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Green Future-AutoMagazine

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Opinião

A Cidade como Espaço de Trabalho

Esbater as diferenças entre casa e local de trabalho

As cidades do futuro tornar-se-ão mais habitáveis. Espaços multifuncionais, diversidade e inclusão são estratégias espaciais de futuro, que oferecem aos habitantes e negócios locais muitas mais oportunidades e opções do que hoje. As fronteiras entre trabalho e o ambiente espacial estão a esbater-se de forma crescente. As transições são fluidas; no futuro, participar numa videoconferência no banco de um jardim público fará parte do dia de trabalho, tanto como a festa de aniversário de uma criança.

O novo Metro Campus de Düsseldorf (www.metro-campus.de) é um destes espaços. Construção arquitetonicamente sustentável e um espaço público que se funde em espaços de trabalho, lazer e habitação altamente atrativos – no centro da cidade. Um local que é tão atrativo para trabalhadores como para residentes e turistas. Estes são locais com futuro porque não se reduzem a uma só função essencial. A administração local, os políticos locais e a comunidade empresarial estão todos comprometidos com este tipo de desenvolvimento urbano.

Terceiros locais, quartos, quintos…

Existem cada vez mais locais e espaços que são tudo: espaços de trabalho, de lazer e espaços públicos: o carro, o transporte público, o café, o antigo posto de abastecimento que não já não reconhecemos porque o abastecimento centralizado de energia fóssil foi substituído por uma paisagem energética pós-fóssil descentralizada. As exigências destes meios de transporte e destes locais são as mesmas em todo o lado: internet ubíqua, privacidade e segurança de dados.

O trabalho de casa nesta área não foi, de todo, completado por fabricantes e fornecedores. Uma viagem de comboio pode, muitas vezes, ser divertida, mas isto não se aplica à capacidade da internet. Em 2022, muitas regiões da Europa são ainda ‘países em desenvolvimento digital’, e a disponibilidade universal de dados é ainda uma realidade longínqua. Contudo, no futuro teremos de utilizar ofertas que disponibilizam largura de banda temporária ou servidores seguros – por exemplo, numa videoconferência ou numa transmissão segura de dados. Esta possibilidade estará disponível no automóvel ou no autocarro público, mas também no jardim público, nas zonas pedonais e nas áreas de descanso das autoestradas. As exigências sobre o espaço público e os espaços de trabalho alteraram-se drasticamente a este respeito.

Novas exigências dos espaços públicos de trabalho

Trabalhar no espaço público tornou-se parte do dia-a-dia de muitas pessoas durante a pandemia de COVID-19, uma vez que nem todos tinham espaços de trabalho apropriados ou espaço suficiente em suas casas. No entanto, as exigências para o trabalho público terão de melhorar no futuro: o barulho do tráfego será reduzido ao mínimo à medida que mais cidades decidam introduzir um limite de velocidade de 30 km/h. Combinando a eletromobilidade e menos carros na cidade, o ambiente vai melhorar ainda mais.

A capacidade de trabalho também será crucial em tempos de alterações climáticas. Até mesmo nas latitudes do norte da Europa, haverá mais e mais dias com temperaturas acima de 40ºC, e a meta de 1,5ºC dos Acordos de Paris poderá mesmo ser ultrapassada nos próximos cinco anos.

As alterações climáticas já ocorreram. Por isso, os espaços públicos (e os escritórios) necessitam de sombras e sistemas de arrefecimento, natureza e biodiversidade para manter a capacidade de serem espaços de trabalho e proteger os ecossistemas. Os desertos de cimento estão a ser removidos e árvores e vegetação estão a ganhar o seu lugar nas cidades. Áreas verdes, permeáveis, que fornecem sombra e frescura, são importantes para uma melhor qualidade de vida. Milão, por exemplo, está a implementar o going green em larga escala. A metrópole da moda e da criatividade planeia plantar três milhões de árvores até 2030: em escolas, em telhados e ao longo das ruas. De acordo com as estimativas, as novas árvores podem reduzir a temperatura média da cidade em 2ºC e aumentar dramaticamente a capacidade de trabalho.

Desconstruir as áreas tradicionais

As áreas comerciais, no sentido tradicional, também oferecem potencial para melhorar as suas condições como espaços de trabalho. Áreas monofuncionais, isoladas da cidade, com baixa eficiência na utilização dos espaços e, por vezes, altas taxas de emissões, oferecem poucas qualidades. As estratégias contemporâneas debruçam-se cada vez mais sobre estes défices: o reforço cuidadoso da diversidade (residencial, educacional e comercial, em parte através da densificação vertical), a abertura de áreas segregadas e a criação de espaços verdes e de espaços recreativos, a eliminação da dependência do automóvel através de conceitos de mobilidade integrada (incluindo bicicletas e formas de mobilidade on-demand), bem como uma integração regional mais forte, são estratégias importantes que promovem, de forma inteligente, a sensação de trabalhar na cidade ou nos seus limites. Utilizações intermédias temporárias podem também reduzir o hiato entre os negócios e as novas economias; afinal, serviços específicos por setor são um dos caminhos económicos estratégicos para os países ocidentais industrializados.

Trabalhadores móveis e sustentáveis são os trabalhadores qualificados do futuro

E enquanto as cidades se tornam novamente mais saudáveis e mais ativas, isto também acontece com os trabalhadores. Uma empresa que ainda acredite que pode atrair trabalhadores com lugares de estacionamento à frente da porta de entrada está no caminho errado. Os lugares de estacionamento deveriam ser reduzidos ou completamente abolidos no decurso do processo de transformação social – isto também pouparia muito dinheiro. E, no seu lugar, criados espaços ativos ou contemplativos.

Em média, as pessoas que trabalham em escritórios dão apenas cerca de 1.500 passos por dia. Afinal, passam metade do seu dia sentados em reuniões, nas suas secretárias, nos percursos que efetuam nos seus automóveis ou a ver televisão em casa. Isto torna as pessoas doentes. Na Alemanha, são perdidos mais de 60 milhões de dias de trabalho por ano devido a problemas de costas. Mas existe um remédio simples: caminhar ou andar de bicicleta. Faz parte da responsabilidade corporativa usar as novas possibilidades da cidade e tornar-se parte do seu ecossistema. O mais importante não é já haver uma cantina ou uma cafetaria no edifício, mas é antes a utilização dos recursos da cidade que se torna um modelo de sucesso. Numa cidade multifuncional, isto oferece às empresas tudo o que necessitam: restaurantes, bibliotecas, supermercados e muito mais.

Cada vez mais cidades estão a romper com a sua uniformidade. Muitas estão a experimentar novas abordagens e novos desenhos para voltarem a atrair pessoas e negócios. Para as empresas, isto oferece oportunidades inteiramente novas na competição por localizações. Uma empresa inovadora vai hoje instalar-se ainda numa rua movimentada, quando, noutros locais, tranquilidade e centralidade não são mais uma contradição de termos? E que especialista altamente qualificado se envolveria hoje com uma empresa na qual o ‘carro de serviço’ com motor de combustão é ainda visto como um incentivo, enquanto outras empresas dão mais importância ao acesso à mobilidade?

Algumas cidades e empresas compreenderam já que a sociedade do conhecimento não se baseia em princípios do passado. Isto acelerará ainda mais o processo de transformação dos espaços urbanos. Por outro lado, outras cidades vão ficar ainda mais para trás nesta competição por localizações, à medida que os trabalhadores qualificados, que se tornaram um fator crítico de sucesso, se tornam cada vez mais escassos, hoje e no futuro.

Stefan Carsten, consultor e especialista na área do Futuro das Cidades e Mobilidade, vive o futuro há mais de vinte anos. É um dos responsáveis pelo início da transição da indústria automóvel de um setor centrado no veículo para um setor centrado na mobilidade. Atualmente, vive e trabalha em Berlim.

A mobilidade elétrica e a transição energética podem jogar na mesma equipa?

Será que este caminho da transição energética acelerada e da mobilidade sustentável (leia-se elétrica, entre outras) pode estar em risco com todas as atuais mudanças ao nível da geopolítica e da crise energética na Europa?

Como já venho alertando em vários artigos aqui na revista, o caminho pode tornar-se penoso para a Europa, cuja vontade é mais ideológica do que racional sobre transição energética. E isto porque o mundo é global e as empresas europeias competem globalmente com outras congéneres na China e nos Estados Unidos da América (EUA).

Nesta fase, e para nos situar, o que apresento de seguida são factos e não ‘achismo’: o custo do capital vai aumentar significativamente; não é uma questão de qual a direção das taxas de juro, pois é uma certeza, mas sim da velocidade deste ajustamento. O financiamento barato terminou e o risco cambial aumentou. Estamos num momento de inflação galopante e não temporária, como nos apregoaram, nos últimos 10 meses, os bancos centrais. A perturbação em algumas cadeias de abastecimento, como a automóvel, mantém-se; a questão do tema energia e a sua gestão parece estar totalmente descontrolada e imprevisível, pelo menos na Europa (o gás natural é atualmente equivalente a 410 dólares por barril de petróleo). Podemos ter de enfrentar um inverno sombrio, sendo que a dívida das empresas de energia (e similares) é atualmente superior a 50%, quando comparada a 2020. O “monstro” das dívidas soberanas volta ao de cima e os ciclos de tomada de decisão ficam mais curtos nos investimentos.

A melhor forma de prejudicar uma causa é defendê-la deliberadamente com argumentos falsos

Friedrich Nietzsche

Em paralelo, nos últimos meses, em Portugal, as vendas de automóveis elétricos duplicaram. Note-se que estamos entre os 10 países europeus com maior penetração de veículos elétricos/híbridos relativamente a novos veículos vendidos. A rede de pontos de carregamento a nível nacional já ultrapassou os 4000 – considerada boa a nível europeu – e o número de utilizadores desta rede aumentou mais de 60% nos últimos meses. São dados significativos se ainda juntarmos, pelas minha contas, que carregar 100 km num veículo elétrico pode custar cerca de 2 euros em casa e uns 7 euros numa rede de carregamento público, mas pode custar 10 a 12 euros se estivermos a falar de um veículo a combustão. A pergunta que se deve sempre colocar é: qual a origem da energia elétrica que alimenta o seu ‘carro a pilhas’? (E não me vou alargar!)

Outra situação adicional, que vou deixar para um próximo artigo, é o custo de transação na troca de uma bateria, assim como o valor de retoma ou de um usado elétrico devido a este novo elemento, que é o valor e o peso no preço deste novo componente principal, ‘as pilhas’. As baterias têm um tempo de vida em função dos ciclos de carregamento, assim como a limitação e escassez de um dos seus principais componentes, o lítio. Alguns especialistas apontam que, se a atual taxa de produção continuar, não haverá mais lítio para extrair após 2040 (para além de ser muito difícil de reciclar). Embora, como entusiasta convicto, acredite na evolução das atuais tecnologias em benefício de todos e do planeta. Basicamente, as baterias são, essencialmente, um exercício entre a velocidade de carregamento e a durabilidade, assim como a capacidade e o preço. Pense nisto!

Mas vamos ao jogo que o trouxe a este artigo. Há 20 anos que se adotam medidas para baixar a pegada de dióxido de carbono (CO2). Parece-me é que algumas delas, no contexto atual, são mais ameaçadoras do que estimulantes para o ambiente, bem como para a sustentabilidade industrial, pois não garantem (hoje!) preços competitivos para a indústria quando comparamos com outros mercados. Faço notar que, atualmente, o preço do gás natural nos EUA é 15 vezes menor do que o preço do gás natural na Europa. A economia e a competitividade da Europa podem estar em risco com esta obsessão ideológica da aceleração da transição energética, especialmente neste novo contexto energético.

Julgo que esta transição, para ser justa, só acontecerá se a eletricidade for barata, segura e confiável (preços estáveis). A pressão para a eletrificação massiva de todos os processos de produção, fabricação, transporte (…) só pode ser realizada num ambiente de paz social e eletricidade barata. E para isso temos de esperar pelos próximos meses para saber se será mesmo assim.

A realidade é uma perceção, e quase sempre muito persistente

Albert Einstein

Desde fevereiro que estamos a retirar, julgo eu, importantes lições, com as quais devemos aprender – e fundamentalmente com o desafio de implementar a maior transição energética da história da humanidade a um ritmo acelerado. Não podemos, simplesmente, mudar um sistema de energia por outro. Como já referi noutros artigos, deveria ser mais uma mudança de comportamentos e utilização do que uma mudança de sistema, pois pode ter resultados e consequências desastrosas para todos os europeus.

Sem querer questionar que a descarbonização é o caminho a seguir (e que as energias renováveis ​​e a mobilidade verde devem desempenhar um papel fundamental), a Europa deve ser prudente na velocidade da transição, pois competimos com outras economias e outros preços no acesso à energia elétrica (indústria e consumo final).

Deixo-vos só com estas curiosidades para ilustrar a situação de alguns dos minérios que jogam entre a transição energética e a mobilidade elétrica: o preço do lítio subiu 500% nos últimos 12 meses e teve um aumento de 300% na última década; a sua extração não é isenta de controvérsias devido ao uso massivo de água e das emissões de CO2 (poderíamos também fazer uma analogia com a grafite e o cobalto). O Chile e a Austrália dominam a extração de lítio, enquanto a China domina a sua transformação; no caso do cobalto, a extração é dominada pela República Democrática do Congo, enquanto quem tem a maioria do processamento é a China. O níquel tem a sua extração dominada pela Indonésia e Filipinas, e grande parte da sua transformação está na suspeita do costume, a China. Tinha ideia destes dados? Eu não! Daí esta pesquisa que até a mim me surpreendeu!

Por detrás de toda esta mudança e transição, existe um sistema extremamente complexo. Nesse sentido, e se olharmos para a história da energia e sua utilização no mundo, podemos ver que cada vez que uma fonte dominante de energia muda, as relações de poder (geopolítica) também mudam. E, de conflito em conflito, o mundo está dinâmico e, em parte, incompreensível. Por vezes, não é como desejamos, mas sim como é!

José Carlos Pereira é engenheiro do ambiente, com MBA Executivo em Gestão Empresarial. É business expert, consultor, formador e speaker na área comercial e de negócios internacionais.

O Futuro dos Veículos Comerciais

Os veículos comerciais são essencialmente recursos produtivos, sendo muitas vezes parte de frotas. Consequentemente, os critérios de decisão para a implementação de novas tecnologias são essencialmente baseados em análises operacionais e financeiras objetivas, em vez de critérios subjetivos, como maioritariamente acontece no caso dos veículos privados. Esta dicotomia é um elemento essencial em temas como a aceleração da eletrificação, a Condução Autónoma (CA), modelos de consumo ou a conectividade dos veículos.

Os veículos comerciais incluem fundamentalmente camiões pesados e veículos comerciais ligeiros (VCL). Dependendo se operam em ambiente urbano ou em autoestrada, estes veículos deparam-se como oportunidades e desafios muito diferentes, que justificam a implementação de determinadas tecnologias.

Por exemplo, muitas cidades estão a limitar progressivamente o acesso aos centros urbanos apenas a veículos ‘limpos’, à medida que as entregas last-mile continuam a crescer. Por outro lado, os camiões de longo curso operam em autoestradas divididas, nas quais as interações com outros utilizadores da estrada tendem a ser mais limitadas do que em áreas metropolitanas. Este facto, combinado com a escassez de condutores de pesados, faz com que a condução autónoma seja uma opção apelativa.

Aceleração da eletrificação em todas as aplicações 

Prevê-se que procura por entregas urbanas last-mile cresça 78% até 2030, o que levará a um aumento de 36% do número de veículos de entregas nas cem maiores cidades do mundo, de acordo com o Fórum Económico Mundial, se continuarmos a operar da forma atual.

Isto levará obviamente a um crescimento significativo das emissões de gases de efeito de estufa, bem como do congestionamento urbano. As soluções para evitar este inaceitável futuro incluem a substituição parcial de VCL de entregas por bicicletas elétricas de mercadorias– ou outros veículos ligeiros de mercadorias – e a sua eletrificação, quando as bicicletas não se adequem à carga a ser transportada.

A primeira opção está já a tornar-se crescentemente ubíqua em cidades como Paris ou Londres, onde um conjunto de políticas estão a forçar esta mudança rumo aos veículos ligeiros, originando a emergência de vários tipos de fatores de forma e modelos de negócio.

A eletrificação total dos VCL está a ser progressivamente requerida para que os operadores possam aceder aos centros urbanos. Contudo, os operadores estão também a efetuar esta mudança porque ela resulta em custos totais de propriedade mais reduzidos. Em 2021, foram vendidos na União Europeia 47.000 VCL plug-in, um crescimento de 63% relativamente ao ano anterior, mas ainda representando apenas 3% do total de vendas, contra 18% do mercado de veículos de passageiros. Esta diferença pode ser explicada por uma oferta de produtos mais limitada e, em menor escala, pelos custos iniciais mais elevados.

Tendo estas considerações em conta, novos players estão a entrar no mercado de veículos elétricos de entregas, desafiando os incumbentes [os fabricantes ‘tradicionais’]. A Rivian tem um acordo para fornecer 100.000 carrinhas elétricas à Amazon, e a Arrival vai fornecer 10.000 à UPS. Curiosamente, a GM está a regressar ao mercado de veículos comerciais com a Brightdrop, uma subsidiária dedicada aos veículos elétricos para este segmento. A antiga StreetScooter da Deutsche Post reemergiu como B-On.

Se os VCL são alvos principais da eletrificação, os camiões pesados vão seguir uma tendência semelhante na maior parte das aplicações, começando nas distâncias mais curtas. Incumbentes como a Mercedes-Benz Trucks, Volvo Group ou BYD estão já a oferecer camiões médios e pesados totalmente elétricos, essencialmente para aplicações urbanas e suburbanas. Mas não vão estar sozinhos. A start-up britânica Volta Trucks vai começar as entregas do primeiro veículo, um camião elétrico de 16 toneladas, em 2023. Nos Estados Unidos, a Nikola Motor entregou os seus primeiros tratores elétricos no início de 2022 e espera-se que a Tesla introduza o seu Semi em 2023 e 2024.

As necessidades de carregamento específicas das baterias de várias centenas de kWh destes veículos estão a ser tratadas em paralelo. A comunidade CharIN revelou recentemente o padrão para carregadores de megawatts, que permitem carregamentos até 3,75 MW (a 1.250 V), em comparação com os 350 kW dos atuais veículos ligeiros. Empresas como a WattEV estão a planear estações específicas para carregamento de camiões, de forma a servir o mercado emergente.

As soluções com baterias elétricas (BEV) são ideais para distâncias mais curtas, mas não para longas distâncias. O peso das baterias (aproximadamente 5 kg por cada quilómetro adicional de autonomia num camião pesado) e o seu custo inicial (aproximadamente 100 dólares por quilómetro) são restrições importantes.

As pilhas de combustível de hidrogénio têm menor custo marginal e peso por quilómetro de autonomia, relativamente aos elétricos a bateria. No entanto, o custo das pilhas de combustível e o preço do hidrogénio terá de descer para que esta solução se torne competitiva. Terão igualmente de ser implementadas estações de reabastecimento dispendiosas, pelo menos em corredores de tráfego com elevado volume de camiões ou nas estações de recolha. No entanto, incumbentes como a Mercedes e a Volvo (que estão a desenvolver uma pilha de combustível conjuntamente), assim como a Hyundai e a Toyota, estão a avançar neste domínio.

Carrinhas comerciais alimentadas por pilhas de combustível são também disponibilizadas pela Renault (através da joint-venture Hyvia) e Stellantis (na Europa) como alternativas às soluções elétricas a bateria. Oferecem carregamentos mais rápidos e autonomias potencialmente maiores do que os BEV.

Finalmente, tem emergido uma variedade de opções para adaptar VCL e camiões com sistemas de propulsão elétricos. Isto faz sentido para veículos recentes que têm uma quilometragem elevada e operam em zonas com restrições de emissões. A unidade Re-Factory da Renault e empresas como a Phoenix Mobility fornecem serviços completos de retrofitting.

Condução Autónoma: preparar o lançamento comercial em autoestradas 

A maior parte dos esforços para desenvolver soluções de Condução Autónoma focaram-se primeiramente em robotáxis e shuttles. Contudo, emergiram várias start-ups, desde 2015, que trabalham exclusivamente no segmento dos camiões, como a TuSimple, Embark, Plus ou Kodiak. Em paralelo, a Waymo e a Aurora, dois das empresas mais avançadas na área da CA, criaram e aceleraram as suas atividades com camiões autónomos, por vezes à custa do desenvolvimento de robotáxis, que começou mais cedo.

Enquanto as soluções de CA destinadas ao transporte de pessoas se focam nas aplicações urbanas, aquelas destinadas ao transporte de mercadorias centram-se na condução em autoestrada. São várias as razões para isto acontecer. Remover o custo do condutor e responder à escassez crónica de motoristas de pesados traz benefícios económicos. Por outro lado, conduzir autonomamente em autoestradas é, em certa medida, mais fácil do que num ambiente urbano – menos interações – apesar de haver necessidade de ‘ver’ mais longe, para navegar a velocidades maiores.

Atualmente, as empresas de desenvolvimento de CA para camiões mais ambiciosas anunciam os lançamentos comerciais para o final de 2023 ou 2024 – apesar de, na realidade, isto poder não vir a acontecer. Para a Aurora e a TuSimple, isto implica operações reiteradas com camiões nos estados norte-americanos do Texas e Arizona, onde as condições climatéricas e o quadro regulatório são favoráveis. Mas temos de esperar para ver quando serão retirados os operadores de segurança.

Uma vez que as duas empresas se focam no software e na integração de sistemas, tal como os seus pares, estabeleceram parcerias com a Volvo Group e a Navistar (Volkwagen/Triton Group) para integrarem, no trator, os seus sensores, bem como hardware x-by-wire e de computação. Da mesma forma, a Waymo encontra-se a colaborar com a Mercedes-Benz Trucks.

Os incumbentes não são os únicos a trabalharem no veículo propriamente dito. A sueca Einride tem estado a operar os seus próprios camiões autónomos na Europa há já vários anos – essencialmente como projetos-piloto –, e está agora a expandir-se para os EUA. A Solo AVT foi fundada em 2021 para desenvolver uma plataforma para camiões, desenhada de raiz para ser elétrica e pré-preparada para automação de Nível 4.

Enquanto as aplicações acima referidas se centram em autoestradas (e, possivelmente, em instalações logísticas), espero que as entregas urbanas sejam eventualmente servidas por produtos derivados dos robotáxis, que serão suficientemente modulares para transportar tanto passageiros como mercadorias – possivelmente, até trocando durante o dia. Também estes vão ser elétricos.

Marc Amblard é mestre em Engenharia pela Arts et Métiers ParisTech e possui um MBA pela Universidade do Michigan. Radicado atualmente em Silicon Valley, é diretor-executivo da Orsay Consulting, prestando serviços de consultoria a clientes empresariais e a start-ups sobre assuntos relacionados com a transformação do espaço de mobilidade, eletrificação autónoma, veículos partilhados e conectados.

Transporte Público Barato

A Alemanha tem em marcha uma das maiores experiências levadas a cabo no âmbito da sua iniciativa de transportes públicos. Como parte dos esforços do Governo federal para combater as pressões sobre o custo de vida e os elevados preços dos combustíveis, os legisladores introduziram um passe nacional com um amplo desconto no mês de junho, julho e agosto deste ano. O passe permite efetuar viagens em autocarros, elétricos, metropolitanos, comboios urbanos, regionais e expressos regionais, mas exclui serviços ferroviários de alta-velocidade como o ICE (InterCity Express), bem como os operadores privados.

O passe deve ser primariamente entendido como uma tentativa para aliviar a pressão económica causada pelos altos preços da energia. Outras medidas de transporte público tomadas recentemente em várias regiões do mundo para reduzir os seus custos incluem reduções de preços na Nova Zelândia – os serviços de transporte público na província de Aotearoa têm tarifas a metade do preço de 1 de abril a 31 de agosto – e o passe austríaco Klima, que dá acesso a todos os transportes públicos da Áustria, durante um ano, por 1.095€. Estas abordagens orientadas para o trânsito público (apesar de serem muitas vezes acompanhadas, nesses países, por reduções dos impostos sobre os combustíveis) contrastam com as medidas tomadas recentemente na Suécia, que – no que diz respeito aos transportes – apenas beneficia os utilizadores dos automóveis.

Um estudo sobre o passe mensal de 9€ da Alemanha nas primeiras semanas após ser introduzido revela algumas descobertas interessantes:

Mais de 30 milhões de alemães com mais de 18 anos têm o passe de 9€. Existe também um grande nível de sensibilização pública, com 97% dos inquiridos a terem conhecimento da oferta. Adicionalmente, o inquérito revelou que cerca de um quarto dos utilizadores do passe de 9€ são pessoas que não usavam, de todo, os transportes públicos, ou faziam-no apenas esporadicamente antes de junho de 2022. 66% dos utilizadores também afirmaram que o passe de 9€ é a razão para utilizarem os transportes públicos com mais frequência do que antes.

Nove em cada dez utilizadores usaram o passe durante os primeiros dias do período de validade. Cerca de dois terços das utilizações referem-se a viagens locais, próximas dos locais de residência, e 30% vão além das fronteiras locais, mas numa distância inferior a 100 km. Viagens de mais de 100 km representam menos de 10% do total.

Os utilizadores foram ainda questionados sobre qual seria o transporte que escolheriam se não existisse o passe de 9€. 47% das viagens teriam sido efetuadas em comboios ou autocarros, e 44% teriam escolhidos outros meios de transporte, metade dos quais o automóvel. Menos de 10% das viagens são tráfego induzido, i.e. viagens que não teriam lugar sem o passe de 9€. No que diz respeito à transição do automóvel para outros meios, esta é mais pronunciada em distâncias mais longas, para destinos a mais de 100 km do local de residência.

Uma análise levada a cabo pela TomTom, especialista em dados de tráfego, mostra um decréscimo do nível de congestão em 23 das 26 cidades examinadas, comparativamente ao período anterior à introdução do passe de 9€, e os dados sugerem que este declínio está relacionado com essa introdução. Em junho, as pessoas perderam menos tempo no percurso casa-trabalho do que em maio em quase todas as cidades analisadas.

Especificamente, os peritos compararam os níveis de congestão do trânsito em horas de ponta dos dias das semanas 20 e 25. Os períodos foram escolhidos para evitar os efeitos de férias e feriados. O resultado é claro: nos primeiros dias após a introdução do passe de 9€, os dados mostram praticamente um efeito nulo no tráfego automóvel, mas à medida que o tempo decorre, nota-se um efeito positivo no fluxo de tráfego em quase todas as cidades alemãs.

Não obstante a sobrelotação ocasional dos veículos, o nível de satisfação é elevado. Um em cada dois passageiros está insatisfeito com o número de lugares disponíveis em viagens de mais de 100 km. No entanto, isto acontece apenas num segmento de utilizadores que constituem menos de 10% do total de viagens efetuadas com o passe de 9€. De forma correspondente, menos de 10% dos utilizadores mostra-se insatisfeito com a última viagem que efetuou com o passe, o que contrasta com mais de 60% que disseram estar satisfeitos ou muito satisfeitos. 48% dos utilizadores afirmaram que aceitam autocarros e comboios lotados quando viajam com o passe. 55% continuariam a aderir ao passe, mesmo que este custasse mais do que 9 euros (contra 17% que disseram o contrário).

Conclusões

As indicações dadas por este estudo preliminar sugerem que o objetivo primário do passe de 9€ – alívio do custo de vida para aqueles que já usavam os transportes públicos – está a funcionar. Quando comparado com iniciativas para reduzir o imposto sobre os combustíveis, que têm o mesmo objetivo mas está orientado para os condutores de automóveis, o passe de 9€ tem um relação custo-benefício significativamente maior, uma vez que, fundamentalmente, faz uso da capacidade existente.

Promover a transição modal do automóvel para o transporte público é o objetivo máximo da mobilidade sustentável, e aquele que é mais difícil de atingir. Por isso, é bastante impressionante o facto de o estudo reportar que cerca de um quarto das viagens efetuadas com o passe de 9€ estão, efetivamente, a substituir viagens de automóvel. Muito poucas medidas conseguiram uma tão grande transição modal num espaço de tempo tão curto.

No que diz respeito à eficácia do passe de 9€, parece que houve um efeito imediato, com elevada sensibilização do público e altas taxas de utilização logo na primeira semana. Isto é positivo para o objetivo de baixar o custo de vida para os utilizadores. Mas existem já organizadores políticos que querem estender o passe para lá dos três meses previstos – para um passe anual permanente de 365€ (como em Viena), extravasando os objetivos mais restritos do custo de vida, para suportar os objetivos mais latos do movimento que advoga transportes públicos gratuitos.

O passe de 9€ está orçamentado pelo Governo federal da Alemanha em 2,5 mil milhões de euros (para os três meses) – tomando a forma de reembolsos aos estados federados como compensação pelas receitas perdidas pelas suas empresas públicas de transportes – o que é baixo comparativamente aos enormes subsídios dados à ‘sociedade do automóvel’.

Em termos de relevância para a Mobilidade como um Serviço (MaaS – Mobility as a Service), o passe de 9€ tem de funcionar a nível nacional, de forma transversal a um sem número de operadores regionais e diferentes modos de transporte. Se o esquema for alargado, faz sentido que acrescente pressão para a criação de um sistema integrado a nível nacional – o que até pode ir de encontro aos interesses das diferentes autoridades regionais de trânsito público, uma vez que lhes permitiria seguir os utilizadores nas suas redes e reclamar reembolsos do Governo federal. Passes fáceis de usar e integrados entre diferentes autoridades é uma condição essencial para a maioria dos programas MaaS. Contudo, ainda teremos de esperar para ver o quão breve será o passe de 9€ e o quais as mudanças de longo prazo que trará ao sistema de bilhetes e preços dos transportes públicos.

Stefan Carsten, consultor e especialista nas áreas do futuro das cidades e da mobilidade, vive o futuro há mais de vinte anos. É um dos responsáveis pelo início da transição da indústria automóvel de um setor centrado no veículo para um setor centrado na mobilidade. Atualmente, vive e trabalha em Berlim.

O estado de saúde dos aspirantes a Tesla no florescente mercado de EV

Foram vendidos cerca de 4,9 milhões de veículos elétricos a bateria (BEV) em 2021, ou 6% do mercado global de veículos ligeiros, partindo de 2,2 milhões ou 3% em 2020. E 2022 começou com uma tendência semelhante, que o Boston Consulting Group espera que conduzam a uma quota de 20% em 2025 e 39% em 2030. Contudo, nem todas as regiões têm o mesmo desempenho. A China liderou o pelotão em 2021, com uma penetração de BEV de 11% (2,7 milhões de unidades), seguida pela Europa com 9% (1,2 milhões) e depois os EUA com 3% (0,5 milhões) – apesar de a Califórnia se ter situado nos 12%. Apesar de as vendas na Coreia do Sul estejam a ganhar impulso, com 5,5% nos primeiros nove meses de 2021, mantêm-se surpreendentemente marginais no Japão.

Não há dúvida de que a Tesla acelerou o impulso da eletrificação que estamos atualmente a viver. Fundada em 2003, a empresa vendeu 936.000 unidades em 2021, sobretudo os modelos Y e 3. A Tesla representou 19% de todos os BEV vendidos globalmente, no último ano, baixando de 24% em 2019 e 23% em 2020. Mostra que nenhum dos Fabricantes de Equipamento Original (OEM – Original Equipment Manufacturer) tradicionais ou emergentes foram capazes de diluir massivamente a quota da Tesla neste florescente mercado, apesar do grande número de novos produtos que introduziram.

O crescimento de 126% nas vendas de BEV registados em 2021 conduziram a um aumento de 62% da frota de BEV ligeiros, para 11,2 milhões de veículos no final do ano passado – quase quatro vezes o volume atingido três anos antes. Contudo, isto representa ainda menos de um porcento da frota global.

Desde a sua fundação, a Tesla vendeu 2,4 milhões de veículos, ou 21% da frota atual (assumindo que a maior parte dos veículos ainda estão na estrada). Por comparação, os mais maduros OEM de BEV que estão a emergir na nova vaga, Xpeng e Nio, atingiram cerca de 1/10 das vendas da Tesla em 2021, i.e. cerca de 100.000 e 200.000 unidades até à data, respetivamente. O equilíbrio da frota global de BEV carrega frequentemente o símbolo de marcas chinesas estabelecidas, como a Wuling (joint-venture entre a GM e a SAIC) ou a BYD, com 55% de todos os BEV a operarem nas estradas chinesas.

No entanto, os fabricantes europeus, americanos, coreanos – e, mais recentemente, os japoneses – não estão parados. O Grupo Volkswagen, Hyundai Motor Group, Renault, Stellantis, Ford, GM, Mercedes, BYD e Geely contam-se entre os OEM mais agressivos. Estes fabricantes introduziram produtos convencionais como o VW ID.4, o Hyundai Ioniq 5, o Peugeot e-208, o Renault Mégane E-Tech, o GM Bolt ou o BYD Dolphin. Contudo, a Tesla mantém-se um líder distante, tomando até a dianteira do mercado geral na Europa, com o Modelo 3, em março de 2022 e dois outros meses em 2021.

Um grupo de aspirantes a Tesla começaram a emergir em 2015. Os mais avançados, i.e. Nio e Xpeng, lançaram os seus primeiros BEV no m mercado chinês em 2018. De forma similar, a Rivian e a Lucid começaram a entregar os seus primeiros produtos aos clientes dos EUA no início deste ano. Outros, como a Byton, apresentaram produtos mas não conseguiram fazê-los ver a luz do dia. Depois de alguns anos, é tempo agora de reavaliar como estão hoje estas empresas.

China: fabricantes estrangeiros perdem terreno para os OEM locais; start-ups ganham força

Os fabricantes estrangeiros estão a perder terreno à medida que o mercado muda rapidamente para BEVs com interiores e características ‘smart’. A sua penetração no mercado dos VE plug-in é significativamente mais baixa do que no histórico mercado dos veículos com motores de combustão interna, atingindo agora apenas 20%. Isto é ainda mais crítico à medida que o mercado dos VE continua a crescer rapidamente, mais do que duplicando nos quatro primeiros meses de 2022, ao passo que em 2021 o mercado total decresceu. O Grupo Volkswagen e a GM são quem mais está a perder nesta transição.

Os OEM chineses – em especial, os emergentes – demonstram uma capacidade superior para digitalizar os seus sistemas de controlo do habitáculo e infotainement replicando o modelo dos smartphones em muitos aspetos. Estas são vertentes aos quais os consumidores chineses são altamente sensíveis, em prejuízo da lealdade à marca. A Tesla é o único OEM estrangeiro com uma quota de mercado significativa. Nos primeiros quatro meses de 2022, a empresa norte-americana liderou este mercado com uma margem significativa, à frente da SAIC e da BYD.

A Xpeng e a Nio são as empresas de Veículos de Nova Energia com mais sucesso a emergir na China. Introduziram os primeiros produtos em 2018 e atingiram vendas de 98.000 e 91.000 unidades, respetivamente, em 2021, com base em três ou quatro modelos. As duas empresas abriram o seu capital e estão atualmente avaliadas em cerca de 25 a 30 mil milhões de dólares depois de terem atingido três vezes mais no pico das suas avaliações. Os rendimentos financeiros destas aberturas de capital permitiram-lhes ser ambiciosas nos seus produtos e desenvolvimentos comerciais.

No ano passado, as duas empresas começaram a vender os seus produtos a Europa, inicialmente na altamente eletrificada Noruega. Estão também a investir em tecnologia. Nos próximos meses, a Xpeng vai introduzir um novo SUV de sete lugares com uma arquitetura de 800 V. A Nio optou por um modelo de troca de baterias e instalou até agora mais de 900 estações de troca – incluindo na Noruega.

Estes dois líderes não estão sozinhos na sua tentativa de se tornarem intervenientes nos BEV. Dezenas de empresas tentaram. Entre aquelas que estão num segundo patamar contam-se a WM Motor e a Leapmotor, que venderam cada uma cerca de 40.000 BEV no último ano. A Always, um pequeno fabricante com dois BEV, começaram até a distribuí-los na Europa em 2021.

Europa: poucas start-ups emulam a Tesla

O Grupo Volkswagen está numa posição de liderança nas vendas de BEV (25% de quota de mercado), seguido pela Stellantis. A Tesla está na terceira posição, enquanto continua a ser a marca de BEV mais vendida, com o BEV mais vendido. A Europa não tem uma variedade de OEM emergentes para desafiarem os fabricantes tradicionais, como acontece na China ou nos Estados Unidos. Contudo, destacam-se algumas empresas, nomeadamente a Arrival, a Sono Motors e a Lightyear.

A Arrival, sediada no Reino Unido, está primeiramente focada numa carrinha comercial ligeira, com 10.000 unidades encomendadas pela UPS. Mas está também a desenvolver um robotáxi em parceria com a Uber, que pretende introduzir em finais de 2023. Agora uma empresa de capital aberto, a Arrival está razoavelmente bem financiada (cerca de mil milhões de dólares) e anunciou a construção de instalações ágeis de produção no Reino Unido e América do Norte.

Sediadas respetivamente na Alemanha e Países Baixos, a Sono Motors e a Lightyear angariaram menos dinheiro do que a Arrival (cerca de 270 milhões de dólares para a Sono e 100 milhões para a Lightyear) mas estão a avançar com os seus próprios veículos. Os seus futuros BEV têm em comum uma cobertura de painéis solares que ocupa uma porção significativa das carroçarias. Contudo, posicionam-se com preços muitos distintos – 28.500 dólares para a minivan compacta da Sono contra os 150.000 dólares do grande sedan da Lightyear. O início da produção está agendado para 2022 para a Lightyear e 2023 para a Sono, os dois modelos na fábrica da Valmet, na Finlândia. As duas empresas necessitarão provavelmente de mais financiamento para ganharem escala.

Curiosamente, existem ainda start-ups em fase inicial que projetam introduzir veículos alimentados por pilha de combustível. Por exemplo, a Hopium, sediada em França, está a desenvolver um grande sedan com autonomia de 1.000 km. Contudo, ganhar força ao longo de todo o ecossistema – especialmente a rede de carregamento – vai ser um desafio para os veículos pessoais.

EUA: Testa lidera confortavelmente; start-ups lutam para ganhar escala

Os Estados Unidos têm sido mais lentos do que a China na adoção de BEV, como anteriormente referido, mas o ritmo está a aumentar, em parte devido à introdução de novos produtos e ao interesse crescente dos consumidores. Contudo, a Tesla controlava ainda 70% do mercado no primeiro trimestre de 2022 – só o Model Y representa um terço de todos os BEV. Na Califórnia, a quota da empresa no mercado dos ligeiros de passageiros excedeu 10% nos últimos dois trimestres.

Além da Tesla, os EUA provaram ser um terreno fértil para as start-ups de BEV. As empresas mais maduras e bem financiadas são a Rivian, a Lucid e a Fisker. As três empresas abriram o capital nos últimos dois anos e as duas primeiras estão agora avaliadas em cerca de 30 mil milhões de dólares, e a última em 3 mil milhões – todas significativamente longe dos máximos – depois de angariarem cerca de 10 mil milhões, 6 mil milhões e mil milhões, respetivamente.

É de notar que estas empresas não partilham o mesmo modelo operacional. A Fisker subcontratou a maior parte do trabalho de engenharia e vai apoiar-se em contratos com fabricantes (Magna Steyer e depois a FoxxConn), enquanto as outras duas estão a desenvolver estas atividades dentro de portas.

A Rivian e a Lucid introduziram os seus primeiros modelos no mercado dos Estados Unidos no início deste ano, respetivamente uma pick-up robusta e altamente capaz e um sedan de luxo e elevado desempenho. Os veículos têm preços a partir de 67.000 e 87.000 dólares, respetivamente. O primeiro produto da Fisker, um SUV compacto, posiciona-se no coração do mercado com um preço de 37.500 dólares, com as entregas a terem início no final deste ano.

Estes produtos foram bem recebidos. No entanto, a intensificação da produção tem sido um desafio para a Rivian e Lucid. A primeira planeia agora produzir 25.000 veículos em 2022, e a última entre 12.000 e 14.000 unidades. Isto resulta de uma curva de aprendizagem difícil – veja-se o “inferno de produção” da Tesla – combinada com uma escassez de componentes transversal a toda a indústria. Contudo, suspeito que a Fisker terá maior facilidade em intensificar a produção, já que a Magna Steyer é um fabricante de veículos experiente.

O futuro destas empresas depende da sua capacidade para, primeiro, ganhar escala a nível de produção, e depois ganhar força no mercado. Com este propósito, a Rivian está a lançar paralelamente uma carrinha de entregas (a Amazon encomendou 100.000 unidades) e um SUV na mesma plataforma, a Lucid vai introduzir um SUV em 2024 e a Fisker está a preparar um SUV compacto mais barato para 2025.

Outras start-ups de BEV tiveram menos sucesso. A Faraday Future, a Byton, a Bollinger, a Lordstown e a Canoo estão a sofrer, na melhor das hipóteses, ou então estão a fechar, a mudar de foco ou a hesitar enquanto tentam ainda chegar ao mercado. Vão ocorrer consolidações e encerramentos nesta ‘liga’.

Por último, não devemos ignorar a Apple, que tem estado há vários anos a ‘brincar’ com a ideia de desenvolver e lançar o seu próprio BEV.  No entanto, têm sido muito escassas as fugas de informação sobre estes planos, que parecem ter evoluído significativamente ao longo do tempo.

Outras empresas de BEV estão a emergir em outras regiões 

A Sony decidiu aumentar a parada depois de apresentar o Vision-S, o seu primeiro concept car, na CES 2020. Em março último, assinaram um acordo com a Honda para “aprofundar a discussão e exploração da formação de uma aliança estratégica com vista à criação de uma nova era da mobilidade de serviços de mobilidade”. Parece claro que a questão já não é ‘se’, mas antes ‘como’, uma vez que as duas empresas planeiam começar a vender o seu primeiro BEV em 2025.

Estão a emergir outras empresas fora do triângulo Europa-China-EUA com planos ambiciosos para entrar no mercado dos BEV. Criada em 2017 como parte do vietnamita Vingroup, a VinFast apresentou cinco BEVs distintos na CES 2022 e, mais tarde, anunciou planos para estabelecer uma base de produção nos Estados Unidos. A VinFast vai introduzir o VF8 e o VF9 (SUV de cinco e sete lugares) na Europa e EUA no final de 2022 ou início de 2023. E existem mais players nos BEV, como a TOGG, sediada na Turquia. Este número crescente de empresas não é sustentável. A consolidação e o desgaste são inevitáveis, mas que empresas vão ser as vencedoras? 

Marc Amblard é mestre em Engenharia pela Arts et Métiers ParisTech e possui um MBA pela Universidade do Michigan. Radicado atualmente em Silicon Valley, é diretor-executivo da Orsay Consulting, prestando serviços de consultoria a clientes empresariais e a start-ups sobre assuntos relacionados com a transformação do espaço de mobilidade, eletrificação autónoma, veículos partilhados e conectados.

Os combustíveis fósseis fazem parte do passado. Bem vinda, e-Mobilidade

A sociedade e a política venceram. Aquilo que as bem estabelecidas empresas da indústria automóvel mais temiam tornou-se realidade: os motores a gasolina e diesel serão em breve algo do passado, bem como os sistemas híbridos. O futuro pertence às baterias – e, portanto, a uma mobilidade que é finalmente (mais) limpa e (mais) saudável. O Parlamento Europeu tomou agora a decisão final sobre o quão sustentável será esta transição da mobilidade; a proibição da gasolina e do diesel em 2035 está agora em vigor.

Os pioneiros desta transformação são os países escandinavos, mas Portugal e Reino Unido estão também a posicionar-se na vanguarda da eletrificação. Fabricantes de automóveis progressistas, como a General Motors, a Volvo e a Jaguar, mas também fornecedores de serviços como a Uber, continuam a liderar a tendência. E à medida que mais empresas definem limites temporais para o motor de combustão, mais claro se torna que o futuro da mobilidade será neutro, do ponto de vista climático. A indústria automóvel tem agora de garantir que cada automóvel elétrico cumpre todos os requisitos ambientais e que não traga mais pressão vinda de Bruxelas, Pequim ou Washington. Não deixa de ser de todo surpreendente que esta pressão seja necessária – afinal, os automóveis elétricos (BEV) são superiores aos carros com motores de combustão interna em todas as dimensões imagináveis.

Em todo o caso, a tendência geral é clara: a eletrificação dos grupos propulsores, que foi discutida durante tantos anos, está subitamente a ocorrer a uma velocidade alucinante. Este salto  em direção à e-mobilidade é acompanhado por uma ofensiva de modelos, por parte dos fabricantes – a indústria anunciou 600 novos automóveis elétricos até 2024. Os fabricantes chineses lideram, com 169 modelos, seguidos pelo Japão (145) e Alemanha (102). Ao mesmo tempo, a ‘E-Volução’ não inclui apenas os automóveis de passageiros – apesar de este ser, de longe, o segmento mais dinâmico. Em 2021, por exemplo, a par dos 7 milhões de carros elétricos, havia já no mundo mais de 500.000 autocarros e cerca de 400.000 carrinhas e camiões de entregas, além de 184 milhões de motas e scooters.

Quer se trate de fabricantes de automóveis, cidades ou governos, mais e mais atores compreendem a simbiose entre sustentabilidade e inovação como um fator central para o futuro. É por isso que Eric Garcetti, mayor de Los Angeles, quer também continuar a lutar por um céu azul e luminoso, que é para ele o oposto emblemático da devastadora cultura do automóvel. Trata-se, na essência, de uma agenda ecológica voltada para o futuro, que não tem um objetivo de renúncia, mas que antes procura abrir novas perspetivas ecológicas de crescimento.

Muitas cidades reconhecem que é agora tempo de criar novas realidades que antecipem o futuro. A capital francesa, Paris, decidiu proibir completamente os veículos a diesel a partir de 2024, seguindo-se os carros a gasolina em 2030, muito antes da União Europeia. Em Amesterdão, todos os veículos a gasolina e diesel (carros, motas, scooters) serão excluídos a partir de 2030, com base no denominado Plano de Ação Ar Puro. Táxis, autocarros, carrinhas e scooters com motores de combustão serão proibidos na autoestrada A10, o anel rodoviário em torno da cidade, já em 2025, seguindo-se os automóveis e motas privados em 2030. Em Los Angeles, 25% dos carros serão elétricos em 2025; e a partir de 2050, apenas a mobilidade elétrica será permitida. Os táxis e os autocarros escolares serão totalmente livres de emissões em 2028, e a partir de 2035, isto aplicar-se-á também a todo o tráfego urbano de entregas.

Dezenas de fabricantes automóveis viram-se numa posição de desvantagem no recém-formado mercado elétrico. Muitas empresas novas estão a destacar-se, sustentadas por investimentos massivos, e os fabricantes chineses, em particular, vêm o seu valor explodir. Li Auto, Xpeng e Nio, por exemplo, têm atualmente cotações muito mais elevadas do que a BMW. Se olharmos para aspetos como dimensão e vendas, estas cotações parecem largamente inapropriadas: a Nio entregou 91.000 elétricos a bateria em 2021 (comparando com 43.000 em 2020); e a Xpeng entregou 98.000 (comparando com 27.000). Por outro lado, as taxas de crescimento aumentaram significativamente, especialmente no últimos meses.

O ceticismo transforma-se em alegria

Apesar de 21% dos compradores de carros novos na Alemanha considerarem já que os automóveis elétricos são o “veículo perfeito para o dia-a-dia”, muitos mostram-se ainda céticos quanto aos benefícios da nova tecnologia. 46% duvidam mesmo que os elétricos substituam totalmente os carros a combustão, no futuro. Contudo, estas dúvidas evaporam-se rapidamente assim que ganham experiência prática com os automóveis elétricos. De acordo com um estudo britânico, 91% dos proprietários de BEV não pretendem retornar aos veículos a gasolina e diesel.

Existem essencialmente seis fatores que garantem que os carros elétricos se vão popularizar muito rapidamente:

  • Redução de custos: atualmente, os custos são ainda uma das maiores barreiras à compra de um carro elétrico, mas este argumento está depressa a tornar-se obsoleto. Nos próximos cinco anos, os veículos elétricos serão a opção de compra mais económica em muitas partes do mundo.
  • Respeito ambiental: a reivindicação de que os automóveis elétricos não são amigos do ambiente, em termos de produção e utilização, foi já refutada por vários estudos. De facto, os veículos a bateria são já menos prejudiciais para o ambiente do que os motores de combustão interna. Esta vantagem será cada vez maior no futuro, graças a novas técnicas de exploração de matérias-primas, medidas de reciclagem e inovações técnicas no campo da tecnologia de baterias.
  • Poupança de energia: especialmente em tempos de transição energética, os efeitos a nível de poupança de energia têm de ser calculados com precisão, de forma a minimizar o impacto na produção de energias renováveis. O carro elétrico consome três vezes menos energia do que um carro alimentado por pilha de combustível de hidrogénio, e mais de seis vezes menos do que um automóvel movido por combustível sintético (e-fuel).
  • Características de condução: a aceleração de um carro elétrico é muito mais forte e a velocidade máxima é comparável à dos veículos de combustão.
  • Menos desgaste e manutenção: por causa da muito menor complexidade do grupo propulsor, são expectáveis menos reparações e custos de utilização substancialmente menores.
  • Autonomias maiores: a iminente tecnologia de baterias de estado sólido trará um crescimento significativo às autonomias e, ao mesmo tempo, as redes de carregamento públicas e privadas continuarão a expandir-se. O mesmo se aplica ao carregamento por indução.

A bateria é, de longe, o componente mais dispendioso de um veículo elétrico, representando cerca de 30% do custo total. Mas o preço das baterias está rapidamente a aproximar-se de um ponto de viragem: em breve, os fabricantes de veículos elétricos estarão a produzir modelos tão acessíveis e lucrativos quanto os veículos de combustão interna comparáveis. Em 2021, o preço médio por kilowatt-hora de uma bateria de ião-lítio desceu para 132 dólares – há uma década, custava mais de 1.100 dólares. Assim que o custo cair abaixo dos 100 dólares, os veículos elétricos serão economicamente mais eficientes do que os veículos a gasolina.

De acordo com as previsões, o limiar ‘mágico’ será alcançado algures em 2023 (se as crises da inflação e das cadeias de fornecimento não afetarem significativamente os preços). Assim, os baixos preços das baterias são uma chave importante para oferecer, em grande volume, carros elétricos baratos.

As baterias da Tesla custam atualmente entre 10.000 e 12.000 dólares, dependendo da capacidade; no futuro, a empresa quer reduzir este custo para menos de 6.000 dólares, de forma a disponibilizar um automóvel elétrico com um preço de cerca de 25.000 dólares. O plano, que assenta num preço por kilowatt-hora de 58 dólares – considerado realista, a longo prazo, pelos especialistas da indústria –, é bastante ambicioso e requer ainda algumas inovações técnicas, como baterias de estado sólido e poupanças em matérias-primas. No entanto, estas progressões de preços estão já incluídos nos novos conceitos de veículos e os passos de desenvolvimento técnico estão já a ser implementados.

No futuro, o posicionamento dos modelos elétricos diferenciar-se-á radicalmente, em termos de preços, sendo possíveis segmentos completamente diferentes. Não devemos ficar surpreendidos se o preço unitário de muitos carros elétricos cair eventualmente abaixo dos 5.000 dólares. As reduções de preços durariam então, pelo menos, até ao início da próxima década. Isto vai ser possível através da otimização dos processos de produção e volumes mais altos, mas também por designs de veículos mais aperfeiçoados: enquanto os automóveis elétricos atuais integram cerca de 10.000 peças, no futuro poderão ter 100 ou menos.

Na China, o desenvolvimento está já a abrir categorias completamente diferentes, em que os denominados Micro Carros Elétricos são populares. Com preços entre 600 e 2.500 dólares, por enquanto pouco regulamentados, são lentos – e, por isso, muitas vezes chamados de “carros para cidadãos seniores” – apelam a um enorme mercado que consiste sobretudo em trabalhadores de poucos rendimentos. Há muitas destas pessoas na China: mais de 40% da população – cerca de 600 milhões de pessoas – ganha menos de 150 dólares por mês. Estes desenvolvimentos também afetarão outros países onde o potencial económico de uma gigantesca classe média está apenas a começar a revelar-se.

Reflexões breves sobre um futuro condicionado pela Mobilidade

Vou tentar falar do futuro da mobilidade e não só da ‘verde’ ou elétrica. Não sou futurologista (nem quero ser!); logo, a probabilidade de estar errado é grande – principalmente num mundo demasiadamente incerto, imprevisível e até incompreensível.

Tenho algumas certezas, mas também muitas dúvidas sobre como será o amanhã nesta área. E ter dúvidas é ser inteligente: não deixo é que limitem as minhas ações ou o pensar pela minha própria cabeça. E quando o editor da Revista assim o permite, ainda melhor se torna o ‘pensar’.

Procuro sempre alicerçar o que digo em factos, estudos e amostras de opinião de outros, que tentam representar um todo ou um padrão. Mas, nos dias de hoje, o que é a verdade? Talvez tenha apenas uma pequena percentagem da verdade… e emitir juízos de valor ou opiniões sobre parte da verdade vai, de certeza, levar a erros de julgamento. Uma das frases que nunca esqueço, quando apresento novos projetos ou modelos de abordagem ao mercado, é esta: “pede sempre um conselho e evita opiniões”, pois num conselho, à partida, terás um aliado e não um destruidor de ideias com a sua opinião.

O mundo e a mobilidade podem mudar bem mais com o nosso exemplo e comportamento do que com a nossa opinião!

O futuro pode ser definido por uma mobilidade permanente. Veja-se a atual migração em massa de ucranianos pelas piores razões (entre muitos outros casos ignorados por um mundo hipócrita). E como será em algumas regiões de África na presente crise de cereais (consequência da guerra)? Para onde se dará essa deslocação em massa na busca de melhores condições de vida e de oportunidades? Principalmente para a Europa, neste caso, ou para países ditos “desenvolvidos”. Na minha opinião, este novo fluxo será bem maior do que o que assistimos nos últimos anos, que só por si já era um problema. Embora reconheça a migração de povos como um benefício social e até económico (diversidade), depende é da intensidade dos fluxos.

Se me permitem, vou deixar este tema para outro artigo, pois joga diretamente com a geoeconomia e a geopolítica mundial. Que até pode parecer distante e sem sentido no futuro das grandes cidades, embora não o seja. Estamos apenas a não ver, pois o mundo também está não-linear. Há movimentos grandes e com impacto que não são medidos e sentidos hoje, assim como movimentos pequenos e com impacto que podem alterar tudo no amanhã. E é neste preciso momento que recordo que a ignorância (ou ignorar) pode trazer felicidade!

Já se deu conta que tudo na nossa vida e desenvolvimento está associado ao fator confiança e à bioeconomia da decisão. Fazemos algo para ganhar alguma coisa ou para, no limite, não perder o que temos; em que o benefício de uma decisão deve ser superior ao custo (é assim que decidimos, biologicamente falando). Este é o nosso mais poderoso algoritmo no processo de decisão. E quando a incerteza aumenta, a confiança diminui. Ela é contagiante, mas a falta dela também o é um dos muitos paradoxos da confiança.

A forma como viajamos de um ponto A para um ponto B está a mudar a um ritmo bem mais rápido do que em qualquer outro momento da história. Existem dois impulsionadores principais: a necessidade de adaptação às mudanças no comportamento humano e a necessidade de maior sustentabilidade.

Esses fatores sustentam as mudanças contínuas em direção à eletrificação automóvel, automação, conectividade e toda a mobilidade como um serviço. A questão é como conseguir tudo isto tendo em atenção o pilar de um mundo mais ‘green’? Será possível viajar mais, aumentar a mobilidade de cada um de nós e diminuir a tão famosa “pegada carbónica”? Não sei – embora aqui na Revista exista muito conteúdo que nos ajuda a pensar sobre o assunto.

Um dos maiores drivers nesta transformação pode ser, entre outros, a inteligência artificial (IA) – a nossa capacidade de criar máquinas que podem aprender por si mesmas e tomar decisões que antes só podiam ser feitas por humanos (junto também a proliferação, nos próximos anos, da tecnologia autónoma). Adicionalmente, faz sentido pensar nas novas formas de energia e propulsão já disponíveis, assim como em serviços (softwares e aplicações) que estão a revolucionar o mundo dos transportes.

Já pensou no conceito de táxis autónomos, o Hyperloop e os Glydways?

Hoje, um táxi autónomo, algo só visto em filmes futuristas, já é um assunto sério para grandes players do mercado. Há empresas, como a Google (https://waymo.com/), a trabalhar para trazer este tipo de transporte ao mercado, muito brevemente. A isto, junto a Uber, a Boeing e a Hyundai – bem como uma série de start-ups – a irem bem  mais além e já avançados em projetos de táxis voadores movidos a hidrogénio.Julgo que o mundo está apenas à espera de que os governos e os reguladores criem leis e certificações para que isso aconteça. Muita da tecnologia já existe; pode é não ser ainda economicamente viável para a escalar e introduzir em massa.

A título de exemplo, Elon Musk agarrou num conceito antigo do Vactrain (1910) – um comboio impulsionado através de um túnel de vácuo pela pressão do ar – e desenvolveu-o num hyperloop, com testes programados para começar este ano de 2022. Os comboios são suspensos em túneis, semelhantes a tubos, por meio de magnetos para eliminar o atrito e, potencialmente, criar zero emissões. Uma demonstração em pequena escala de 500 metros foi realizada pela Virgin Hyperloop em 2020.

Os Glydways podem ser mais um conceito inovador que, em potencial, será o próximo divisor de águas em mobilidade e transporte. Basicamente, envolve viagens autónomas em veículos pessoais ao longo de uma rede dedicada de trajetos (quase ponto a ponto e não com sistema de estações). O objetivo é reduzir drasticamente o custo de implementação de sistemas de transporte público, com todos os benefícios económicos e sociais associados. Note-se que, no mundo, menos de 200 das 4.500 cidades mais densamente povoadas têm sistemas de transporte de massas devido à viabilidade económica e financiamento. Os carros Glydways, segundo o seu fundador, são capazes de transportar até quatro passageiros e viajam de forma totalmente autónoma ao longo de faixas de tráfego dedicadas, que podem ficar ao longo das estradas já existentes – ocupando, aproximadamente, o mesmo espaço de uma ciclovia.

Junte-se a isto – e a muito mais que nem conheço – a Maas (Mobility as a Service), que já tive a oportunidade de detalhar há cerca de um ano aqui na Revista. O futuro do transporte e da mobilidade é hoje. E nunca este setor esteve tão dinâmico e em profunda transformação. Enjoy the ride and have fun!

À conversa com Kerstin Kube-Erkens, diretora do BUS2BUS

Stefan Carsten

O nosso colunista Stefan Carsten esteve na terceira edição do BU2BUS, o maior encontro europeu do setor do transporte rodoviário de passageiros, que decorreu em Berlim, no final de abril. O evento juntou cerca de 2.000 visitantes de 25 países, e 100 empresas expositoras vindas de 16 países que apresentaram novos produtos, serviços e soluções técnicas. As maiores empresas do setor marcaram presença com uma gama de produtos mais alargada, sobretudo mais veículos. A participação de representantes políticos, nomeadamente o Ministro dos Transportes alemão, Volker Wissing, líderes corporativos e académicos sublinhou a importância do autocarro no contexto da transição da mobilidade.

Stefan Carsten esteve à conversa com Kerstin Kube-Erkens, diretora do BUS2BUS, que partilhou as suas ideias sobre o presente e o futuro do setor.

Stefan Carsten: Que papel pode o autocarro desempenhar na redução da propriedade automóvel e das viagens automóveis?

Kerstin Kube-Erkens: Um dos nossos principais objetivos no BUS2BUS passa por providenciar uma plataforma de discussão. O foco está em desencadear uma discussão sobre a forma como as inovações digitais, o design e a estética podem contribuir para tornar os autocarros mais atrativos e mais percetíveis na vida pública. Categorizámos estas discussões, bem como as contribuições de expositores e start-ups neste tópico, sob o título ‘Fresh Travel’. Com o nosso segmento ‘Fresh Travel’, queremos aumentar a visibilidade pública do autocarro, que já está a desempenhar um papel no redesenhar das cidades. Graças à sua flexibilidade, são capazes de determinar conceitos de mobilidade particulares: quer se trate do transporte regular em grandes centros urbanos ou pequenos fretes específicos, os autocarros são capazes de cumprir todos os requisitos. E são capazes de o fazer imediatamente e de forma crescente. Combinado com equipamentos modernos, amigos do utilizador, e designs cool, o autocarro é, na cidade, uma muito melhor alternativa ao automóvel, mas também em longas distâncias. O segmento dos jovens, em particular, está muito aberto a este tipo de conceito.

No BUS2BUS, foram atribuídos prémios a duas start-ups: o prémio geral para start-ups e o prémio ‘Fresh Travel’. Este último foi ganho por uma empresa suíça, a Twiliner, com uma abordagem a um novo conceito de autocarro de longa distância para viagens noturnas sustentáveis. Uma vez que as viagens aéreas são responsáveis por 27% da pegada de CO2 da população suíça, a neutralidade no setor dos transportes está a décadas de distância. Os comboios noturnos são uma alternativa, mas são caros e disponíveis apenas em algumas rotas. Assim, viagens noturnas de autocarro podem ser uma forma sustentável de viajar, mas os autocarros atuais são desconfortáveis. Foi assim que a história começou: a Twiliner quer tornar as viagens noturnas de autocarro confortáveis e atrativas, desenhando um novo conceito de assento para servir a função tradicional e também para dormir e trabalhar. Acabaram de publicar a primeira estimativa de preços: as viagens vão ser muito mais confortáveis no futuro.

SC: Para muitos de nós, o autocarro tem uma imagem muito negativa. O objetivo do BUS2BUS é evidenciar novos conceitos e abordagens para viajar no futuro. Como é que a indústria tem superado estas perceções negativas ligadas ao autocarro?

KKE: Muito aconteceu e muito vai continuar a acontecer. O autocarro é e pode ser uma alternativa real ao avião. Demografias ambientalmente conscientes, em particular, estão abertas a conceitos de viagem inovadores. Os clientes são exigentes e com necessidades muito diversas. Estes requisitos têm de ter respostas criativas, e estas ideias já existem no segmento do transporte rodoviário de passageiros. O desafio é trazer esta qualidade para o transporte público.

SC: Os autocarros de transporte de longo curso, intercidades, vão apostar no hidrogénio ou na baterias?

KKE: Neste momento, os dois conceitos estão a ser utilizados no contexto do transporte urbano. O BUS2BUS apresentou tanto autocarros citadinos a hidrogénio como e-buses. No segmento do transporte de longo curso, podemos ver já as primeiras abordagens à utilização de autocarros eletrificados – por exemplo, da Solaris e da Ebusco. Mesmo o transporte de passageiros deverá ser eletrificado, no futuro, como mostram os projetos atuais levados a cabo nos Estados Unidos, onde um autocarro Van Hool 100% elétrico cobriu mais de 4.000 km, entre a Florida e a Califórnia.

Em termos de valores de vendas, os autocarros elétricos a bateria estão claramente à frente do hidrogénio no segmento urbano. Foram vendidas 3.282 unidades na Europa Ocidental e Polónia em 2021, comparando com apenas 158 autocarros a pilha de combustível.

Nos autocarros elétricos, a tendência é o carregamento em terminal, suplementado, por exemplo, no segmento intercidades por carregamentos breves durante o dia. Isto também facilita o desenvolvimento de uma infraestrutura correspondente, que pode ser concentrada primariamente nos terminais.

SC: Como é que os operadores de autocarros estão a trabalhar com os operadores de mobilidade para integrar a ‘primeira’ e a ‘última milha’?

KKE: Observo parcerias entre operadores de transporte público e operadores de mobilidade nas principais cidades da Alemanha e da Europa. Os conceitos vão desde on-demand, mobilidade partilhada, shuttles autónomos e micro-mobilidade. Neste momento, muitos dos serviços estão ainda concentrados nos centros das cidades. Acredito que o momento de viragem será quando as áreas às quais é realmente difícil chegar possam ser integradas nestes conceitos e operadas de forma economicamente rentável. Nas regiões rurais, em particular, existe ainda uma ausência de conceitos abrangentes e atrativos.

SC: Que incentivos são necessários para ligar as áreas rurais aos centros urbanos, uma vez que não têm frequentemente as mesmas oportunidades, quando se trata de acesso a autocarros?

KKE: Os desafios neste particular são muito grandes. Conceitos gerais vão ser ainda mais urgentes no futuro do que antes, e isto começa no desenvolvimento de sistemas on-demand apropriados, shuttles para terminais rodoviários maiores, e continua com a coordenação sincronizada de serviços rodoviários e ferroviários, até terminar nas reservas online e apps de horários. Em concordância, estes shuttles devem ser pequenos autocarros eletrificados, e as viagens entre centros urbanos efetuadas em grandes autocarros eletrificados.

SC: Muitos dos nossos meios de transporte casa-trabalho que implicam partilha de espaços sofreram uma redução de utilizadores, durante a pandemia, incluindo os autocarros. Agora que a pandemia parece próxima do final, como é o futuro para os autocarros?

KKE: Os autocarros vão recuperar do declínio de passageiros apenas de forma gradual. A incerteza relativa ao número de utilizadores ainda está a fazer-se sentir, uma vez que a pandemia ainda não terminou. Mas serão capazes de ganhar alguma quota nos próximos anos, especialmente se os preços dos combustíveis continuarem próximos dos níveis atuais. A tendência aponta claramente rumo à utilização crescente do transporte multimodal, no qual o autocarro desempenha um papel importante. Filtros e superfícies antivirais, bem como sistemas de proteção para condutores, deverão aumentar significativamente a confiança dos passageiros e colaboradores na sua segurança, no futuro.

Os Veículos Autónomos são uma realidade próxima?

Opinião de Marc Amblard

Durante décadas, as pessoas sonharam poder largar o volante quando as condições de condução se tornam aborrecidas, ou seja, na autoestrada ou em situações de tráfego intenso. Nos últimos anos, foram investidos recursos significativos para tornar este sonho realidade, e isto é verdade no que diz particularmente respeito aos últimos dois anos, à medida que o setor aumentou o número de trabalhadores e experimentou uma consolidação e integração vertical suportada pela captação de investimentos massivos.

As empresas que desenvolvem tecnologia de Condução Autónoma de Nível 4 (L4 AD) continuam a aumentar o número de projetos-piloto, com ou sem supervisores de segurança humanos a bordo. As mais maduras lançaram ou anunciaram atividades comerciais, abordando essencialmente robotáxis, transporte rodoviário de mercadorias e logística last e middle mile. Outras empresas focaram-se em áreas menos sexy mas altamente relevantes, como indústria extrativa, agricultura, ou operações em estaleiros. Algumas centenas de veículos fornecem atualmente serviços comerciais nestes segmentos sem um operador de segurança a bordo, e mais ainda o fazem com operador.

Em que ponto estamos hoje? Como e quando podemos esperar o aumento da escala destas atividades?

Uma retrospetiva

À cerca de cinco anos, a Waymo, a Cruise e a Zoox planeavam o lançamento de serviços comerciais de robotáxi antes do final da última década. O que aconteceu na realidade? Apenas a Waymo o conseguiu, começando nos arredores da cidade de Phoenix no final de 2018, retirando os operadores de segurança um ano mais tarde, ao mesmo tempo que limitava o domínio operacional (ODD – Operative Design Domain) a uma área de cerca de 120 km2. Na China, a Pony.ai lançou um serviço de robotáxi com operador em dezembro de 2018, e a AutoX implementou uma frota sem condutores em Shenzhen em janeiro de 2021.

No final de 2021, a start-up de logística middle mile Gatik começou a movimentar cargas para o gigante retalhista Walmart sem operador de segurança atrás do volante – apesar de este viajar no banco do passageiro para agir em caso de emergência. A Einride tem vindo a operar vários projetos-piloto a nível local na Europa durante um par de anos. E a Nuro começou a fornecer serviços de entregas last mile para várias marcas em 2020. Olhando ainda mais para trás, não podemos ignorar aqueles pouco glamorosos – mas altamente relevantes – camiões gigantescos que têm operado autonomamente durante mais de dez anos em minas a céu aberto.

Até cerca de 2020, a maioria dos esforços para fazer chegar a L4 AD ao mercado focaram-se em movimentar pessoas. No entanto, as principais empresas alteraram as suas prioridades, colocando os camiões autónomos à frente dos robotáxis ou acelerando relativamente os programas ligados aos primeiros – este é o caso particular da Waymo e da Aurora. A complexidade da Condução Autónoma urbana, maior do que o esperado, combinada com a escassez de condutores de veículos pesados de mercadorias, retornos de investimento mais óbvios e maiores ganhos de eficiência potenciais, conduziram a esta escolha.

Também não devemos esquecer as poucas centenas de shuttles autónomos – por exemplo, da Navya e da Easymile – que têm vindo a operar comercialmente em todo o mundo deste 2016, maioritariamente com operadores de segurança a bordo. Contudo, estes veículos navegam através de pontos programados do percurso, e não desde um qualquer ponto A até um qualquer ponto B.

Advertising Archive/Everett Collection

Onde estamos hoje

Além das implementações acima referidas, atividades comerciais foram lançadas este ano pela Cruise (em zonas de São Francisco, sem operadores de segurança) e pela Waymo (também em zonas de São Francisco, com operador). No entanto, as condições operacionais continuam a ser bastante restritas. A licença atribuída à Cruise permite que uma frota de 200 veículos forneça serviços de ride-hailing gratuitos entre as 22h00 e as 6h00, até 50 km/h e em condições meteorológicas favoráveis. Uma segunda licença permitir-lhe-á cobrar pelo serviço. A Waymo começou a oferecer viagens sem operador aos seus colaboradores, enquanto aguarda por uma licença mais abrangente. Estes são apenas os exemplos mais maduros.

Na China, a Pony.ai e a Baidu viram ser-lhes recentemente atribuídas licenças para operar atividades de ride-hailing pagas em Pequim (ODD de 60 km2) sem operadores de segurança a bordo. A Pony recebeu uma licença similar na cidade de Guangzou, com uma maior ODD.

No que respeita ao transporte pesado de mercadorias, várias empresas que desenvolvem tecnologia de Condução Autónoma têm estado a operar projetos-piloto. Nos Estados Unidos, este é o caso de, por exemplo, Waymo, Aurora e TuSimple, todas a operar em estados do sul dos Estados Unidos (Texas, Arizona), onde o clima é mais favorável e a regulação menos restrita. Na China, algumas empresas estão a progredir num caminho semelhante – por exemplo, a Plus e a Pony.ai –, enquanto que a Locomation continua com a sua solução de platooning [agrupamento de veículos em ‘comboio’], na qual o condutor do camião seguinte tem oportunidade de descansar.

Relativamente à questão da regulação, as várias regiões do mundo estão a progredir a diferentes velocidades. A Europa parece estar mais avançada, pelo menos a nível nacional. Alemanha, França e Reino Unido lideram o pelotão em matérias ligadas à testagem e validação, bem como a cobertura de responsabilidades.

Nos Estados Unidos, os operadores vêem-se confrontados com um quebra-cabeças regulatório – ou mesmo com a ausência de regulação. O governo federal mostra-se maioritariamente alheado, o que dificulta eventuais implementações transestaduais futuras. No entanto, a National Highway Traffic Safety Administration, organismo regulatório ligado à segurança rodoviária, divulgou recentemente as regras finais relativas à ausência de controlos manuais em veículos altamente automatizados, abrindo a porta aos veículos desenvolvidos com estas especificações.

O que esperar nos próximos anos

Tem havido muitas promessas não cumpridas, no passado, quando se trata do lançamento comercial de veículos autónomos e dos serviços associados. Por esta razão, temos de encarar todos os anúncios com alguma reserva.

No segmento dos veículos pesados, várias empresas anunciaram o lançamento das suas atividades comerciais (sem operadores de segurança) entre 2023 e 2025. Este é o caso da Aurora Innovation (no final de 2023), TuSimple, Plus ou Embark. A maioria irá operar de acordo com um modelo Driver-as-a-Service, cobrando por quilómetro pelo seu hardware e software em autoestradas pré-mapeadas (entre rampas de acesso). A TuSimple está também a considerar operar num modelo Trucking-as-a-Service, apesar da eventual competição com os clientes poder representar um desafio adicional. A maior parte das empresas asseguraram parceiras com fabricantes (por exemplo, a Aurora com o Grupo Volvo), bem como parcerias nas áreas de serviços e gestão de frotas, de forma a permitir implementações eficientes em corredores com elevado volume de tráfego.

No que diz respeito aos robotáxis, as empresas de desenvolvimento tecnológico que já lançaram projetos-piloto e atividades comerciais têm evitado promessas audaciosas, exceto quando se trata de veículos especificamente criados para este propósito – vários robotáxis foram já apresentados (Zoox. Cruise Origin) ou anunciados (Zeekr para a Waymo, Arrival para a Uber, etc.). Prevejo que as primeiras iniciem as operações com frotas-piloto em 2023.

Para estas atividades centradas em robotáxis ou camiões autónomos, espero que o crescimento se traduza inicialmente na implementação de mais veículos em ODD já estabelecidas (cidades, autoestradas) e na expansão destas ODD (novos bairros e distritos, mais segmentos nas mesmas autoestradas). A abertura de novas ODD (novas cidades, novas regiões) levará agora mais tempo, uma vez que exigem tarefas mais complexas e caras – mapeamento 3D de alta definição, por exemplo.

A maior parte dos fabricantes fará o melhor possível para tentar acompanhar estas tendências. Por exemplo, a Volkswagen está a planear um serviço sem condutor baseado no ID.Buzz para transporte de pessoas e mercadoria, a operar em Hamburgo a partir de 2025 – a Argo AI fornecerá a tecnologia L4 AD. A maioria dos restantes fabricantes estão seguramente a considerar esta opção, combinando a sua experiência e conhecimento do veículo com o conhecimento dos fornecedores de soluções de Condução Autónoma. Esta é uma solução para aumentar as receitas dos serviços de mobilidade (pessoas e bens), uma vez que as vendas de veículos privados vão provavelmente retrair-se.

No curto prazo, os fabricantes vão escalar a implementação de sistemas de Nível 2/2+, focados na segurança, assim como soluções de Nível 3 e de estacionamento autónomo. À medida que avançamos rumo ao automóvel centrado no software, os fabricantes terão oportunidade de desenvolver estas funcionalidades ao longo do tempo, ativando novas características e obtendo receitas com base em subscrições. Mesmo que os clientes decidam não pagar por estes elementos adicionais, os fabricantes poderão testar os seus produtos antes ainda de estes estarem completamente desenvolvidos e obter dados que lhes permitam aumentar o desempenho. O Nível 4 em veículos concebidos para o público está ainda longe.

Além dos níveis referidos acima, prevejo que a autonomia L4 continue a permear crescentemente setores como a agricultura, extração mineira, logística industrial ou corte de relva profissional, entre outros. A Condução Autónoma está ainda longe de ser uma tecnologia madura.

Marc Amblard é mestre em Engenharia pela Arts et Métiers ParisTech e possui um MBA pela Universidade do Michigan. Radicado atualmente em Silicon Valley, é diretor executivo da Orsay Consulting, prestando serviços de consultoria a clientes empresariais e start-ups sobre assuntos relacionados com a transformação profunda do espaço da mobilidade, eletrificação autónoma e veículos partilhados e conectados.

Micromobilidade controversa

Micromobilidade controversa

Opinião de Stefan Carsten

As críticas diárias às trotinetes, ciclomotores e bicicletas estacionados em todo o lado (mas onde não incomodam ninguém) sobem de tom em cada vez mais cidades. Enquanto algumas já reagiram com novas regulamentações no interesse dos cidadãos, outras estão a considerar a criação de novas taxas e regras mais rígidas a operadores de mobilidade partilhada.

Paris mostra a muitas cidades como é que isso pode funcionar. A cidade tem sido um mercado importante para as empresas de partilha de scooters devido à sua elevada densidade populacional, uma grande rede de ciclovias (que cresce a cada ano) e muitos turistas. Em consequência, a situação estava um pouco fora de controlo. A determinada altura, eram 16 as startups que queriam operar frotas de scooters em Paris. A capital francesa acabou por selecionar três empresas e implementou um conjunto de regras. Dott, Lime e Tier ganharam licenças para operar scooters elétricas durante dois anos.

Curiosamente, Estocolmo e Oslo seguiram esta mesma abordagem. As autoridades da cidade de Estocolmo reduziram para metade o número de licenças de scooters para apenas 12.000, partilhadas entre 3 operadores, decisão contestada pelos operadores existentes. As novas regras para partilha de scooters em Oslo, em consulta pública, limitariam os 8.000 veículos atualmente permitidos a apenas 3 operadores.

Em Paris, a fase seguinte da regulamentação começou no ano passado. Foi feita uma listagem de uma dezena de áreas com alta densidade de peões, onde as empresas de partilha concordaram em limitar a velocidade máxima a 10 km/h usando sistemas de geolocalização em tempo real. Pouco depois disso, a cidade de Paris pediu à administração de cada arrondissement para listar áreas onde a velocidade máxima das scooters deveria ser limitada a 10 km/h. O resultado é um aglomerado de 700 zonas lentas. E as startups concordaram em implementar essas zonas nos seus serviços.

Muitos analistas apelam a ações semelhantes ​noutras cidades para uma melhor integração da mudança do paradigma da mobilidade. Mas nem todas as cidades estão a responder afirmativamente. A abordagem atual é discutida de forma bastante controversa em Berlim (uma cidade que tem um dos maiores volumes de veículos partilhados na Europa), mas que ainda vê cada vez mais carros nas ruas.

O recém-eleito governo da cidade está a apoiar, na verdade, uma configuração de mobilidade sustentável e inclusiva com transporte público forte e mais alternativas aos carros particulares. O conceito de mobilidade Jelbi, um projeto que integra na mesma plataforma os transportes públicos e os serviços partilhados, com hubs de mobilidade em estações de transporte público, está a ser expandido e as operadoras de mobilidade partilhada já estão a alimentar, com dados de utilização anónimos, uma plataforma de análise centralizada.

Até agora, Berlim teve apenas um conjunto mínimo de regulamentações para scooters, ciclomotores e carros partilhados, mas isso pode estar a mudar. Para trazer mais mobilidade partilhada para outras áreas, além do denso centro da cidade, foi aprovada no Senado, no final de 2021, uma lei atualizada para uso das ruas. Uma vez implementada, a lei permitirá que o governo da cidade oriente melhor os operadores de mobilidade partilhada: existem planos para vincular licenças de operação a taxas, quotas definidas para frotas (principalmente em áreas comerciais fora do centro da cidade) e regras sobre estacionamento e uso de faixas de rodagem. 

No entanto, Berlim continua por enquanto a ser uma cidade obcecada com as scooters. No quarto trimestre de 2021, o número de passageiros quadruplicou, em termos homólogos, em linha com a forte aceitação de todos os modos de mobilidade partilhados. Mas o que é discutido publicamente são planos para que as licenças de estacionamento para automóveis no centro da cidade custem 120€, e 60€ para scooters: se calcularmos que cabem 5 scooters num único lugar de estacionamento, verificamos que há um enorme desequilíbrio de preços. Até agora, a cidade de Berlim não conseguiu apresentar uma proposta que mostre como os serviços de partilha, desejados e necessários, devem ser apoiados e como a gama de serviços pode ser expandida a todos os berlinenses.

Se Berlim quer alternativas aos carros particulares, então estas devem ser promovidas, e não restringidas. Uma taxa resulta no oposto, porque leva à discriminação das ofertas de partilha. Uma alternativa é, por exemplo, a criação de mais vagas de estacionamento em antigos estacionamentos de carros, investimento numa melhor e mais segura infraestrutura cicloviária e ligações visíveis ao sistema de transporte público.

Paris mostrou como criar mais de 2.500 vagas de estacionamento para veículos partilhados em muito pouco tempo e Berlim deve seguir o seu exemplo do ponto de vista regulamentar. Porque enquanto as concessões de utilização especial de domínio público, por si só – como está a ser considerado em Berlim –, só podem regular aspetos quantitativos, Paris colocou os fatores qualitativos em primeiro plano, com um concurso e só aprovou os fornecedores que podem dar resposta aos altos padrões de sustentabilidade, segurança e operacionalidade, o que promete um futuro viável para todas as partes interessadas: a cidade, os cidadãos e os operadores.