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Green Future-AutoMagazine

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REDUZIR, REUTILIZAR, RECICLAR – Porque não também nos veículos?

Artigo de Opinião - António Gonçalves Pereira

António Gonçalves Pereira, Presidente da Associação EcoMood Portugal

Os 3 R de base da sustentabilidade são, hoje em dia, já generalizadamente aceites como uma necessidade incontornável. E praticados, mesmo que menos do que seria desejável, em quase todas as áreas de atividade. Desde as nossas casas às empresas de todas as dimensões e dos mais diversos sectores. E são também apregoados e incentivados pelos governos dos diferentes níveis, do regional ao multinacional. E, ainda que sublinhando que há ainda muito por fazer e melhorar, muito mesmo, há uma área que está a ser completamente descurada neste campo: a da mobilidade. 

Pense nas muitas centenas de milhões de veículos a combustão que existem a circular, tanto rodoviariamente, como nos céus e nos mares. Já todos sabemos que, mais cedo do que tarde, terão que ser substituídos por outros, menos poluentes. Muito menos poluentes. Mas… e porquê substituídos? Muitos deles estão ainda em perfeitas condições de operação, são bons veículos, com a excepção de se locomoverem a combustão. E muitos outros estão, ainda hoje e nos próximos tempos, a ser produzidos e comercializados. Porque não convertê-los? Ou seja, RECICLAR motores e peças desnecessárias, REUTILIZAR o restante veículo, montando-lhe um sistema de propulsão elétrico e as respectivas baterias e, assim, REDUZIR a produção de novos veículos e toda a pegada daí inerente. 

Este será um mercado gigantesco nos próximos anos. E Portugal pode ter um papel de destaque, se apostar de imediato nesta solução, incentivando-a, tanto no aparecimento de uma indústria transformadora, como na sua aplicação por parte dos cidadãos, das empresas e outras instituições, e pelo próprio Estado. 

Esta solução é já praticada há mais de 30 anos, com maior incidência nos últimos 15, sobretudo no que diz respeito a automóveis clássicos, em países como Holanda, Inglaterra ou Estados Unidos. De uma forma artesanal e experimental, é certo. Por cá, em ambiente académico, também se tem feito sistematicamente, em Institutos Politécnicos como o ISEL, o de Setúbal ou o de Tomar, entre outros. Não é, portanto, uma novidade, nem, tão pouco, particularmente complicado. Há cerca de 10 anos que existem sites na internet em que pode escolher e comprar os diversos componentes, como com carrinho de supermercado, para fazer a sua própria conversão. Porque não, então, apostar-se de forma clara e incisiva nesta solução de sustentabilidade para reduzir mais rápida, eficaz e democraticamente a pegada da mobilidade? 

Os números falam por si

Eis alguns números que dão que pensar: 
Imagine, por exemplo casual, um Audi Q7 de, por exemplo, 2008. Continua a ser um grande automóvel, de excelente conforto, prestações e aplicabilidade. Com o seu enorme motor e caixa automática, consome sempre acima de 20 litros de gasóleo por cada 100 quilómetros. Ou seja, emite algo como 52 quilos de carbono aos 100. Se considerarmos a média de 15.000 quilómetros por ano que se aplica nos manuais de venda de usados, estamos a falar de 7.800 quilos de emissões anuais. E, se estivéssemos a falar, por outro exemplo, de um fantástico Porsche Cayenne, esses números chegam a algo como 11.700 quilos de carbono por ano. Quase 12 toneladas! Há que, portanto, retirar esses motores rapidamente de circulação. Aliás, sendo de 2008, estes carros já nem entram em várias cidades europeias. E, em breve, em muitas mais. Mas outros, congéneres, andam por aí. Além dos que estão e estarão ainda a sair das linhas de montagem e a ser comercializados. 

Considerando apenas a mobilidade elétrica, e não pondo aqui factores ainda mais sustentáveis, como a generalização dos transportes públicos e partilhados ou a mobilidade suave, estamos atualmente a ser convencidos de que o ideal é desfazermo-nos destes carros e adquirir um novo, elétrico. E por ‘desfazer’ entenda-se enviá-lo para abate, porque, se o vendermos a outra pessoa, continuará a causar a mesma pegada, apenas acrescentámos a pegada da produção de um veículo novo. E é aqui que temos que repensar: o abate e a produção de novos. Sem falar de outras pegadas, em termos médios, e apenas médios, já que estes SUV deverão estar bem acima disso, admite-se que a produção de um veículo ligeiro causa emissões de cerca de 6.500 quilos de carbono. E que o abate causa algo como 2.500 quilos. Ou seja, 9 toneladas para abater um automóvel e produzir um novo, ainda que elétrico. 9 toneladas! 

Se, ao invés destes gigantes de luxo, estivermos a falar de um carro a gasóleo de gama média alta, com um consumo a rondar os 6 litros aos 100, o que é normal, teríamos que percorrer perto de 57.700 quilómetros até emitirmos essas mesmas 9 toneladas de carbono. Ou seja, quase 4 anos de circulação. Será sustentável poluir 9 toneladas já, em vez de o fazer ao longo de 4 anos? 

Deixo-lhe ainda mais um número de pegada de carbono: entre a reciclagem dos elementos relacionados com o motor a combustão e a produção e montagem dos relacionados com a propulsão elétrica, dificilmente se ultrapassam os 3.000 quilos de emissões. Assumamos, portanto, este número: entre o abate e produção e a conversão, há uma poupança de cerca de 6 toneladas de emissões. 

Posto isto, vamos a números económicos. Afinal, o que está nas prioridades de muitos, que não necessariamente nas da sustentabilidade ambiental. Mas porque a sustentabilidade social é também um factor essencial. Um veículo elétrico, da gama dos a combustão usados para exemplo aqui, custa hoje em dia, simpaticamente, sempre acima de 70 mil Euros. A sua conversão é hoje possível por algo como 20 mil. E, se tivermos em atenção que estes veículos a combustão se estão a desvalorizar rapidamente e que, uma vez industrializadas e com a evolução dos preços das baterias, as conversões se tornarão muito mais baratas (50%, pelo menos), este diferencial será exponencialmente maior. 

Democratizar e acelerar a descarbonização

Propositadamente, não estou a incluir neste texto a aviação e o transporte marítimo, causadores de uma pegada muito superior à dos transportes terrestres. Porque não tenho espaço e, sobretudo, porque envolvem muitas questões políticas e económicas que, infelizmente, ainda se sobrepõem à sustentabilidade. À racionalidade, até. E também por questões do estágio tecnológico em que nos encontramos por estes dias. E porque, para demonstrar a validade das conversões, os veículos rodoviários chegam. Os individuais e os colectivos, de passageiros ou de mercadorias, ligeiros ou pesados. Particulares, empresariais e estatais. 

Fica demonstrado que esta solução, sendo incentivada e utilizada pelo Estado (nas suas próprias frotas), é essencial para democratizar e acelerar o processo de descarbonização da mobilidade. Porque muitos mais cidadãos e empresas passarão a ter a capacidade económica para ter veículos elétricos. Ou até híbridos, temporariamente, no caso das frotas urbanas de distribuição e de transportes. E porque, como vimos, se reduz a pegada da produção e do abate de veículos. 

O que falta fazer?

Em Portugal, quase tudo. Desde alterar a legislação a criar regulamentação, como aconteceu com o GPL. E criar incentivos, tanto ao nível industrial, como das empresas, do Estado ou do cidadão consumidor final. Se esta solução é mais sustentável do que o abate e compra de veículos novos, porque não? E Portugal pode ainda entrar na linha da frente, dando um exemplo concreto ao mundo. Criando uma indústria de referência nacional, com empresas de todas as dimensões. E, aí sim, podemos ainda ser inovadores. 

É isso que, na EcoMood Portugal, defendemos e vamos debater e demonstrar no próximo OnMobility, na Amadora, a 16 de Setembro, o primeiro dia da Semana Europeia da Mobilidade. Com um painel de ilustres e conhecedores académicos, empresários e outros players, atuais e potenciais, do sector. Saiba mais e inscreva-se gratuitamente para assistir em www.onmobility.live. Um evento híbrido plug-in, ou seja, presencial e digital. 

Converta-se e ajude-nos a converter Portugal para as conversões. É urgente. 

Nota do autor: este artigo está escrito em Português de Portugal, apenas com as evoluções do (des)acordo ortográfico que me fazem sentido. 

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