Começar um artigo de uma revista ligada a automóveis, ainda por cima elétricos, a falar sobre turismo, pode parecer estranho, mas não é. Muito se fala de sermos um País acolhedor, que vivemos essencialmente de serviços, nomeadamente o turismo. Tem sido ele a alavanca do emprego em Portugal.
Ouvimos falar de um País a duas velocidades, da escassez de oferta de emprego e industria no interior do mesmo, de territórios de baixa densidade e, o quão importante é criar as condições para termos uma indústria forte que permita atrair pessoas e talentos.
E o Circuito das Beiras by Bridgestone e Clube Escape Livre é um bom exemplo, diria mais, um extraordinário exemplo.
Há mais de 100 anos, Tavares de Mello que vivia no Casteleiro, um território “perdido” entre a Covilhã e Belmonte, de famílias nobres, resolveu participar numa prova entre a Figueira da Foz e Lisboa, tendo sido desclassificado da mesma. Decide, por isso, levar o seu Darraq (do qual era o importador), juntamente com o seu mecânico (e condutor) – sim, porque a “sua senhora” não apreciava – a fazer uma prova que mostrasse a zona das Beiras. E, se bem o pensou, assim o fez, criando a primeira prova em Portugal por etapas, com vários participantes, onde permitiu conciliar o automóvel, a visita aos vários territórios e à gastronomia muito rica e desconhecida das regiões.
Tavares de Mello acaba por ficar para história, não só por idealizar o circuito por etapas, mas também por criar a primeira concessão de marcas de automóveis Darraq, por fundar a sua própria marca de automóveis – Tavares – sendo que, posteriormente, começou a fabricar veículos comerciais — os autocarros Tavares – que serviram Coimbra como uma carreira de transporte de passageiros.
E voltando então ao tema dos automóveis. O que tem de especial este Circuito das Beiras?
O Clube Escape Livre e Bridgestone resolveram, mais de 120 depois, lançar aquela que já é a 2ª edição do Circuito que, no ano passado começou em Coimbra, este ano na Guarda, e no próximo ano, será em Castelo Branco.
E o mindset foi recriar a prova com o percurso original, com viaturas da época, com os participantes vestidos com os mesmos trajes dessa altura. Só por isto, já valia a pena marcar presença!
Mas, curiosamente o circuito das Beiras passou a ser internacional, sendo que, nesta edição, contou já com muitos Espanhóis, Ingleses, Australianos e Alemães, onde foi possível ver belas máquinas, excelentemente recuperadas, e outras que, mantêm o seu esplendor original, tal o reduzido número de quilómetros das mesmas e o seu ótimo estado de conservação.
Estiveram presentes automóveis vindos de vários locais, desde Inglaterra, Bilbau e outros que tinham chegado da prova Paris-Pequim… a rodar.
E, de facto, vale a pena percorrer cada metro do percurso, pois as paisagens são desconhecidas e belas, mesmo para quem é da região – o que mostra o cuidado de organização com o seu Road-Book – que, também permite, um são convívio entre todos os participantes. Tudo isto ficou demonstrado em cada uma das zonas por onde a grande caravana passou, mas também porque as entidades oficiais participaram ativamente na ativação da marca do seu território.
Tive o prazer e privilégio de percorrer toda a prova e sendo umadas minhas áreas de atuação na universidade – marketing territorial e relacional- comprovo, com agrado, o cuidado que a organização e as entidades oficiais colocaram para divulgar o seu território, paisagens, cultura, gastronomia, tradições e produtos da região; de tal modo que, não foi só um participante ou dois que compraram produtos da região; foram vários!
A prova não é uma competição, embora exista o espírito competitivo entre alguns concorrentes; é antes uma celebração e espaço de convívio, networking, de entusiastas do automóveis que estão ali com um propósito: conduzir, sem qualquer ostentação, os seus belos automóveis e celebrar cada momento, normalmente em família, com o seu companheiro(a).
Termino, quase como comecei. Conseguimos ter ainda entidades privadas, públicas e oficiais que tudo têm feito para perpetuar a história e a memória do território e do automóvel, por que só podemos celebrar e encarar o futuro, conhecendo a nossa história e o que nos trouxe aos dias de hoje dos novos automóveis, agora eletrificados.