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Green Future-AutoMagazine

O novo portal que leva até si artigos de opinião, crónicas, novidades e estreias do mundo da mobilidade sustentável

Opinião

Carregamento bidirecional: ganhar duas vezes

O carregamento bidirecional nos veículos elétricos: uma oportunidade energética para a Europa

Durante anos, os veículos elétricos foram vistos apenas como consumidores de eletricidade.

Mas essa visão começa a revelar-se limitada. Graças à tecnologia de carregamento bidirecional, ou vehicle-to-grid (V2G), os automóveis elétricos podem passar a desempenhar um papel ativo no sistema elétrico. Não se limitam a consumir: podem devolver energia à rede e contribuir para o equilíbrio energético de todo um continente.

Um estudo com números claros

A organização europeia Transport & Environment (T&E) publicou um estudo elaborado pelos institutos Fraunhofer ISI e ISE, duas das mais prestigiadas instituições científicas em investigação aplicada na Europa. As conclusões são inequívocas: se for criado um enquadramento legal comum que promova o carregamento bidirecional, os veículos elétricos poderão gerar poupanças até 100 mil milhões de euros para o sistema elétrico europeu entre 2030 e 2040.

Este cálculo baseia-se no potencial dos VE para estabilizar a rede, reduzir os custos de produção de eletricidade e minimizar a necessidade de baterias estacionárias, atualmente utilizadas para armazenar o excedente de energia renovável.

Como funciona o carregamento bidirecional?

O sistema V2G permite que a bateria do automóvel não apenas receba energia, mas também a devolva à rede quando necessário. Por exemplo, um veículo carregado durante a noite pode injetar energia na rede durante as horas de maior consumo, quando a procura e o preço são mais elevados.

Para tal, é necessária uma infraestrutura compatível: carregadores capazes de operar nos dois sentidos, um sistema inteligente de gestão da carga e, acima de tudo, um enquadramento jurídico claro e harmonizado a nível europeu.

Benefícios energéticos e ambientais

A grande vantagem do V2G reside na sua capacidade de facilitar a integração de energias renováveis na rede. Segundo o estudo, a frota de veículos elétricos em Espanha poderá vir a cobrir até 17% das necessidades elétricas do país em 2040, aproveitando a energia solar ou eólica que, de outra forma, se desperdiçaria.

Além disso, a tecnologia V2G pode reduzir até 92% a necessidade de baterias estacionárias na Europa, simplificando a rede e diminuindo os custos de fabrico e manutenção. Com uma implementação em larga escala, a Europa poderia integrar até mais 40% de capacidade solar fotovoltaica sem sobrecarregar o sistema elétrico. Em termos simples, os automóveis passariam a ser aliados estratégicos de um sistema energético mais limpo e eficiente.

E as baterias? Não se degradam mais?

Uma preocupação comum entre os utilizadores é o eventual desgaste acrescido das baterias devido ao ciclo constante de carga e descarga. No entanto, o estudo indica o contrário: ao manter a bateria dentro de um intervalo ideal de carga durante mais tempo, o uso do V2G pode aumentar a sua vida útil até 9% em comparação com os padrões habituais de carregamento.

Ou seja, longe de prejudicar a bateria, um uso inteligente da carga bidirecional pode até beneficiar a sua durabilidade.

E os condutores? Qual é o incentivo?

Apesar da viabilidade técnica, a adoção generalizada do V2G dependerá também da atratividade económica para o utilizador final. O sucesso estará nos incentivos, nas tarifas dinâmicas, em compensações claras pela energia devolvida e na transparência do sistema de gestão.

Por outro lado, a utilização doméstica da tecnologia, na variante vehicle-to-home (V2H), permitirá usar o automóvel como bateria auxiliar em casa, por exemplo, para evitar o consumo de eletricidade durante as horas de tarifa mais elevada.

Um potencial ainda por explorar

Atualmente, o carregamento bidirecional está disponível em poucos modelos comerciais. Algumas marcas como a Nissan (Leaf) ou a Hyundai (Ioniq 5) já oferecem esta funcionalidade, mas o V2G continua a ser mais uma promessa do que uma realidade generalizada.

Para inverter esta tendência, a T&E defende que seja aprovada legislação europeia que torne obrigatória a compatibilidade com carregamento bidirecional em todos os novos veículos elétricos. Esta medida permitiria acelerar o desenvolvimento da infraestrutura e criar uma base comum para fabricantes, utilizadores e operadores do sistema elétrico.

Conclusão

O carregamento bidirecional não é uma ideia teórica nem uma utopia tecnológica. É uma oportunidade concreta que pode transformar profundamente a relação entre o setor automóvel e o sistema energético europeu.

Para que isso aconteça, é fundamental antecipar a sua implementação: desenvolver a infraestrutura, definir regras claras e garantir que todos os novos veículos estejam preparados para esta tecnologia.

Se tal for alcançado, os veículos elétricos deixarão de ser apenas meios de transporte livres de emissões para se tornarem elementos ativos da rede elétrica do futuro. E isso, sim, poderá representar uma verdadeira mudança de paradigma.

Scooter-GER A ascensão da Geração da Trotinete – Uma mudança de mobilidade com consequências duradouras

Uma revolução silenciosa, mas profunda, na mobilidade está a ganhar forma nas cidades de todo o mundo. No centro desta mudança está uma geração sem precedentes: a Geração da Trotinete. Urbana, fluente no digital e consciente da sustentabilidade, esta juventude não está apenas a transformar a forma como nos movemos – está a reformular a maneira como pensamos o espaço, a propriedade e a sociedade.

Não socializados pelo automóvel, mas sim pela mobilidade

Durante séculos, a posse de um automóvel pessoal foi um pilar central da identidade e independência em muitas culturas. Obter a carta de condução era, em tempos, um rito de passagem para a vida adulta. Mas para a juventude urbana de hoje, esse paradigma já não se aplica. A Geração da Trotinete é o primeiro grupo a crescer não socializado pelo automóvel, mas sim pela mobilidade – uma mudança com consequências profundas.

Os seus anos formativos foram marcados não por pais a entregar chaves de carro, mas por um toque num telemóvel para desbloquear uma trotinete, bicicleta ou carro partilhado. Deslocam-se pelas cidades de forma fluida, combinando vários modos de transporte: trotinete até ao metro, bicicleta até ao comboio, serviço de transporte privado até à partilha de boleias. Não se trata do veículo – trata-se do acesso.

Esta forma de socialização através da mobilidade partilhada altera a forma como se compreendem a liberdade e a responsabilidade. A liberdade já não é definida pela posse ou pela potência, mas pela capacidade de se deslocar de forma independente, acessível e sustentável – muitas vezes sem necessidade de um veículo próprio.

Do comportamento à infraestrutura: uma nova lógica de planeamento

Estudos de comportamento mostram cada vez mais que as experiências de mobilidade na juventude moldam hábitos a longo prazo. A Geração da Trotinete interioriza o pensamento multimodal como algo natural. Têm menor tendência para desejar possuir um carro, maior propensão para questionar a atribuição de espaço ao estacionamento, e valorizam mais comunidades densas, caminháveis e orientadas para os transportes públicos.

Isto representa um desafio para as lógicas tradicionais de planeamento, ainda enraizadas em pressupostos centrados no automóvel. Porque construir parques de estacionamento gigantes quando os jovens preferem trotinetes sem doca? Porque dar prioridade a vias rápidas quando a procura recai sobre ciclovias e zonas de micro-mobilidade? A socialização em mobilidade desta geração torna muitos investimentos em infraestruturas legadas obsoletos mesmo antes de serem construídos.

Para além do transporte: a camada cultural

A mudança da Geração da Trotinete não se limita à forma como se deslocam – estende-se à forma como vivem, consomem e se relacionam. Têm maior tendência para partilhar casas, subscrever serviços, e ver o consumo através de uma lente de sustentabilidade. São a geração do “menos é mais”, com uma mentalidade nativa digital que prioriza a flexibilidade, a experiência e o acesso em detrimento da posse.

Esta mudança de estilo de vida sustenta os alicerces de uma sociedade sustentável baseada no conhecimento. Para esta geração, a mobilidade não é um fardo, mas sim uma ferramenta de inclusão, participação e ação climática. A sua mobilidade é leve, inteligente e partilhada – e as cidades que compreendem esta mudança já estão a adaptar-se, a repensar o espaço junto ao passeio, a realocar infraestruturas viárias e a integrar plataformas de mobilidade como serviço (MaaS), como acontece em Paris.

Um alerta geracional para as políticas e o planeamento

O surgimento da Geração da Trotinete deve ser visto como um alerta. Marca o fim do automóvel como modelo universal para o planeamento da vida. Cidades, urbanistas e decisores políticos devem reconhecer que a mobilidade já não está ligada ao hardware, mas sim a redes, dados e acesso.

Não se trata de uma moda passageira, mas de uma transformação estrutural impulsionada pela socialização, pela tecnologia e pelos valores. E abre caminho a ambientes urbanos mais saudáveis, mais equitativos e mais resilientes.

Se o século XX pertenceu ao automóvel, o século XXI poderá muito bem pertencer à trotinete: silenciosa, elétrica, partilhada e mais inteligente do que nunca (pelo menos, quando bem estacionada).

Deverá a UE aligeirar o mandato de emissões zero até 2035?

Os membros da UE concordaram em 2023 em exigir que todos os novos veículos leves vendidos a partir de 2035 sejam totalmente em emissões. O mandato é neutro em tecnologia, ou seja, requer que todos os veículos sejam elétricos a bateria — EVs de célula de combustível de hidrogênio são uma opção — embora este esteja se tornando o caminho de fato.

Como vimos nos últimos anos, a trajetória de penetração de veículos limpos não é linear. É fortemente influenciado por incentivos que vêm e vão, pela introdução de novos modelos ou pela mudança na narrativa geral. Pode-se dizer que o ponto de dados de 2024 estava fora da trajetória linear em direção à meta de 2035, já que a penetração do BEV se estabilizava em torno de 14%. Isso está causando algumas dúvidas. No entanto, vários veículos de preço mais baixo estão sendo introduzidos que aumentarão a participação de mercado da BEV.

Uma cláusula de revisão incorporada no regulamento oferece uma oportunidade para revisitá-lo. Em 2026, o progresso em direção à meta de 2035 deve ser avaliado e as mudanças no escopo (por exemplo, extensão para veículos de 2 rodas) devem ser consideradas. Vários grupos de partes interessadas insistem que esta revisão deve ser adiada para 2025 — a incerteza é prejudicial à saúde da indústria — e a meta de 2035 deve ser reconsiderada.

A indústria automobilística europeia já está sob estresse significativo, mais do que suas contrapartes chinesas e americanas. Isso se deve em parte aos volumes não terem recuperado totalmente seu nível pré-Covid. A cláusula de revisão de 2026 é certamente uma oportunidade para reduzir esse estresse.

A UE deve confirmar a meta de 2035 para apoiar as metas de sustentabilidade e “forçar” a indústria em geral a fechar a lacuna de competitividade em relação à China? Ou o mandato deve ser relaxado para dar à indústria (e ao mercado) mais tempo para se ajustar, preservando níveis “racionáveis” de lucratividade? Deve ser introduzida alguma flexibilidade ou deve ser fornecida assistência financeira adicional?

O caso para relaxar o mandato da UE

Grupos da indústria, entre outros, estão fazendo lobby por um relaxamento do mandato de 2035. Os argumentos incluem falta de prontidão técnica, condições de mercado (por exemplo, apetite insuficiente dos clientes) e riscos econômicos para a indústria em geral.

Vários argumentos técnicos podem justificar a revisão do mandato. Eles incluem a falta de uma cadeia de fornecimento de baterias soberana (o mundo depende da China), a necessidade de uma extensa rede de carregamento e a preparação para que a rede suporte o carregamento em massa.

A cadeia de suprimentos da bateria não está entrando em fluxo conforme necessário. O requisito de CAPEX é enorme e a Europa carece de habilidades específicas de bateria. A Northvolt, com sede na Suécia, que já foi o principal empreendimento de bateria na Europa, entrou em colapso. A China (por enquanto) mantém seu controle sobre a mineração e refino de minerais, bem como sobre a produção de eletrodos e células. Sua estratégia de permitir que o excesso de capacidade se acumule (atingindo 600% para as células) e o preço de mercado afunda está tornando muito difícil para novos investimentos fora da China mostrar viabilidade econômica.

Além disso, as montadoras e seus fornecedores já investiram dezenas de bilhões de euros para desenvolver plataformas prontas para EV, cadeias de suprimentos de baterias, motores, eletrônicos de potência e infraestrutura de carregamento. No entanto, a lucratividade da BEV continua desafiadora, pois esses veículos não atingiram a paridade de preços em relação ao equivalente ICE que deveriam substituir, apesar da rápida queda dos custos da bateria.

Além disso, o mercado precisa de tempo para converter, pois parte da população está relutante em mudar, devido ao medo de ficar preso com uma bateria esgotada longe de um carregador. Os compradores devem ser educados, o que acontecerá com o tempo

O caso para manter o mandato da UE

Não vou repetir a justificativa de sustentabilidade para manter o mandato em seu estado atual, pois é óbvio para todos os indivíduos de pensamento sólido.

Há argumentos comerciais a serem feitos, e eles têm muito a ver com a China. Os OEMs chineses têm avançado com o apoio de seu governo. Isso levou a economias de escala significativas e sua implantação acelerada nos mercados globais.

Em 2020, a Europa experimentou uma maior penetração de BEV do que a China, impulsionada por uma mudança na meta de CO2 na UE. Em 2024, a participação de mercado da BEV na China era o 2x da Europa. Se a Europa ficar muito para trás, estará em uma posição cada vez mais desafiadora nos mercados globais, que estão sendo progressivamente eletrificados.

Uma opção para enfrentar o desafio da China poderia ser fechar as fronteiras. Esta é a abordagem que os EUA escolheram com tarifas de 102,5% sobre os EVs chineses combinados com o relaxamento dos limites de emissão internamente. É semelhante a se esconder debaixo de uma pedra. As tarifas só podem ser uma solução direcionada de curto prazo para permitir que os jogadores domésticos recuperem a competitividade. Eu vejo as taxas (de até) 45% que a UE cobra nos BEVs chineses como tal solução. No entanto, isso funcionará desde que os OEMs europeus aprendam a competir frente a frente com seus colegas chineses em mercados onde estão em pé de igualdade. Isso será ainda mais possível se os limites de emissão no mercado interno (UE) continuarem a cair.

Não agir como tal levaria a uma perda drástica de competitividade nos mercados globais e, eventualmente, em casa, pois as tarifas podem ser contornadas com a produção regional. Para referência, a BYD está construindo sua segunda fábrica na Europa e procurando um local para sua terceira.

Qual é a situação em outras regiões?

A China não estabeleceu nenhuma meta (oficial) para uma mudança completa para veículos de emissão zero. No entanto, o mercado está eletrificando em um ritmo acelerado, com os EVs de bateria atingindo cerca de 30% do mercado em 2024, quando os EUA estão em 8% — e o Japão em torno de 1%. O forte crescimento da eletrificação da China é o resultado de esforços coordenados por muitos anos para superar outras nações automotivas com trens de força da próxima geração. Parte da estratégia consistia em dominar a cadeia de suprimentos de baterias.

Como resultado, mais de 12 milhões de veículos plug-in foram produzidos na China em 2024, permitindo uma competitividade de alto custo em relação a outras regiões, oferecendo, portanto, um potencial de exportação significativo — veja meu artigo de março de 2025 “Chinese Auto Takeover: Tech, Growth, and Global Expansion” para mais informações.

Nos EUA, a abordagem federal tem consistido até agora em aumentar o requisito de economia média de combustível corporativa (CAFE), forçando um caminho para emissão zero sem estabelecer uma meta de atingir veículos 100% limpos. A nova administração agora está fazendo tudo o que pode para retardar a implantação de EVs e a cadeia de fornecimento de baterias associada.

Em 2022, a Califórnia promulgou um mandato de emissão zero, visando todos os novos veículos leves para serem BEV ou PHEV até 2035. No entanto, o congresso federal e a nova administração, com sua aversão dogmática por veículos limpos, acabaram de rescindir esse mandato — embora isso esteja sendo contestado no tribunal. A participação de mercado BEV+PHEV é de 23% YTD (incl. 19% BEV) vs. uma meta de 35% em 2026, deixando uma lacuna significativa.

A combinação de altas tarifas e baixas exigências domésticas de emissões provavelmente levará a uma perda significativa de competitividade nos mercados globais para OEMs sediados nos EUA.

Uma coisa é certa: uma estrutura clara e estável é necessária para que as partes interessadas do setor estabeleçam estratégias robustas e invistam com os critérios de lucratividade mais claros possíveis. A incerteza normalmente resulta em imobilidade, que é possivelmente a pior coisa que pode acontecer. No final do dia, não temos escolha a não ser ir 100% de emissão zero.

O que acontecerá quando fabricar um carro elétrico for mais barato do que um a combustão?

Um relatório da Gartner prevê que, em 2027, o custo de produção dos carros elétricos será inferior ao dos modelos com motor térmico. Uma mudança de paradigma industrial com implicações complexas para fabricantes, seguradoras e, sobretudo, consumidores.

A mudança já começou

Fabricar um carro elétrico será mais barato do que produzir um modelo a combustão antes do fim desta década. Essa é a previsão da consultoria Gartner, publicada em março de 2025, após analisar a evolução da indústria automotiva e suas novas estratégias de produção. Segundo suas estimativas, o ponto de virada chegará por volta de 2027.

Mas não se trata apenas da redução no preço das baterias. Embora esse fator tenha sido importante nos últimos anos, a mudança real está vindo das linhas de montagem. As novas marcas redesenharam completamente a arquitetura do carro elétrico, adotando plataformas próprias mais eficientes, simplificando componentes e reduzindo o tempo de montagem.

Tecnologias como a fundição de grandes peças em alumínio (gigacastings), a arquitetura eletrônica centralizada e a eliminação de sistemas de transmissão complexos estão ajudando a reduzir significativamente os custos industriais. Isso permite eliminar centenas de peças, etapas intermediárias e horas de trabalho.

As estratégias dos fabricantes diante da redução de custos dos elétricos

Os principais protagonistas dessa transformação não são os fabricantes tradicionais, mas sim marcas emergentes como Tesla, BYD, Nio, Xpeng… Empresas que já nascem com foco exclusivo no carro elétrico, sem carregar legados industriais. E, sobretudo, com agilidade nas decisões.

A Tesla, por exemplo, já utiliza estruturas dianteiras e traseiras moldadas em peça única, reduzindo drasticamente o número de componentes. A BYD produz internamente não só as baterias, mas também os motores, a eletrônica de controle e o software, conseguindo um domínio de custos que os fabricantes tradicionais ainda não alcançam. Essa integração vertical lhes permite oferecer preços mais competitivos mantendo margens de lucro.

Enquanto isso, grupos como Volkswagen, Stellantis e Renault estão iniciando reestruturações para adaptar suas fábricas aos veículos elétricos. Mas essas transformações são caras e nem sempre compatíveis com a manutenção de modelos térmicos. A transição exige equilíbrio entre investimento, amortização e volume de produção.

Um ponto crucial é a escolha entre plataformas específicas para elétricos —mais eficientes, porém mais caras de implementar— ou plataformas modulares que aceitam diferentes tipos de motorização. Essa última opção, adotada por muitos fabricantes europeus, pode encarecer os elétricos e prejudicar sua competitividade frente às marcas que produzem exclusivamente elétricos.

E o consumidor, vai sair ganhando? Nem tanto

Mesmo que o custo de produção caia, isso não significa que o consumidor final vá gastar menos. A Gartner alerta que os custos médios de reparo após acidentes graves com carros elétricos vão aumentar cerca de 30% até 2027. E isso tem consequências diretas para o bolso de quem dirige.

Embora os carros elétricos tenham menos peças móveis e demandem menos manutenção mecânica, as reparações após colisões são mais complexas e caras. Muitos componentes são selados ou integrados e exigem ferramentas específicas e técnicos especializados. Isso sem falar nos protocolos de segurança e nas baterias de alto custo.

Com isso, um acidente moderado pode levar à perda total do veículo, mesmo quando os danos não são extremos. O custo de reparar uma bateria ou uma estrutura de alumínio pode ultrapassar o valor de mercado do carro.

O impacto se estende às seguradoras. Se o conserto de um elétrico é mais caro, o seguro também será. Algumas companhias já estão ajustando seus preços e há sinais de que, no futuro, algumas poderão recusar a cobertura de certos modelos. No Reino Unido e na Alemanha, por exemplo, já há casos de exclusão de modelos elétricos de determinadas apólices.

Dirigir bem: o fator mais econômico

Diante desse cenário, a forma como conduzimos nunca foi tão importante. Se um simples toque pode gerar um prejuízo elevado —ou até resultar na perda total do carro—, evitar acidentes torna-se o investimento mais inteligente.

Conduzir com mais margem, respeitar os limites de velocidade, antecipar o tráfego e cuidar das manobras em espaços apertados não só melhora a segurança viária, como também evita custos cada vez mais altos com manutenção e seguro.

Educação no trânsito, atenção ao volante e conhecimento do próprio veículo serão ainda mais decisivos para preservar tanto a segurança quanto o patrimônio. Em tempos em que o preço real de um carro está também no seu custo de uso, cada decisão ao volante faz diferença.

Rumo a um equilíbrio entre custo e serviço

Para a Gartner, o grande desafio da indústria não é apenas reduzir o custo de produção, mas garantir uma pós-venda sustentável. Se a economia na fábrica se traduzir em prejuízo para o cliente após um acidente, a confiança no carro elétrico será abalada —e com ela, a própria transição energética.

O ideal é que a produção e a manutenção sejam pensadas juntas. Ou seja, projetar o carro com foco não só na montagem, mas também na reparabilidade, no custo de uso e na durabilidade. Algumas marcas já trabalham com plataformas que permitem a troca de módulos ou baterias, e com diagnósticos remotos que evitam desmontagens complexas.

Paralelamente, será essencial que oficinas se modernizem e que as seguradoras desenvolvam modelos de cobertura viáveis para os carros elétricos.

Conclusão? Fabricar elétricos mais baratos não garante, por si só, que usá-los será mais barato. A indústria tem a oportunidade —e o dever— de levar essa revolução além da fábrica. Mas o motorista também tem um papel fundamental: em uma mobilidade mais cara de manter, dirigir bem será tão importante quanto escolher bem o carro.

Para Além do Turismo com Carbono

Na semana passada, tive a honra de inaugurar o 2.º Congresso Alemão de Cicloturismo. Embora o foco estivesse sobretudo no cicloturismo, o tema em si é bem mais abrangente. Como podemos desenvolver destinos de férias que proporcionem momentos de lazer e prazer, mas de forma sustentável? Esta questão é especialmente relevante, pois sabemos que entre 70 a 80 por cento das emissões de CO₂ durante uma viagem de férias provêm do transporte em automóveis com motor de combustão convencional. E não é de admirar — afinal, muitas vezes as opções de mobilidade acabam quando se chega ao destino, deixando os turistas dependentes dos seus próprios carros, certo?

Três Líderes Europeus em Mobilidade Turística

Tirol do Sul (Itália)
O Tirol do Sul tornou-se um pioneiro da mobilidade nos Alpes. Com o seu “Mobilcard Südtirol”, os visitantes têm acesso ilimitado a autocarros, comboios regionais e teleféricos — tudo incluído automaticamente na reserva de alojamento. Christof Pardeller, Diretor da Mobilitätsverbund Südtirol, afirma: “Não queremos apenas reduzir emissões — queremos melhorar a experiência do visitante e aliviar as nossas aldeias da pressão do estacionamento e da congestão. A mobilidade sustentável faz parte da nossa identidade.”
Como resultado, o Tirol do Sul registou não só uma redução na chegada de turistas de carro, mas também uma revitalização do comércio local, já que mais visitantes passam tempo nos centros das localidades em vez de apenas os atravessarem de carro.

Smile24 (Alemanha)
A operar nas regiões rurais e costeiras de Schleswig-Holstein, a Smile24 é uma plataforma digital de mobilidade que integra aluguer de bicicletas, autocarros, autocarros expresso, ferries e partilha de carros num único sistema de reserva intuitivo. Anna Ehlers, coordenadora do projeto, sublinha: “Não se trata de proibir carros — trata-se de oferecer algo melhor. Os visitantes querem simplicidade e sustentabilidade, e estamos a oferecer-lhes ambas. O feedback do comércio local tem sido excelente — as pessoas que chegam sem carro tendem a ficar mais tempo e a explorar mais.”
A Smile24 é um modelo para um turismo para além do carro privado, promovendo acessibilidade e participação económica nas localidades mais pequenas.

Laax (Suíça)
Laax está no caminho para se tornar a primeira estância de esqui sem carros da Europa até 2030. Com uma ousada estratégia de sustentabilidade, a estância combina shuttles elétricos, centros logísticos, infraestruturas alimentadas por energia solar e limitações rigorosas ao uso de carros privados. Reto Fry, Gestor de Sustentabilidade em Laax, explica: “Os Alpes estão na linha da frente da crise climática. Se não agirmos, perdemos a neve, os glaciares — e, no fim, os nossos visitantes. A nossa estratégia não é apenas ambiental; é uma questão de sobrevivência económica.”
Os comerciantes locais apoiam a iniciativa, referindo que menos tráfego significa mais ambiente e mais compras espontâneas. Laax demonstra que até destinos de gama alta podem prosperar sem um planeamento centrado no automóvel.

As decisões sobre mobilidade moldam não apenas as emissões, mas também a vitalidade das economias locais. Estudos demonstram que ciclistas e peões contribuem significativamente mais para o volume de negócios do comércio local do que os automobilistas. No entanto, em muitas regiões, a infraestrutura centrada no carro continua a dominar os centros das localidades, transformando potenciais polos de atividade social e comercial em simples corredores de tráfego. Os destinos que priorizam a caminhabilidade, o transporte público e a mobilidade partilhada registam mais movimento em lojas e cafés — e fomentam laços comunitários mais fortes.

Veículos Elétricos: Uma Solução Parcial
Embora os veículos elétricos ajudem a reduzir as emissões diretas, especialmente quando alimentados por fontes renováveis, não resolvem os problemas de tráfego, uso do solo ou acessibilidade nas zonas turísticas. A chave está na mudança de comportamento — da posse ao acesso, da condução à partilha. Os veículos elétricos devem ser integrados numa estratégia multimodal mais ampla, e não substituí-la. E obviamente, com os grandes avanços nos serviços de mobilidade autónoma, a esperança de ultrapassar os comportamentos tradicionais de mobilidade está mais forte do que nunca.

O Caminho para um Turismo Resiliente
O futuro do turismo está profundamente ligado à forma como nos movemos. Regiões como o Tirol do Sul, a Smile24 e Laax demonstram que a inovação na mobilidade não é um extra — é uma estratégia de sobrevivência. Estão a construir sistemas onde sustentabilidade, vitalidade económica e qualidade de vida se encontram.
Para outros destinos, o caminho é claro: passar da mobilidade como uma necessidade logística para a mobilidade como um ativo central da marca do destino. É assim que tornamos o turismo resiliente — para os visitantes, os residentes e as gerações futuras.

O Caso da Simplicidade: A Necessidade do Básico

Os preços dos carros subiram nos últimos anos, impulsionados pela escassez de semicondutores da era da pandemia e pela mudança resultante das montadoras em direção a veículos de alta margem e alto custo. Nos EUA, novas tarifas estão definidas para empurrar os preços ainda mais altos — o oposto do que é necessário em um mercado onde muitos compradores já estão precificados. Então, o que as montadoras podem fazer para garantir que mais pessoas possam comprar um carro novo decente?

Em março de 2024, explorei essa questão em “Uma Necessidade Crítica de Veículos Menores e Mais Leves”, com foco em tamanho, peso e segurança. Antes disso, em fevereiro de 2023, “Os Minicarros Frugais são o Futuro da Mobilidade Urbana?” Examinei o segmento global de baixo preço (US$ 5 a 15 mil): quadriciclos (Europa), carros Kei (Japão), mini EVs (China) e veículos de baixa velocidade (EUA). Embora promissores para o transporte urbano ou rural, esses veículos de nicho não atendem às amplas necessidades do consumidor.

Nos EUA, o preço médio da transação atingiu US$ 47.462 em fevereiro de 2025 — um aumento de 24% em relação a março de 2020 e 43% na última década, superando em muito o aumento de 34% na inflação acumulada. A França reflete essa tendência: o carro novo médio agora custa 34.732€ (antes das opções e descontos), e os veículos elétricos a bateria (BEVs) têm um prêmio ainda mais íngreme.

Os europeus têm opções abaixo de 25 mil euros

Em toda a Europa, os compradores podem encontrar BEVs abaixo de 25.000€ e modelos movidos a gás mais próximos de 16.000€. Stellantis e Renault estão liderando a carga com o Citroën ë-C3 (a partir de 23k€) e o Renault R5 de estilo retrô (25k€) mostrado abaixo, oferecendo faixas WLTP de mais de 300 km com 44 e 40 kWh, respectivamente. A Primavera da Dacia, feita na China, começa abaixo de 17 mil euros, com 225 km de alcance — longe o suficiente para a maioria das necessidades diárias. Nota: os preços são antes dos incentivos no mercado francês.

A Volkswagen se juntará ao segmento em 2026 com o ID.2 BEV, esperado em torno de 25 mil euros. Enquanto isso, os carros a gasolina convencionais de marcas japonesas, coreanas e europeias permanecem amplamente disponíveis para compradores preocupados com o orçamento, especialmente para dirigir na cidade.

As montadoras chinesas também estão pressionando o mercado europeu com preços ultracompetitivos, embora as tarifas estejam dando às marcas nacionais algum espaço para respirar. Ainda assim, empresas como a BYD já estão construindo plantas europeias para contornar totalmente essas tarifas — um sinal de quão sérias elas são. A concorrência também é boa para os clientes, mas os OEMs europeus precisam de tempo para se ajustar.

Oferta Limitada e Sem BEVs Abaixo de US$ 25 mil nos EUA

A paisagem dos EUA é muito diferente. O número de modelos acessíveis diminuiu drasticamente, com a Ford e a Stellantis tendo deixado principalmente esse segmento. Apenas alguns veículos agora são vendidos abaixo da faixa de US$ 22 a 25 mil, com o Nissan Versa em US$ 17 mil. E qual é o BEV mais barato? Poderia ter sido o “carro de US$ 25 mil” da Tesla, mas infelizmente a empresa optou pelo CyberTruck. Como resultado, é o Nissan Leaf envelhecido a US$ 28 mil com 40 kWh, antes dos incentivos: Nota: os impostos sobre vendas são extras nos EUA, por exemplo, 8,625% em São Francisco.

As montadoras chinesas poderiam preencher a lacuna? Não é provável em um futuro próximo, mas mais provável em algum momento. As tarifas de 102,5% do governo Biden efetivamente os excluíram. Estabelecer a fabricação local pode ser a única rota economicamente viável — mas isso é um jogo longo. Eles teriam que montar uma loja localmente ou no Canadá ou no México (onde já têm uma presença comercial substancial) e atender aos requisitos de conteúdo local do USMCA. Enquanto isso, as montadoras dos EUA correm o risco de ficar para trás na relação custo-benefício e na eficiência do desenvolvimento de produtos, perdendo assim a competitividade no mercado global.

As startups podem trazer produtos com preços mais baixos para os EUA? Mercado?

Startups podem oferecer um caminho a seguir. A Slate, com sede em Detroit, fundada em 2022, está trazendo ao mercado uma picape refrescantemente modesta com uma abordagem modular bem pensada. Apenas 4,45 metros de comprimento com um corpo bastante estreito, “Caminhão” custa menos de US$ 27,5 mil (pré-incentivos), ou seja, metade do preço médio dos EUA. BEBIDA Os recursos são intencionalmente simples: janelas manuais, painéis não pintados e uma abordagem de “traga sua própria tecnologia” para infoentretenimento.

Tive a chance de ver uma maquete pessoalmente em Los Angeles em abril (imagens acima): é uma notícia revigorante e ótima para o mercado dos EUA, onde muitos veículos se tornaram obscenamente grandes e pesados. A Slate planeja aumentar o lucro por meio de acessórios — envoltórios de carroceria, grades frontais, kits para converter a picape em um SUV e muito mais — graças a um design modular. A empresa arrecadou US$ 700 milhões até o momento e precisará de mais financiamento à medida que se aproxima do início da produção em Indiana no final de 2026.

Depois, há também— sim, esse é o nome da empresa — uma empresa de EV acessível que recentemente se separou da robusta fabricante de EV Rivian. Arrecadou US$ 105 milhões, enquanto a Rivian mantém uma participação minoritária substancial. A empresa planeja trazer uma gama de veículos pequenos e leves do tipo “micromobilidade” para o mercado com um alto grau de integração vertical. Estou ansioso para ver o primeiro veículo da Also com vencimento no início de 2026 e espero que ajude a fornecer a mais pessoas acesso a novas rodas (elétricas), claramente neste caso para distâncias curtas.

Marc Amblard.

Diretor Administrativo, Orsay Consulting

Repensar a Indústria Automóvel: Tecnologia, Tarifas e China

A indústria automóvel enfrenta uma enorme pressão por vários motivos, como a tecnologia, geopolítica, concorrência chinesa, modelos operacionais e a regionalização das necessidades dos clientes. Estes desafios profundos colocam a indústria automóvel europeia e norte-americana em risco. Além disso, expõem as economias destas regiões, dado o peso do setor nos seus PIBs — cerca de 7% na Europa (14 milhões de empregos) e 5% nos EUA (10 milhões de empregos). Acresce o efeito multiplicador significativo do setor automóvel noutros setores, como o do aço e dos serviços, bem como noutras economias através das cadeias de fornecimento globais.

Responder a estes desafios simultaneamente requer capital significativo. No entanto, a rentabilidade dos fabricantes de equipamento original (OEMs) está a ser afetada, uma vez que o mercado chinês deixou de ser uma fonte de lucro e passou a representar uma drenagem financeira para vários intervenientes. As expectativas de crescimento dos veículos elétricos (VE) não se concretizaram e os mercados europeu e norte-americano continuam abaixo dos níveis pré-Covid.

Que desafios enfrentam estas regiões, qual o seu impacto na indústria automóvel europeia e americana, e como poderão OEMs, fornecedores e outros intervenientes responder-lhes?


Disrupções Tecnológicas em Várias Frentes

A disrupção tecnológica mais profunda vem, provavelmente, da transição energética, que afeta o setor automóvel tal como muitos outros. As suas consequências são visíveis não apenas no design de novos veículos, mas também a montante (por exemplo, baterias, eletrónica de potência) e a jusante (reciclagem), nas infraestruturas energéticas que passam do abastecimento para o carregamento, e nos serviços.

A transição de veículos com motor de combustão interna (ICE) para veículos elétricos (VE) não tem sido linear, obrigando os OEMs a relançar programas de desenvolvimento de ICE e a investir em novas arquiteturas como os VEs com extensor de autonomia baseado em ICE.

A omnipresença do software está também a transformar profundamente a forma como os veículos são concebidos, produzidos, utilizados e assistidos. A mudança para veículos definidos por software (SDV) implica uma profunda remodelação da arquitetura elétrica/eletrónica, com alguns computadores de alto desempenho a substituir dezenas de unidades de controlo eletrónicas (ECUs) fechadas e específicas. Esta disrupção baseada em software é também visível na crescente implementação de sistemas avançados de assistência à condução (ADAS) e na emergência da condução autónoma.

A inteligência artificial oferece muitos benefícios potenciais ao longo de toda a cadeia de valor — desde a extração de minerais, passando pelo design e engenharia, até à produção, vendas, experiência do utilizador e serviços. Vários OEMs já implementaram IA generativa nos seus assistentes digitais, e a maioria dos intervenientes na indústria está a testar IA para avaliar possíveis ganhos de eficiência. Veja o meu artigo de fevereiro de 2025 “O Futuro da Indústria Automóvel Impulsionado pela IA” para uma análise mais aprofundada.

As empresas não têm alternativa senão abraçar estas disrupções tecnológicas em paralelo, o que pode exigir muitos recursos. Para o fazer de forma mais eficiente, os intervenientes da indústria podem formar parcerias em tecnologias não diferenciadoras (por exemplo, sistemas operativos, baterias, hardware de computação, ou infraestrutura de carregamento). Devem também reforçar capacidades regionais para cobrir toda a cadeia de fornecimento das baterias. Por fim, é essencial alavancar a IA sempre que possível para aumentar a eficiência.


Geopolítica e Macroeconomia em Turbulência

A crise da Covid causou uma enorme disrupção nas cadeias de fornecimento da indústria, o que levou a esforços para dissociar economias regionais e relocalizar (ou aproximar) algumas fontes de fornecimento. A crise provocou também uma queda acentuada nos volumes de produção, que ainda não recuperaram para os níveis de 2019 na Europa ou nos EUA, acentuando a pressão para reduzir os custos fixos.

Além disso, o crescimento dos VEs sofreu um abrandamento em ambas as regiões em 2024, após vários anos de crescimento anual entre 30 e 50%, deixando capacidade por utilizar e custos de I&D por absorver. O caminho para a mobilidade elétrica continuará atribulado nos próximos anos, apesar de a tendência ser clara e irreversível.

O recente bombardeamento de tarifas — contra toda a lógica económica — imposto pela nova administração norte-americana é, de longe, o evento mais disruptivo que a indústria enfrenta atualmente. De momento, todos os veículos importados para os EUA estão sujeitos a uma taxa de importação de 25%, exceto os provenientes do México e do Canadá, desde que cumpram os critérios do USMCA. À data em que escrevo este artigo, algumas peças importadas também passarão a ser tarifadas a partir de maio, afetando o custo dos veículos produzidos nos EUA. Os preços ao consumidor irão subir!

A incerteza quanto à evolução futura destas tarifas está a levar muitas empresas a adiar grandes decisões de investimento numa postura de espera. Até que ponto devem as cadeias de fornecimento complexas e afinadas ao longo de décadas ser reconfiguradas? Quanto irão cair os mercados nos próximos meses à medida que as tarifas se reflitam nos preços finais?

Independentemente desta dor infligida pelo Governo dos EUA, as cadeias de abastecimento já estavam em transformação profunda para localizar a produção de baterias e as cadeias de fornecimento a montante tanto na Europa como nos EUA. Este movimento continua, embora vários projetos tenham sido cancelados ou adiados nos EUA devido às ações e discurso da nova administração. Contudo, a eletrificação está em marcha.

Estas forças geopolíticas e macroeconómicas implicam pelo menos três estratégias: em primeiro lugar, a agilidade tem de estar no centro das cadeias de abastecimento da indústria, apesar de isso ser mais fácil de dizer do que de fazer. Em segundo, os esforços para baixar o ponto de equilíbrio industrial devem continuar, de modo a resistir a grandes variações de volume. Por último, é essencial aumentar a flexibilidade do mix de motorização entre BEV, PHEV, EREV, HEV e ICE.


A China Tornou-se Uma Potência Automóvel

A China era, em tempos, uma enorme fonte de lucro para os OEMs estrangeiros. Já não é o caso! Várias marcas ocidentais tiveram recentemente de subsidiar os seus concessionários chineses para os manter à tona, devido à queda nos volumes. As marcas locais absorveram mais de 60% do mercado chinês em 2024, face a menos de 40% em 2020.

Dezenas de OEMs privados surgiram na China na última década, embora apenas alguns tenham conseguido tornar-se intervenientes relevantes, para além dos incumbentes estatais como a SAIC (dona da MG). A BYD e a Geely não são apenas líderes em volume (4,3 e 3,4 milhões de unidades em 2024, respetivamente), mas também potências tecnológicas com elevada integração vertical. A BYD é o segundo maior produtor de baterias, com 17% do mercado global em 2024, e líder mundial em BEV com 1,8 milhões de unidades vendidas no último ano.

O ganho de quota de mercado doméstico resulta em grande parte do salto tecnológico. Os OEMs chineses desenvolveram uma vantagem em tecnologia de baterias, software, experiência do utilizador, ciclos de desenvolvimento e mais. Um exemplo interessante é o SU7 da Xiaomi, com a sua UX integrada líder de segmento: 135 mil unidades vendidas em 2024, apesar de ter sido lançado apenas em maio e ser o primeiro carro da marca.

O impacto desta aceleração chinesa sente-se fortemente no estrangeiro. A China é agora o maior exportador de automóveis, com quase 6 milhões de veículos exportados em 2024, face a 1 milhão em 2020. Domina também a cadeia de fornecimento global de baterias — desde a mineração (alguns minerais), processamento, até à produção de eletrodos e baterias (mais de 70% de quota de mercado global). A sobrecapacidade crónica levou a uma guerra de preços que limita a capacidade dos intervenientes não chineses de tornar viáveis os seus projetos.

Os OEMs estrangeiros reconhecem esta lacuna tecnológica e pretendem colmatá-la. O Grupo VW irá utilizar tecnologia SDV da Xpeng para o mercado local, e uma joint venture liderada pela Stellantis distribui veículos da Leapmotor fora da China — ambos os OEMs também investiram nos seus parceiros chineses. O mais recente Renault Twingo EV foi desenvolvido por uma empresa de engenharia chinesa. A Toyota, a Mercedes e a Nissan fizeram parcerias com a Momenta para tecnologia ADAS.

Estes OEMs não só devem colher benefícios operacionais das suas parcerias a curto prazo, como também aprender com elas para acelerar a sua própria transformação. Além disso, é essencial acelerar a redução de custos dos produtos para aumentar a competitividade. Consulte o meu artigo de fevereiro de 2025 para uma análise mais detalhada sobre a transformação chinesa.


O Modelo Operacional e a Força de Trabalho Devem Evoluir

Com o surgimento de tecnologias disruptivas em várias frentes, OEMs e fornecedores perceberam que, em muitos casos, a forma mais eficaz de levar novas tecnologias ao mercado é através de parcerias com startups. A estrutura clássica de fornecimento por níveis foi parcialmente substituída por desenvolvimentos conjuntos, por vezes com empresas de apenas algumas dezenas de colaboradores. A agilidade aqui é crucial para maximizar a criação de valor para todas as partes.

Como referido acima, os intervenientes do setor podem também formar parcerias com concorrentes para industrializar tecnologias não diferenciadoras, de modo a minimizar o risco e o investimento de capital. Isto aplica-se tanto a novas tecnologias (baterias, hardware de computação) como a tecnologias maduras, como motores de combustão interna e transmissões. A joint venture de motorização entre a Renault, a Geely e a Aramco — a Horse Powertrain — é um excelente exemplo, pois reduz a diversidade, partilha os custos de desenvolvimento e consolida a capacidade.

A força de trabalho da indústria automóvel é fortemente influenciada pelas disrupções referidas. O impacto reflete-se na localização dos trabalhadores à medida que as cadeias de abastecimento migram, nas competências exigidas pelas novas tecnologias e na própria dimensão da força de trabalho, à medida que a IA permite ganhos de eficiência. A reconversão e requalificação de certas categorias de trabalhadores é fundamental. Devem ser desenvolvidos programas alargados, não apenas no setor automóvel, mas em toda a economia, para lidar com esta questão.

Pode ainda acrescentar-se a esta lista de transformações a crescente regionalização das expectativas dos clientes — desde o infotainment e a integração perfeita entre dispositivos, personalização, preferência por VEs, tamanhos de veículos e mais. Por isso, os intervenientes da indústria devem reforçar as capacidades regionais para desenvolver experiências específicas por região em plataformas globais e aumentar a agilidade com maior descentralização da tomada de decisões.


A era atual apresenta um conjunto único de desafios e oportunidades para a indústria automóvel a nível global. Os riscos são elevados. Podemos esperar uma vaga de consolidações, pois nem todos os intervenientes conseguirão enfrentar este enorme desafio. Tal será provavelmente necessário para garantir a força da indústria automóvel no futuro.

Marc Amblard
Diretor-Geral, Orsay Consulting

Mercados de E-Mobilidade

A eletromobilidade é a única tecnologia de propulsão que merece ser mencionada para o futuro. O hidrogénio, os e-combustíveis ou até os motores de combustão já não são uma opção para os automóveis de passageiros. A única questão agora é a velocidade com que a transformação vai avançar. Quais mercados estão a progredir e quais estão a ficar para trás. Esta não é apenas uma questão para a indústria automóvel, mas está também a tornar-se cada vez mais importante à luz da capacidade inovadora geral das economias nacionais.

Na Europa, em particular, os países estão a impulsionar a transição dos transportes com uma grande variedade de estratégias.

A Escandinávia estabelece padrões no que diz respeito à eletromobilidade

Os países escandinavos são o padrão de ouro na Europa quando se trata de eletromobilidade. Estão a liderar a mudança com uma visão clara, incentivos de longo prazo e medidas inovadoras. E não hesitam em aplicar regulamentações claras. Em Oslo, por exemplo, apenas táxis elétricos são agora permitidos nas estradas. Esta regulamentação foi adotada em setembro de 2020 e entrou oficialmente em vigor após um período de transição de pouco mais de quatro anos. As exceções aplicam-se apenas a viagens de táxi que ultrapassem os limites da cidade.

  • Em geral, os carros elétricos dominam o mercado na Noruega como em nenhum outro lugar. Em 2024, quase 9 em cada 10 novas matrículas (89%) foram exclusivamente elétricas. De um total de 128.691 novos veículos, 114.400 foram carros elétricos — um recorde mundial. O governo norueguês tem como objetivo ambicioso registar apenas veículos elétricos novos a partir de 2025.
  • Na Suécia, os carros elétricos representaram cerca de 34% das novas matrículas em 2024. O país está a planear uma inovação única a nível mundial: a primeira estrada permanentemente eletrificada onde os veículos elétricos podem carregar enquanto conduzem.
  • A Dinamarca também está a fazer progressos impressionantes: os carros elétricos representaram mais de metade das novas matrículas em 2024.
  • Na Finlândia, a quota de mercado dos carros elétricos em 2024 foi de pouco menos de 29%.

O sucesso dos países escandinavos baseia-se menos em prémios generosos de compra, uma vez que estes foram em grande parte descontinuados há alguns anos. Em vez disso, deve-se à elevada tributação dos carros de combustão. Outro fator é o caráter de longo prazo: todas as medidas (ou a sua abolição) são anunciadas com antecedência e mantidas mesmo após mudanças de governo, proporcionando aos cidadãos uma base fiável para o planeamento.

França

Em França, as vendas de carros elétricos registaram um crescimento sólido no ano passado. Quase 250.000 veículos elétricos foram registados na primeira metade do ano — um aumento de 7% em relação ao ano anterior.

Os carros totalmente elétricos alcançaram uma quota de mercado de 17,3%. No primeiro trimestre, chegaram mesmo a representar 18,9% de todas as novas matrículas. O Peugeot e-208 foi particularmente popular, liderando a lista dos carros elétricos mais vendidos em França com 17.341 unidades vendidas, seguido de perto pelo Tesla Model Y e o Renault Megane E-Tech.

Além disso, um programa de leasing subsidiado será reintroduzido a partir de 2025 para baixar ainda mais as barreiras de entrada.

Apesar destes desenvolvimentos positivos, o caminho para um futuro elétrico não está isento de obstáculos. O orçamento para financiamentos de 2025 foi reduzido em um terço (de 1,5 para 1 mil milhões de euros), o que está a diminuir os incentivos financeiros. O aumento dos preços da eletricidade e uma infraestrutura de carregamento inadequada, especialmente nas regiões rurais, também estão a diminuir o entusiasmo.

Alemanha e Europa de Leste estão a ficar para trás

A Alemanha carece de uma estratégia clara e ainda está presa a uma indústria interna vacilante que ainda não parece ser capaz de colocar bons carros elétricos no mercado.

Em 2024, um total de 2.817.331 novos carros de passageiros foram registados, ligeiramente menos do que no ano anterior (-1%). Desses, 380.609 foram BEVs (14%). O número de novas matrículas de carros elétricos caiu significativamente em relação ao ano anterior (-27%).

O número total de carros elétricos na Alemanha cresceu para cerca de 1,79 milhões, o que corresponde a 3,6% de todos os carros de passageiros registados. O declínio nas novas matrículas de carros elétricos a bateria deve-se principalmente à relutância dos consumidores privados em comprar, que pediram 39% menos carros elétricos em comparação com o ano anterior.

Embora o Tesla Model Y tenha estado no topo da lista de modelos BEV recém-matriculados, tal como no ano anterior, o número de novas matrículas da Tesla na Alemanha caiu 41% no total.

Em comparação com o Norte e Oeste da Europa, a transição para a mobilidade no leste do continente também é bastante lenta e hesitante. Seja na Polónia, Hungria ou Roménia, a quota de e-cars nas novas matrículas é relativamente baixa.

Um dos principais obstáculos é a infraestrutura de carregamento ainda muito fragmentada. No entanto, estão a acontecer desenvolvimentos importantes: por exemplo, um moderno parque de carregamento rápido com 24 pontos foi inaugurado em Kaunas, na Lituânia, no final de 2024 — o maior centro de carregamento nos Estados Bálticos.

Portugal

Em termos de números de vendas, 2024 foi um ano recorde para Portugal: quase 42.000 veículos exclusivamente elétricos (BEVs) e mais de 28.000 híbridos plug-in (PHEVs) circularam nas estradas.

Isto significa que Portugal atingiu um verdadeiro marco em dezembro, quando mais de 10.000 carros elétricos foram matriculados num único mês pela primeira vez. A Tesla lidera as tabelas e demonstra que a fascinação pelo pioneiro elétrico continua forte, mesmo no Atlântico.

Mas por trás dos números impressionantes, existe um sistema que ainda tem lacunas. A rede pública de carregamento pode ser expandida. Mais de 100 municípios ainda estão à procura de operadores para as primeiras estações de carregamento rápido.

E se quiser carregar fora da sua própria garagem, terá que abrir os cordões à bolsa — os preços nas estações públicas são frequentemente o dobro dos preços em casa. A razão? Pouca concorrência e falta de apoio à expansão.

Espanha

2024 foi um ano de sentimentos mistos para a eletromobilidade em Espanha. As vendas totais de veículos elétricos e híbridos plug-in caíram ligeiramente para 125.185 unidades — uma queda de 0,4% em relação ao ano anterior.

Com uma quota de mercado de 5,4%, os e-cars ficaram muito atrás de outros grandes países da UE. No entanto, em novembro, representaram 11,4% do mercado total, mostrando que há definitivamente interesse na mobilidade eletrificada em Espanha — ainda que de forma cautelosa.

Uma luz de esperança foi o programa de subsídios MOVES III, que expirou a meio do ano. Este ofereceu subsídios para compra de até 7.000 euros, ajudando muitas famílias espanholas a iniciarem-se na e-mobilidade.

Os compradores também podem contar com benefícios fiscais até ao final de 2025: 15% das despesas com um e-carro, até um máximo de 20.000 euros, podem ser deduzidas do IRS. Para o período após o MOVES III, o governo já está a preparar um novo programa para impulsionar ainda mais o mercado.

No entanto, tal como noutros países do sul da Europa, a procura por carros elétricos não está a atingir as expectativas. Uma das principais razões é a infraestrutura de carregamento mal desenvolvida. As estações de carregamento são escassas, especialmente em regiões menos povoadas — e quando existem, muitas vezes não são rentáveis, pois ainda há poucos veículos elétricos nas estradas.

Eletromobilidade mundial: um olhar além do horizonte

A eletromobilidade já não é uma questão apenas europeia ou norte-americana — e na Ásia também não está limitada à China. Cada vez mais países à volta do mundo estão a adotar a transição verde, com abordagens variadas e sucessos impressionantes.

Na Turquia, por exemplo, a eletromobilidade está a ser impulsionada com enorme ambição. Até 2035, um total impressionante de 4,2 milhões de veículos elétricos deverá estar nas estradas, e o país pretende produzir localmente 75% desses veículos. Uma parceria ambiciosa com o fabricante chinês BYD deverá ajudar a aumentar a produção anual para 1 milhão de veículos até 2030.

Na Tailândia, os e-cars também se tornaram uma prioridade, com a BYD a desempenhar um papel central. O governo tailandês está a atrair investimentos, mas enfrenta obstáculos: o excesso de oferta de veículos elétricos levou recentemente a armazéns cheios, o que está a abrandar temporariamente o mercado.

Mesmo assim, a Hyundai tem grandes planos para começar a produzir carros elétricos e baterias no país em 2026.

Os EUA desempenham um papel central no mercado da eletromobilidade, tanto como importante mercado de vendas como através de medidas políticas para promover esta tecnologia. A rápida expansão da infraestrutura de carregamento e programas como o Inflation Reduction Act e o Bipartisan Infrastructure Law apoiam tanto a produção como a compra de veículos elétricos.

Fabricantes norte-americanos como Tesla, GM e Ford são fundamentais para o desenvolvimento e expansão dos veículos elétricos nos EUA e no resto do mundo.

Conclusão

A mobilidade elétrica é importante na maioria dos países do mundo para reduzir as emissões de CO₂ e combater as alterações climáticas. Os avanços tecnológicos, os subsídios estatais e a crescente consciência ambiental desempenham um papel essencial neste processo.

225 mil

Um belo número, principalmente se pensarmos que representa árvores plantadas em Portugal e que tal se deve ao empenho de uma empresa privada, a Toyota Caetano Portugal.

“As árvores são poemas que a terra escreve para o céu”. António Loureiro, Presidente do Município de Albergaria-a-Velha, citou assim Khalil Gibran, numas breves palavras de agradecimento pelas 12 mil árvores que a Toyota Caetano Portugal vai plantar no município, que sofre ainda – e vai sofrer por muito tempo, acrescento – todas as dores provocadas pelos fogos do Verão passado.

No entanto, a plantação destas 12 mil árvores acontece, porque a Toyota Caetano Portugal tem um programa de captura de carbono, desde 2005. A ideia tem a singeleza das coisas simples de entender e o empenho de quem trabalha com os olhos postos no amanhã.

Há 20 anos, foi lançado um chavão: “Um Toyota, Uma Árvore”. Mas, mais do que tudo foi lançado um objectivo, se calhar um ideal, e este, a cada ano que passou, foi-se enraizando – literalmente – no ADN do importador da marca nipónica. Como canta a Sónia Tavares, “é fácil de entender”: por cada unidade vendida, é plantada uma árvore de floresta autóctone, ou seja, quando se comemoram 20 anos do projecto, terão sido vendidas 225 mil unidades desta marca e, portanto, plantadas 225 mil árvores.

José Ramos, Presidente do Concelho de Administração da Toyota Caetano Portugal, invocou o conceito de “kaizen”, o objectivo da melhoria contínua. “Kaizen” é uma palavra japonesa, que significa melhoria, mudança e é mais do que um conceito, é uma filosofia, naturalmente nascida no País do Sol Nascente, que busca o aperfeiçoamento constante, por exemplo, através do envolvimento dos funcionários; que persegue a inovação e assim obter sucesso e vantagem competitiva no longo prazo. Este conceito, ideal ou filosofia, enraíza-se hoje em inúmeras empresas, como é, naturalmente, o caso da Toyota Caetano Portugal.

Escrevo estas linhas no dia 21 de Março de 2025, Dia Mundial da Árvore, Dia Internacional das Florestas e Dia Mundial da Poesia. Não me ocorre um melhor momento para comemorar 20 anos de “Um Toyota Uma Árvore”, mas também para ter conhecido o “Bosque”, um espaço arborizado, com espécies autóctones, nas traseiras da sede da empresa, em Gaia, que serve já para capturar o carbono emitido pelos mais de dois mil funcionários que diariamente laboram nestas instalações.

Neste bosque, foi também lançado um projecto de reforço da biodiversidade, com a instalação de cinco colmeias, que vão ter um objectivo pedagógico. Recordo que em 2019 a Royal Geographical Society de Londres, declarou a abelha como “o ser vivo mais importante do planeta”. Só para explicar: oitenta por cento do que comemos, em última análise, é fruto da acção polinizadora das abelhas.

Hoje, fomos plantar árvores e arbustos, talvez umas 22, ou 24, parece pouco, é pouco, mas se as multiplicarmos por mil, já é alguma coisa, só é pena que as acções como esta ainda sejam poucas, pois as árvores, tal como as abelhas, acrescento, nunca são demais.

Aquisição de automóveis chineses: tecnologia, crescimento e expansão global

Nos últimos anos, os fabricantes de automóveis chineses fizeram avanços significativos na esfera global, ganhando proeminência nos mercados de veículos tradicionais e elétricos. Empresas como a BYD, a Geely e a SAIC registaram um crescimento substancial, tendo a BYD emergido para se tornar o maior produtor mundial de veículos eléctricos a bateria e um dos maiores OEM. Estas empresas estão não só a redesenhar o seu mercado interno, mas também a expandir a sua presença na Europa, no Sudeste Asiático e noutras regiões. Uma vez que a capacidade de produção da China excede largamente a procura local, estes fabricantes de automóveis estão a exportar ativamente veículos e a estabelecer alianças estratégicas com fabricantes ocidentais. A ascensão dos fabricantes de automóveis chineses é também impulsionada por inovações na tecnologia, eletrónica e software dos veículos eléctricos, bem como por uma cadeia de abastecimento de baterias líder a nível mundial. Com um forte apoio do governo chinês, estas empresas estão a posicionar-se como concorrentes formidáveis dos antigos gigantes mundiais do sector automóvel, numa indústria cada vez mais eléctrica e orientada para a tecnologia. Para uma opinião anterior sobre este tema, leia China’s Global EV Ambitions – The West Must Act, um artigo que publiquei em abril de 2024.

A BYD subiu rapidamente para o topo do ranking global

A BYD e suas marcas de propriedade integral Denza, Yangwang e Fangchen Bao conseguiram uma corrida surpreendente nos últimos anos, crescendo de cerca de 35 mil unidades por mês em 2020 para mais de 500 mil por mês no final de 2024. No ano passado, a BYD vendeu 4,3 milhões de veículos, um aumento de 41% em relação a 2023, o que posiciona a empresa como a sétima maior OEM em volume.

O OEM foi o líder global de BEV em 2024 (enquanto também vendia EVs plug-in), à frente da Tesla por apenas alguns milhares de unidades. Cada uma das duas empresas controlava cerca de 16,5% do mercado global de BEV — vendendo 1,8 milhão de unidades no ano passado — seguidas pela Geely Holdings com 8,5% (de acordo com a Cleantechnica).

Considerando o maior mercado global de plug-ins, a BYD teve uma enorme liderança em 2024, atingindo 25% das vendas globais de acordo com a mesma fonte — e 34% do mercado chinês. Os OEMs ocidentais mais próximos são o ranking #2 da Tesla com uma participação de mercado global de 10%, a BMW #5 com 3,1% e o VW Group #7 com 2,6%.

Além disso, a BYD ocupa o segundo lugar na produção de baterias EV com 17% dos volumes globais em 2024, logo atrás da CATL com 38%. Esta forte posição participa da profunda integração vertical da BYD, que também inclui motores e eletrônicos de potência. Falando em tecnologia, a BYD anunciou recentemente que estava implantando ADAS de Nível 2 em toda a sua gama. Até mesmo o modelo básico Seagull, que é vendido por menos de US$ 10 mil, será equipado com 12 câmeras e radares de onda de 5 mm.

Não muito atrás da BYD está a Geely Holdings, outra OEM de propriedade privada que fez sua estreia no cenário internacional quando adquiriu a Volvo Cars da Ford em 2010. Sugiro ler meu artigo Geely: Creation of a Global Automotive Empire (dez 2022) para um mergulho profundo na empresa.

O grupo Geely experimentou um crescimento substancial para atingir 3,4 milhão de unidades em 2024 com várias marcas como Geely Auto, Polestar, Zeekr, Lynk & Co, Geometry, Radar, Galaxy, London EV Company ou Farizon (veículos comerciais). A empresa também detém participações na Mercedes-Benz, Smart, Lotus, Aston Martin, Proton e Volvo Group, e tem uma ampla parceria com a Renault (mais abaixo).

OEMs chineses emergentes na vara da inovação

Dezenas de OEMs surgiram na última década. Alguns deles devem ser mencionados, pois demonstram até que ponto os OEMs chineses estão ultrapassando os limites da inovação.

Fundada em 2014, a Xpeng começou a vender carros em 2018 e desde então introduziu seis modelos. As vendas atingiram 190 mil unidades em 2024, incluindo exportações para a Europa, embora o volume permaneça marginal. Mesmo assim, a Xpeng supostamente está procurando um local para produzir no continente. As capacidades técnicas da empresa são tais que o Grupo VW agora está confiando fortemente na arquitetura eletrônica e no pacote de software da Xpeng para seus futuros produtos na China (mais abaixo).

A Xiaomi, uma grande fornecedora de smartphones e outros eletrônicos de consumo, fez com sucesso o que a Apple recusou (ou falhou) em fazer, apesar dos pesados investimentos. A empresa lançou seu primeiro carro, o grande sedã SU7, em maio de 2024. Este veículo é particularmente interessante por sua impressionante integração veículo-smartphone, entre outros recursos. No final do ano, a Xiaomi já havia vendido 135 mil unidades, superando o Modelo 3 da Tesla na China, e anunciou um segundo modelo, o YU7 SUV. Essa velocidade de desenvolvimento e crescimento é impressionante para uma empresa sem experiência automotiva anterior.

O Excesso De Capacidade Da China Alimenta o Aumento Das Exportações

A capacidade de produção na China cresceu nos últimos anos, atingindo mais de 45 milhões de unidades, excedendo em muito os 31 milhões de veículos vendidos em 2024. A exportação não é apenas uma oportunidade para os OEMs chineses, mas claramente uma necessidade se eles quiserem aliviar a já forte pressão sobre os preços em seu mercado doméstico. Para aumentar a utilização da capacidade, as montadoras estão visando a Europa, S.E. Ásia, México, Brasil e até Rússia. Em 2024, a China exportou 5 milhões de veículos de passageiros, o dobro do volume enviado em 2022. E a ambição permanece alta. A BYD está prestes a lançar sua quinta transportadora de carros com capacidade para 9.200 veículos.

A Europa representa um foco importante para as marcas chinesas. Em 2024, eles venderam 394 mil veículos no continente, atingindo uma participação de mercado de 3,4%. No entanto, a penetração específica do BEV foi significativamente maior, atingindo 11% no segundo trimestre. De acordo com a Schmidt Automotive Research, 60% dos veículos de marca chinesa vendidos na Europa vão atualmente para três mercados: Reino Unido, Itália e Espanha.

Ainda assim, as vendas na Europa parecem estar sobando após um aumento acentuado nos direitos de importação impostos às importações chinesas a partir de outubro de 2024. Eles agora variam de 17% para BYD a 38,1% para SAIC (o maior player da Europa com a marca MG), além dos 10% pré-existentes.

Consequentemente, a BYD acelera sua localização para contornar as tarifas e anunciou planos para uma terceira usina de montagem na Europa. Com sede na Hungria, o primeiro começará a enviar carros em 2025. O segundo, na Turquia, começará no próximo ano, enquanto a localização do terceiro ainda não foi finalizada.

Os EUA praticamente fecharam seu mercado para veículos de marca chinesa com direitos de importação aumentados para 102,5% pelo governo Biden em 2024. Como resultado, os OEMs chineses consideraram entrar no mercado dos EUA por meio de bases industriais no México (ou Canadá). Os únicos sinais de veículos de marca chinesa nos EUA neste momento são alguns robôs Zeekr agora vagando pelas ruas de São Francisco passando por testes na frota da Waymo. Não espero ver outros modelos chineses nos EUA tão cedo.

OEMs ocidentais alavancando jogadores chineses

Se você não pode vencê-los, junte-os! Vários OEMs europeus formaram parceria com jogadores chineses nos últimos anos. Em 2020, a Mercedes-Benz vendeu uma participação de 50% na Smart para a Geely Holdings. Como resultado, os produtos da marca agora são desenvolvidos pela Geely em uma plataforma Geely, produzidos na China e vendidos em vários mercados.

A Renault começou a colaborar com a Geely Holdings em 2022, quando esta adquiriu uma participação de 34% na Renault Motors Korea, dando à OEM chinesa acesso à capacidade na Ásia. Desde então, a Geely fez uma parceria com a Renault para possuir conjuntamente a Horse Powertrain, uma JV que hospeda seus respectivos recursos de desenvolvimento e fabricação de motores de combustão – os dois possuem 45% cada e a Aramco 10%. No início deste ano, Geely também anunciou que investirá na Renault do Brasil como acionista minoritário, fornecendo aos chineses produção local e uma rede de distribuição. Essa colaboração claramente se tornou global.

Em 2023, o VW Group investiu US$ 700 milhões para uma participação de 5% na Xpeng, com planos de construir veículos com destino à China na plataforma existente desta última. No ano passado, a colaboração foi expandida para alavancar a experiência da Xpeng e desenvolver em conjunto arquiteturas eletrônicas e SW para o mercado chinês. Espera-se que os produtos resultantes equipem EVs da marca VW a partir de 2026.

Stellantis gastou 1,5 bilhões de euros por uma participação de 21% na Leapmotor em 2023. Juntos, eles montaram uma JV para lidar com os negócios deste último fora da China, sendo a Stellantis a maioria das partes interessadas. Os dois jogadores rapidamente começaram a produzir o pequeno EV T03 da Leapmotor na fábrica polonesa da Stellantis para o mercado europeu. Devemos esperar mais colaborações transfronteiriças entre OEMs, assim como elas estão sendo cada vez mais formadas entre OEMs e empresas de tecnologia chinesas.