha onde estacionar. Averiguei e o estacionamento mais próximo seria no Teatro São Luís. Desta forma, tive que lidar com esta nova situação. Eu não comprei carro, tive de me adaptar a utilizar os transportes públicos e a caminhar. Esta nova situação mostrou-me um novo mundo, uma nova cidade, pessoas nas ruas e nos cafés – a vida dinâmica em que quem anda de carro participa muito pouco.

Poluição e COVID-19: como é que estes dois fenómenos se intersetam ou complementam no sentido mais negativo? Considera que os impactos de ambos em termos económicos e de saúde são semelhantes?

Sim, a COVID-19 apenas evidenciou um problema maior do que não ter vacina. Os laboratórios profissionais e as universidades não estavam preparadas para o problema, as corporações viram uma oportunidade para lucrar mais rápido e a vacina saiu em menos de um ano, porque os governos a financiaram. O mesmo aconteceu com o meio ambiente, só que como os problemas fatais ocorrem através da acumulação, estes problemas não são visíveis e seu controlo é insuficiente. Todavia, as pessoas estão a morrer prematuramente, dez e vinte anos mais cedo, numa proporção muito maior do que as vítimas de COVID-19 e ninguém dá conta disso. Colocam em segundo plano os investimentos em infraestruturas e saneamento básico nas cidades, onde a COVID-19 é mais eficaz. Ou seja, a população mais pobre é aquela que mais sofre e morre. 

Os últimos tempos, que coincidiram com confinamentos e, consequentemente, maior reflexão, poderão ter provocado uma maior consciência das nossas fragilidades e da importância de construir mais espaços verdes e azuis em ambiente urbano?

Eu percebo que nos países mais desenvolvidos, na Europa e nos Estados Unidos, isso se tenha verificado. No entanto, nos países latino-americanos não há [essa consciencialização]. E atualmente no Brasil, um grupo de negacionistas que aproveitam a ignorância da população em diversos níveis sociais, mantida por diversos governos que acreditam na ‘terra plana’, que a ciência quer controlar o homem, que as vacinas não funcionam, querem soluções armadas e governos ditatoriais e não têm apreço pela democracia. Estes grupos não se importam com um mundo mais sustentável. Pelo contrário, querem isolamento, fragmentação e a criação de muros sociais que dividem a população entre pobres e ricos. A restante população, vejam bem, não sabe o que quer, acham que o Estado é grande, que é necessário privatizar, e não dão a menor atenção aos espaços públicos. É preciso retomar a realidade: ser-se ecológico não pode ser confundido com o estilo de vida das pessoas mais ricas, opção para os mais ricos, qualidade de uma determinada marca ou produto. É preciso que signifique que todos tenham maior acesso à cidade, ao mundo.

Temos consciência de que algumas alternativas mais sustentáveis passam pela adoção de uma mobilidade suave – andar a pé, de bicicleta ou recorrer a transportes públicos, adotando uma mobilidade multimodal. No entanto, estes hábitos ainda são muito menosprezados. Será por falta de infraestruturas e de acessos ou por falta de motivação e informação? Ou até de segurança? Ou considera que, de uma forma geral, os cidadãos ainda não perceberam os benefícios de procurar alternativas mais amigas do ambiente?

Eu fiz uma especialização e um mestrado em Urbanismo, fui conselheiro de políticas urbanas do município de São Paulo, fui membro da comissão de paisagem urbana do município e conselheiro de meio ambiente da câmara. Luto há anos por uma política de deslocação mais sustentável. No entanto, os regulamentos, o desenho urbano e as leis não contribuem para isso. Não existe nenhuma lei no Brasil que obrigue um construtor a fazer boas calçadas e elaborar um plano para elas, ou mesmo um mapeamento de calçadas no município. Como isto não origina votos, o espaço público é marginalizado. Aqui, em São Paulo, existe uma lei que transfere a construção das calçadas para o dono da habitação que se encontra em frente. Ou seja, o cidadão é que tem de construir e fazer a manutenção. As calçadas não têm continuidade, ninguém cuida e fiscaliza, o que faz com que estas, que são o primeiro nível de urbanismo, não funcionem. 

Na sua opinião, quais são as principais vantagens da mobilidade sustentável a nível urbano e empresarial?

Eu acredito que a parceria público-privada é sempre bem-vinda. Existem oportunidade reais para todos e todos podem lucrar – o Estado, as empresas e os cidadãos. No entanto, isto não se verifica nos países desenvolvidos, uma vez que há um certo grau de ‘patrimonialismo’, isto é, pessoas e empresas que acreditam que devam tirar o máximo proveito dos bens do Estado e levam a cabo uma verdadeira destruição do património público para benefício próprio. Isto faz com que os investimentos em infraestruturas sejam direcionados para grandes obras estruturais e uma simples calçada seja posta de lado, sendo que seria fundamental para um simples programa de mobilidade pedonal. Em Los Angeles, nos Estados Unidos, por exemplo, existe um manual de mobilidade pedonal para o construtor civil rever toda a calçada do quarteirão, e não apenas a secção anexa ao lote onde está a construir. Caso o construtor não se responsabilize, o projeto não será aprovado. Isto abre espaço para profissionais e investigadores. Com isto, a comunidade também sai a ganhar. 

Dada a sua experiência e conhecimento, quais são os meios de transporte mais ecológicos que podemos adotar? Considera que são acessíveis para todos ou haverá fatores sociais e económicos que poderão pesar nesta escolha?

Caminhar é o meio mais sustentável que existe, mas depende da oferta de infraestruturas. É possível ver isso como uma enorme oportunidade para todos – empreendedores, cidadãos e Estado.  

Como vê o desenvolvimento da mobilidade sustentável no Brasil?

Muito fraco. Registou uma regressão, embora hoje exista uma menor resistência. No entanto, existe ainda muitas pessoas contra esta ideia, sobretudo entre as elites políticas e económicas. Isto leva a que seja necessário atribuir maior importância aos ativistas e aos profissionais do meio ambiente, que precisam de se renovar. 

Como perspetiva o futuro das grandes cidades? Na sua opinião em quantos anos se poderá estimar uma verdadeira revolução nas cidades?

Existem cidades que estão muito à frente, embora não pareçam. Londres está num nível bastante superior a São Paulo, que ainda luta para superar a pobreza, as favelas, a falta de hospitais, trabalho, salários, etc. Contudo, o problema da pobreza não é só dos países mais pobres. Os países ricos, como os Estados Unidos da América, originam um maior número de pobres do que o Brasil. Será necessário descentralizar os ganhos económicos e distribuir melhor o rendimento para que as cidades possam obter mais recursos para infraestruturas essenciais. No entanto, é preciso realçar que isto não resultará da privatização, nem do setor privado – que não se interessa por gente pobre. Esse é um papel do Estado. Assim, só depois de se resolver esta situação é que podemos pensar em cidades mais sustentáveis e inteligentes. 

Para terminar e retomando ao tema ‘Green Mobility’, pode indicar-nos alguns dos projetos mais relevantes em que o ‘seu’ Instituto está envolvido?

Este ano de 2020 foi um ano muito difícil para todos: tivemos de nos ausentar, refletir, escrever mais; não tivemos tão envolvidos como de 2012 a 2017, quando desenvolvemos uma série de projetos de vias públicas, encerramento de ruas aos carros, planeamento urbano e o laboratório de políticas urbanas. Atualmente estamos a preparar-nos para podermos voltar no momento pós-pandemia. Acreditamos que a prioridade é agora a saúde pública, e estamos 100% confinados, a contribuir para um planeta melhor, mais saudável e sustentável. E aproveitamos para desejar, aos leitores da revista, sucesso, saúde e um excelente ano de 2021.