fbpx

Green Future-AutoMagazine

O novo portal que leva até si artigos de opinião, crónicas, novidades e estreias do mundo da mobilidade sustentável

Comentário do mês

Circuito das Beiras 2024: Olhar para o passado para compreender o presente

Começar um artigo de uma revista ligada a automóveis, ainda por cima elétricos, a falar sobre turismo, pode parecer estranho, mas não é. Muito se fala de sermos um País acolhedor, que vivemos essencialmente de serviços, nomeadamente o turismo. Tem sido ele a alavanca do emprego em Portugal.

Ouvimos falar de um País a duas velocidades, da escassez de oferta de emprego e industria  no interior do mesmo, de territórios  de baixa densidade e, o quão importante é criar as condições para termos uma indústria forte que permita atrair pessoas e talentos.

E o Circuito das Beiras by Bridgestone e Clube Escape Livre é um bom exemplo, diria mais, um extraordinário exemplo.

Há mais de 100 anos, Tavares de Mello que vivia no Casteleiro, um território “perdido” entre a Covilhã e Belmonte, de famílias nobres, resolveu participar numa prova entre a Figueira da Foz e Lisboa, tendo sido desclassificado da mesma. Decide, por isso, levar o seu Darraq (do qual era o importador), juntamente com o seu mecânico (e condutor) – sim, porque a “sua senhora” não apreciava –  a fazer uma prova que mostrasse a zona das Beiras. E, se bem o pensou, assim o fez, criando a primeira prova em Portugal por etapas, com vários participantes, onde permitiu conciliar o automóvel, a visita aos vários territórios e à gastronomia muito rica e desconhecida das regiões. 

Tavares de Mello acaba por ficar para história,  não só por idealizar o circuito por etapas, mas também por criar a primeira concessão de marcas de automóveis Darraq, por fundar a sua própria marca de automóveis – Tavares – sendo que, posteriormente, começou a fabricar veículos comerciais — os autocarros Tavares – que serviram Coimbra como uma carreira de transporte de passageiros.

E voltando então ao tema dos automóveis. O que tem de especial este Circuito das Beiras?

O Clube Escape Livre e Bridgestone resolveram, mais de 120 depois, lançar aquela que já é a 2ª edição do Circuito que, no ano passado começou em Coimbra, este ano na Guarda, e no próximo ano, será em Castelo Branco.

E o mindset foi recriar a prova com o percurso original, com viaturas da época, com os participantes vestidos com os mesmos trajes dessa altura. Só por isto, já valia a pena marcar presença!

Mas, curiosamente o circuito das Beiras passou a ser internacional, sendo que, nesta edição, contou já com muitos Espanhóis, Ingleses, Australianos e Alemães, onde foi possível ver belas máquinas, excelentemente recuperadas, e outras que, mantêm o seu esplendor original, tal o reduzido número de quilómetros das mesmas e o seu ótimo estado de conservação. 

Estiveram presentes automóveis vindos de vários locais, desde Inglaterra, Bilbau e outros que tinham chegado da prova Paris-Pequim… a rodar. 

E, de facto, vale a pena percorrer cada metro do percurso, pois as paisagens são desconhecidas e belas, mesmo para quem é da região – o que mostra o cuidado de organização com o seu Road-Book – que, também permite, um são convívio entre todos os participantes. Tudo isto ficou demonstrado em cada uma das zonas por onde a grande caravana passou, mas também porque as entidades oficiais participaram ativamente na ativação da marca do seu território. 

Tive o prazer e  privilégio  de percorrer toda a prova e sendo umadas minhas áreas de atuação na universidade –  marketing territorial e relacional- comprovo, com agrado, o cuidado que a organização e as entidades oficiais colocaram para divulgar o seu território, paisagens, cultura, gastronomia, tradições e produtos da região; de tal modo que, não foi só um participante ou dois que compraram produtos da região; foram vários!

A prova não é uma competição, embora exista o espírito competitivo entre alguns concorrentes; é antes uma celebração e espaço de convívio, networking, de entusiastas do automóveis que estão ali com um propósito: conduzir, sem qualquer ostentação, os seus belos automóveis e celebrar cada momento, normalmente em família, com o seu companheiro(a).

Termino, quase como comecei. Conseguimos ter ainda entidades privadas, públicas e oficiais que tudo têm feito para perpetuar a história e a memória do território e do automóvel,  por que só podemos celebrar e encarar o futuro, conhecendo a nossa história e o que nos trouxe aos dias de hoje dos novos automóveis, agora eletrificados. 

Novo Governo, novas políticas?

A transição para a mobilidade elétrica trouxe ao setor automóvel toda uma adaptação e reconversão. A pandemia trouxe também mudanças no modo como pretendemos viver nas próximas décadas. Exigimos, enquanto consumidores, marcas com propósito, com responsabilidade social e alinhadas com esta nova realidade.

Assim, estas investiram fortemente em desenvolver viaturas elétricas, criaram modelos de negócio distintos, algumas criaram até novas marcas; adotaram modelos comerciais diferentes, ao mesmo tempo que foram desinvestindo nos motores a combustão, nalguns casos, sem ainda ter o ROI desse investimento de décadas.

Cada Governo criou planos de mobilidade para esta transição. Não fomos exceção mas fomos tímidos demais. Em Portugal assistimos a uma adesão à eletrificação e, porventura ficamos com a ilusão que todos os Portugueses estão ali representados, mas a realidade é bem diferente.  

Portugal não é o País Europeu que oferece mais incentivos à aquisição de um elétrico (olhe-se para Espanha); não oferece o melhor preço de carregamento, não tem das melhores redes de carregamento, as habitações ainda não estão preparadas para os postos de carregamento e, mesmo assim, as vendas foram sempre subindo de forma sustentada, sendo que, aos dias de hoje, começaram a decair  com os híbridos e híbridos plug-in a crescer.

Verificamos que o primeiro trimestre continua a mostrar sinais de aumento de viaturas eletrificadas, com a Tesla neste primeiro trimestre a ser líder do mercado de veículos ligeiros de passageiros 100% elétricos, seguido pela BMW, Mercedes-Benz, Citroen e Volvo.

Mas estes números não espelham a realidade das vendas. A maioria é vendida para o segmento empresarial (devido aos incentivos que possui do Estado) dado que, o particular, só residualmente consegue comprar estas viaturas; não sendo de estranhar que o Dacia Spring seja dos mais vendidos. 

E isto acontece porque não existe uma verdadeira política de transição para a eletrificação, seja ao nível do preço das viaturas, seja no incentivo à instalação de postos de carregamento, a incentivos para o abate de viaturas  – temos dos parques automóveis mais envelhecidos da Europa, superior a 13 anos, o que configura muitos carros com idades próximas dos 20 anos. A disparidade de preços nos postos de carregamento começa a aproximar-se e, já nalguns casos a superar valores de um motor a combustão.

E Portugal até é um País que está muito predisposto para as novas tecnologias, além de que somos um País pequeno que nem deve sofrer da “ansiedade da autonomia” dos elétricos, dado que as distâncias que percorremos são quase sempre a rondar os 300kms (a autonomia normal de um elétrico)

Assim, o novo Governo pode/deve, para conseguir cumprir as metas da descarbonização para 2035, atuar, para implementar uma verdadeira estratégia que permita a renovação do parque automóvel e conseguir que um País com baixos salários, baixo poder de compra troque o seu automóvel a combustão – velhinho – por um elétrico ou hibrido, percebendo que essa mudança lhe vai trazer menores custos mensais/anuais (manutenção da viatura por exemplo). 

E, essa mudança de política deve ser equacionada por quem agora assume responsabilidades governativas, dado que, os novos automóveis, com maior segurança ativa e passiva, com dispositivos que evitam/previnem acidentes, permitem que muitos Portugueses não vão parar aos hospitais, não sobrecarreguem o SNS, não coloquem baixas na Seg. Social e, assim contribuam com a sua presença para um aumento da produtividade das empresas felizes e com saúde.

Revisão do quadro jurídico da mobilidade elétrica: Rumo a um Futuro Sustentável

Há vários anos que a Associação de Utilizadores de Veículos Eléctricos (UVE) tem vindo a promover a revisão do enquadramento legal da Mobilidade Eléctrica (ME) em Portugal, em parceria com o CEiiA, com o objetivo de melhorar o modelo atual. Três anos após a apresentação do estudo às autoridades e com o surgimento do Ambiente de Fomento da Inovação na Rede (AFIR), novos desafios se colocam, exigindo melhorias que reforcem o mercado já consolidado.

A UVE acompanha de perto o mercado de carregamento de Veículos Eléctricos (VE) em Portugal, procurando expandir a rede a um ritmo acelerado e defender os interesses dos proprietários de VE, promovendo uma relação justa com os vários intervenientes.

Com o objetivo de consolidar os contributos da UVE e propor novas melhorias, foi elaborado um documento que destaca os principais pontos que a revisão do regime jurídico dos VE deve abordar. Este é um passo crucial para a construção de um modelo de mobilidade elétrica mais eficiente e sustentável para o futuro.

Conheça a proposta completa da UVE:

Boas Práticas para preservar a saúde da bateria do seu Veículo Elétrico

Quando se fala das baterias de um veículo 100% elétrico, estas são sempre o componente que cria mais ansiedade nos utilizadores. Cumprindo algumas boas práticas simples e compreendendo alguns dos mitos criados sobre as baterias dos veículos elétricos, pode manter a saúde da bateria durante mais tempo.

Os primeiros veículos 100% elétricos produzidos em massa e comercializados em Portugal, estão agora a completar entre 10 a 15 anos, que era o tempo de vida útil previsto para uma bateria destes veículos, mas muitos ainda se encontram a circular. Naturalmente que existiram casos em que a bateria teve de ser substituída antes de atingir 10 anos de utilização, contudo, é importante referir que as primeiras baterias comercializadas contêm tecnologia que é hoje considerada obsoleta. Atualmente, as baterias são produzidas com o uso de tecnologia mais robusta e eficiente, com o aumento significativo da capacidade, mas também para garantir a longevidade e saúde das baterias dos veículos elétricos.

O desgaste da bateria de um veículo elétrico é um processo – mesmo com um uso cuidado –, que ocorre naturalmente ao longo do tempo. Após 10 anos, uma bateria de iões de lítio pode perder naturalmente cerca de 20% da sua capacidade de armazenamento. Ora, se existe um desgaste natural desta capacidade, é importante adicionar cuidados que evitem acelerar ou até reduzir esse mesmo desgaste. Em todo o caso, a maioria das marcas oferece a garantia da bateria (de tração), em que efetuam a substituição da mesma (caso sofram desgaste natural acentuado) antes dos 8 anos ou 160.000 km (o que ocorrer primeiro). Esta garantia confere segurança aos utilizadores de veículos elétricos – e aos potenciais utilizadores que se sintam ainda inseguros na troca para um veículo 100% elétrico em que a capacidade da bateria seja um fator decisivo – mas é uma garantia que se baseia nas novas tecnologias de fabrico e operação da bateria de veículos elétricos, que permitem às marcas oferecer este tipo de garantia. De notar que isto não significa que após 160.000 km ou 8 anos a bateria fica em fim de vida, bem pelo contrário! Contudo, o cumprimento ou extensão da garantia conferida pelas marcas carece de avaliação se a mesma foi carregada e mantida de forma segura. Saiba o que pode fazer para garantir a longevidade da saúde da bateria do seu veículo elétrico:

Carregar a bateria acima dos 80% danifica a bateria? Não. Contudo, evite deixar a bateria sempre a 100%, com o veículo parado durante muito tempo.

As baterias dos veículos elétricos estão perfeitamente preparadas para carregar até aos 100%. Essencialmente, sim, pode carregar acima dos 80%, mas será que vale sempre a pena fazê-lo?

  • Se o carregamento estiver a ser feito em casa/escritório, em Corrente Alternada (AC), sendo este um carregamento mais demorado e mais económico, pode carregar a bateria até 100% se tiver tempo e assim o desejar. Mas, mais importante que o tempo que demora a carregar, só deve carregar acima de 80% se pretender usar o veículo de seguida (ou seja, não vai ficar parado durante alguns dias).
  • Se estiver a carregar num posto da rede pública, pode também carregar acima dos 80% se assim o desejar, mas tem de estar consciente que o carregamento que está a efetuar é cobrado ao minuto e os últimos 20% de carga da bateria demoram muito mais a carregar, o que pode significar uma cobrança maior – principalmente se estiver a usar um posto de carregamento rápido, super-rápido ou ultrarrápido. Quanto mais potente for o posto de carregamento, mais caro será a cobrança por minuto (a quase totalidade dos postos rápidos ou acima cobram por tempo de utilização). Por isso, quando usar um posto rápido, super-rápido ou ultrarrápido deverá carregar somente até aos 80%, simplesmente por uma questão de economia de tempo e dinheiro.

Tal como referido anteriormente, se tiver intenção de utilizar logo o veículo depois de o carregar, pode carregar a bateria até aos 100%.

Há uma vantagem adicional em limitar a carga a 80% ou 90%, que é o facto de grande parte dos veículos não permitirem regeneração quando a 100%, aumentando o nível de regeneração disponível à medida que o estado de carga baixa, estando geralmente totalmente disponível abaixo dos 80% de estado de carga.

Um veículo elétrico não deve ficar parado durante dias com a bateria carregada a 100%, pois isso intensifica o desgaste da bateria, especialmente quando associado a temperatura ambiente elevada. Se o veículo tiver de ficar parado durante uns dias (por exemplo, em períodos de férias), opte por deixá-lo estacionado com um nível de carga entre os 60%-80% para evitar desgaste.

Muitos dos veículos elétricos até sugerem – nas definições de carregamento da bateria – que o carregamento fique limitado a 80%. Isto não é um indicador de que não possa carregar acima de 80%, serve apenas para prevenir o desgaste da bateria por ser constantemente carregada até 100% e não ser imediatamente utilizada. Se sempre que carregar o veículo elétrico até 100%, o utilizar de seguida, então não há motivo para preocupação.

Há, no entanto, tecnologias de baterias com menor suscetibilidade ao desgaste quando estão a 100% de estado de carga do que outras. No caso das baterias com tecnologia LFP (Lítio Ferro Fosfato), esta caraterística é praticamente inexistente, mesmo quando ficam a 100% durante dias. É até recomendado pelos fabricantes que estas baterias sejam carregadas a 100% com frequência, para que a estimativa do estado de carga seja o mais precisa possível. Mas mesmo com esta tecnologia, a desvantagem de maior custo de carregamento nos postos de carga rápida ou superior e a perda temporária de regeneração continuam a existir, pelo que os utilizadores devem ter em consideração quando fazem uma carga a 100%.

Embora possa circular com o veículo elétrico até ao limite da capacidade da bateria, é aconselhável evitar que a percentagem da bateria se aproxime de zero – e que assim se mantenha até carregar o veículo de seguida. Manter a bateria a zero pode condicionar o carregamento da mesma. Procure ter 20% como referência da capacidade mínima da bateria, antes de a carregar novamente – seja em viagem ou no dia-a-dia.

Carregar a bateria em Postos Rápidos / Super-rápidos e Ultrarrápidos danifica a bateria mais depressa? – Não, mas devem ser utilizados corretamente. Os Postos de Carregamento Rápido (PCR), Super-rápido (PCSR) ou Ultrarrápido (PCUR) estão localizados, por norma, em autoestradas, em hubs de carregamento, em áreas de serviço nas cidades, centros comerciais, etc. de forma a serem facilmente acessíveis aos utilizadores, visto que são postos – como o nome indica – de utilização rápida.

Estes postos, especialmente os mais potentes, não devem ser utilizados para carregar a bateria do seu veículo durante mais 30-40 minutos, ou acima dos 80% de carga da bateria, pois para além deste tempo ou nível de carga, está a pagar muito dinheiro e a perder demasiado tempo no carregamento do veículo. Por exemplo, se tiver um veículo 100% elétrico e não tiver como carregar o mesmo enquanto trabalha ou em casa, pode optar por carregar o veículo uma vez por semana, num PCR/PCSR/PCUR, durante 30-40 minutos (ou até aos 80% de carga da bateria). Pode inclusive conciliar este tempo de carregamento com a viagem de ir às compras ao supermercado, uma refeição, ou tratar de outro assunto nas redondezas da localização de um posto de carregamento rápido.

Nota: Se tiver um veículo híbrido plug-in, não utilize os postos de carregamento rápido. A bateria de um veículo híbrido plug-in é mais pequena e carrega mais lentamente que um veículo 100% elétrico, por isso, utilizar um posto rápido (que cobra por tempo e energia) para carregar a bateria sair-lhe-á muito caro e demorará horas a terminar o carregamento. Sempre que possível, os híbridos plug-in devem utilizar postos até 22 kW para carregar a bateria, que podem ser encontrados em estacionamentos, supermercados, etc. ou carregar em casa ou no trabalho.

Uma das características mais importantes que deve conhecer no seu veículo 100% elétrico é a potência a que o mesmo consegue carregar em Corrente Alternada (AC) e em Corrente Contínua (DC), pois estas caraterísticas permitem-lhe escolher o melhor posto para carregar o seu veículo. Por exemplo, imagine que está em viagem com um veículo 100% elétrico e depara-se com dois postos de Carregamento Rápido: um deles com 50 kW de potência e um outro com 350 kW de potência. Se, por exemplo, o seu veículo carrega a 50 kW em DC, opte pelo Carregador de 50 kW; por outro lado, se o seu veículo suporta carregamentos em DC até, por exemplo, 250 kW, opte pelo carregador mais potente, visto que vai conseguir carregar mais rapidamente. Se por um lado, não lhe é importante o tempo de carregamento, mas sim o custo do mesmo, verá que o carregamento num posto com menos potência, é – por norma – mais económico, pois, tal como referido anteriormente, quanto mais potente for o posto de carregamento, mais cara será a cobrança por minuto/kWh. Pode consulta as características do seu Veículo 100% Elétrico – nomeadamente a potência de carregamento em AC e DC – em EV Database

Uma das questões frequentes que recebemos na UVE é se os veículos elétricos podem ser carregados em qualquer tomada. Sim, podem, mas devem ser considerados como carregamentos ocasionais e deve considerar os riscos que tal implica. Por exemplo, se o carregamento for efetuado numa tomada elétrica que foi instalada por um eletricista certificado e essa mesma tomada está preparada para uma utilização contínua para carregamento de um veículo elétrico, não deve haver problema. Por outro lado, se optar por colocar o seu veículo elétrico a carregar numa tomada doméstica – que desconhece a segurança com que a instalação da mesma foi feita – ou usar extensões elétricas para ligar o seu carregador, pode ocorrer aquecimento do cabo de carregamento e da tomada ou – em casos extremos – criar mesmo curto-circuito na instalação elétrica por sobreaquecimento dos condutores. 

Para evitar riscos no carregamento, o utilizador deverá garantir que a instalação que utiliza para carregar em casa/condomínio foi realizada por um eletricista certificado e que a instalação cumpre os requisitos de segurança. O técnico que realizar a instalação deverá ter conhecimento e cumprir o Guia Técnico das Instalações Elétricas para a Alimentação de Veículos Elétricos (Edição 3, publicada em 2023 pela DGEG – Direção Geral de Energia e Geologia, disponível aqui)

Se pretender, pode saber qual o estado de “saúde” da bateria do seu veículo. No caso de degradação, várias das baterias dos veículos elétricos no mercado permitem a substituição parcial da bateria (células) – sem necessidade de substituição integral. Os Associados UVE beneficiam de um conjunto de descontos em vários parceiros, entre os quais empresas com capacidade de diagnóstico e verificação da saúde das baterias dos veículos elétricos e híbridos plug-in tal como empresas de assistência técnica no caso de necessidade de reparação. Conheça a seleção de parceiros com descontos e todas as vantagens em ser Associado da UVE, aqui.

A UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos, é um organismo sem fins lucrativos e Entidade de Utilidade Pública, com a missão de promover a mobilidade elétrica.
Surgiu a partir da necessidade de representar oficialmente e dar voz a uma já significativa comunidade de proprietários, utilizadores e simpatizantes de veículos 100% elétricos e híbridos plug-in em Portugal.
Tem dúvidas sobre Veículos Elétricos? Nós respondemos.

www.uve.pt
geral@uve.pt
+351 910910901

Facebook: @uve.pt
Instagram: @uve.pt
LinkedIN: @uvept
Youtube: @associacaouve

Retrospetiva de 2023 na Mobilidade e Autotecnologia

O ano de 2023 foi definitivamente agitado tanto na mobilidade como na tecnologia automóvel, provando mais uma vez que esta indústria está a passar por uma transformação maciça. Aconteceram muitas coisas, em particular nos espaços dos veículos elétricos e da condução autónoma. Vejamos os acontecimentos mais significativos, tanto bons como maus, que ocorreram ao longo do ano.

Eletrificação

Comecemos pelo mercado dos veículos eléctricos a bateria (BEV). Até ao final de 2023, as vendas globais terão aumentado cerca de 15% em relação a 2022, embora a repartição regional seja muito contrastada. A China registará um aumento marginal do volume em 2023, com uma quota de mercado de VEB a atingir cerca de 25% – continuará a ser o maior mercado de VEB. Na Europa, as vendas aumentarão cerca de 50%, representando cerca de 14% do mercado. Os EUA continuam a registar um atraso nas vendas de VEB, embora venham a crescer cerca de 50%, atingindo uma quota de mercado de 7,5%. Além disso, um VEB – Tesla Model Y – será provavelmente o veículo mais vendido a nível mundial em 2023.

Foram introduzidos novos modelos em mais segmentos de mercado e foram anunciados mais para os próximos anos. No entanto, os operadores históricos sediados nos EUA reduziram a sua ambição, adiando o lançamento de VEB (por exemplo, três para a GM) ou reduzindo a futura capacidade das baterias (por exemplo, a Ford).

A Tesla continua a deter cerca de 60% do mercado de VEB nos EUA, à frente da GM, que ocupa o segundo lugar, com um rácio de 10 para 1. No entanto, está a cair na Europa e a competir com a Stellantis, com cerca de 15% de quota de mercado, pela segunda posição, enquanto o Grupo VW lidera o grupo. No entanto, a Tesla atingirá cerca de 1,8 milhões de unidades a nível mundial em 2023 e manterá a sua liderança global no sector dos VEB.

Os jogadores emergentes de BEV baseados nos EUA terminam 2023 com sucessos mistos. Nos EUA, a Rivian (R1T, R1S e carrinha) aumentou recentemente a sua projeção de produção para 2023 para 54 mil veículos, enquanto a Lucid (Air) e a Fisker (Ocean) reduziram novamente a sua para 8 mil e 10 mil unidades, respetivamente. Na Europa, a Lightyear (Países Baixos) e a Sono Motors (Alemanha) suspenderam os planos de produção de veículos eléctricos e concentram-se agora nos tectos solares para automóveis, e a Hopium (França) encontra-se em processo de liquidação.

Na China, a BYD e a Geely registaram um crescimento significativo graças, em parte, à introdução de veículos novos e competitivos, em particular no espaço BEV/PHEV (também conhecido como New Energy Vehicle). Por outro lado, os operadores históricos europeus e americanos continuam a sofrer e estão a reagir não só organicamente, mas também externamente. A VW investiu 700 milhões de dólares numa participação de 5% no emergente BEV OEM Xpeng e utilizará a plataforma deste último para construir dois BEVs destinados à China. Do mesmo modo, a Stellantis adquiriu uma participação de 20% na Leapmotor por 1,5 mil milhões de euros, com o objetivo de tirar partido da base de baixos custos do OEM chinês para distribuir os seus veículos no estrangeiro.

Os OEM chineses não ganharam apenas quota de mercado a nível nacional. Têm-se dedicado agressivamente aos mercados de exportação, em parte devido a um aumento excessivo da capacidade interna. Um total de 2,6 milhões de veículos de passageiros deixou a China nos primeiros nove meses, um aumento de 70% em relação ao ano anterior. De notar que cerca de 40% das exportações chinesas têm o emblema de marcas ocidentais, sobretudo da Tesla, com os Model 3 enviados para a Europa.

A Europa é, de facto, o principal destino destes veículos. Os automóveis de fabrico chinês atingiram cerca de 6% do mercado europeu de VEB. No entanto, o crescimento das exportações pode diminuir, uma vez que a UE abriu uma investigação em setembro sobre as importações de veículos potencialmente subsidiados da China. Esta investigação resultará provavelmente em tarifas punitivas ou na exclusão de subsídios locais. Por exemplo, a França acaba de rever o seu regime de incentivos aos veículos eléctricos (até 7 mil euros). Agora tem em conta o CO2 emitido durante a produção e o transporte, favorecendo assim os veículos produzidos na Europa em detrimento dos fabricados na China.

Os OEM e os produtores de baterias juntaram forças para iniciar dezenas de milhares de milhões de dólares de novas capacidades de baterias na Europa e nos EUA. Os actores chineses são claramente evitados como parceiros nos EUA, dada a Lei de Redução da Inflação de 2021. De facto, a IRA prejudica fortemente os incentivos aos veículos eléctricos quando estão envolvidas empresas chinesas, que dominam esmagadoramente a atual cadeia de valor global das baterias.

O carregamento de veículos eléctricos também sofreu alterações. Nos EUA, a Ford e depois a GM anunciaram em maio que utilizariam o conetor de carregamento da Tesla (rebaptizado North American Charging Standard ou NACS) a partir de 2025 e obteriam acesso à sua rede de carregamento em 2024. Isto desencadeou uma reação em cadeia em que uma dúzia de outros OEM anunciaram que iriam fazer o mesmo. Por sua vez, a Sociedade de Engenheiros Automóvel dos EUA (SAE) apressou-se a tornar a NACS numa norma efectiva. A Tesla ganhou a batalha do carregamento graças a soluções de carregamento fiáveis e amplamente implementadas. Isto conduzirá a taxas de utilização mais elevadas e, consequentemente, à rentabilidade.

No entanto, alguns OEM tomaram medidas para evitar que a Tesla ganhasse uma posição hegemónica. A Stellantis, o BMW Group, a GM, a Honda, a Hyundai, a Kia e a Mercedes anunciaram em julho a criação de uma empresa comum. Juntas, pretendem instalar mais de 30 mil estações de alta potência nos EUA e no Canadá.

E quanto aos preços? Os custos de aquisição dos VEB continuam a ser mais elevados do que os dos seus equivalentes com motor de combustão interna, apesar de os incentivos permitirem muitas vezes nivelar as condições de concorrência. Esta diferença de preços mantém-se apesar de uma queda significativa nos últimos 12 meses, que resultou de uma guerra de preços iniciada pela Tesla nas três principais regiões. Nos EUA, por exemplo, o preço médio de transação do BEV (antes de incentivos de $ 5k em média) caiu de $ 65k em seu pico em 2022 para $ 53k em julho de 2023 contra $ 48k para o mercado geral.

Na Europa, onde os OEM chineses vêem uma grande oportunidade, os OEM estão agora a correr para introduzir VEBs na gama dos 20-25 mil euros para se manterem competitivos e chegarem a uma população maior. A Citroën está prestes a começar a vender o C3 a 23300 euros, a Renault lançará o R5 a cerca de 25 mil euros em 2024 e a VW venderá o ID.2 abaixo dos 25 mil euros em 2025. Este esforço para aumentar a acessibilidade económica beneficia da redução do custo das baterias. Ao nível da embalagem, caiu 14% de 2022 para 2023, atingindo 139 dólares por kWh, de acordo com a BloombergNEF.

Por último, os veículos eléctricos alimentados por células de combustível de hidrogénio (FC) estão lentamente a ganhar força para aplicação em veículos comerciais. Por exemplo, a Symbio (JV entre a Forvia, Michelin e Stellantis) inaugurou uma fábrica de FC em França com capacidade inicial para 16.000 unidades por ano e a Bosch iniciou a produção em massa na Alemanha.

Condução autónoma e assistida

Nos EUA, a Waymo tem vindo a operar uma frota comercial de robotáxis sem operadores de segurança em Phoenix desde 2019. Este ano, observámos uma espécie de boom e depois uma quebra parcial. Em julho, a Waymo e a Cruise receberam a autorização final para operar 24 horas por dia, 7 dias por semana, um negócio comercial de robotáxi em São Francisco sem operadores de segurança. Eles iniciaram o serviço com 250-300 veículos cada – embora Cruise tenha começado a operar à noite em 2022. As viagens, que tive a oportunidade de utilizar várias vezes em ambas as plataformas, têm preços competitivos em relação à Uber.

A Cruise estava a preparar-se para implantar o seu serviço numa dúzia de cidades dos Estados Unidos, bem como em Tóquio e no Dubai, e a fazê-lo a um ritmo crescente. Pelo menos era este o plano até que algo de mau aconteceu.

Em outubro, um veículo conduzido por humanos em São Francisco atropelou um peão que voou para a frente do carro da Cruise. Este último parou, voltou a arrancar e passou por cima do peão durante vários metros. Inicialmente, a Cruise omitiu mostrar às autoridades imagens desses últimos metros. Este facto desencadeou a fúria justificada da administração e minou fortemente a confiança que esta depositava na Cruise, cuja autorização de funcionamento foi revogada.

A Cruise acabou por suspender a sua frota nos EUA. A GM, que detém mais de 80% da Cruise, está agora a reconsiderar os mais de 2 mil milhões de dólares que gasta anualmente com a empresa. A gestão de topo da empresa foi remodelada, 25% dos seus 3500 funcionários serão despedidos e foi iniciada uma reavaliação estratégica e cultural aprofundada.

Este ano também foi difícil para outros operadores de mobilidade autónoma. Na Europa, a Navya (vaivéns) entrou em processo de liquidação judicial. No sector dos transportes rodoviários dos EUA, a Embark e a Locomotion encerraram, a Waymo congelou as suas actividades de transporte rodoviário e a TuSimple está a encerrar as suas operações locais para se concentrar na China.

Os serviços comerciais de robotáxi na China parecem ter-se saído melhor do que nos EUA este ano. Os operadores locais receberam autorizações para operar em mais locais (com ou sem operadores de segurança), atingindo cinco cidades contra duas nos EUA. As principais empresas, Baidu, Pony.ai, AutoX ou WeRide, operam atualmente várias centenas de veículos deste tipo.

Quanto aos fabricantes de equipamento original (OEM), estes mudaram, de um modo geral, o seu foco para os ADAS de nível 2 e 3. Em 2023, a Mercedes EQS recebeu a primeira aprovação de sempre para uma solução de condução altamente assistida de Nível 3 (mãos livres, olhos livres) nos EUA, nomeadamente no Nevada e depois na Califórnia. A função pode ser accionada até 64 km/h (40 mph). Note-se que a tecnologia L3 foi aprovada pela primeira vez em 2022 na Alemanha (Mercedes EQS) e no Japão (Honda Legend).

Outras coisas dignas de registo

A enorme onda GenAI começou a impactar o setor automotivo. A Mercedes anunciou o teste beta do ChatGPT da OpenAI no Classe S nos EUA com o objetivo de “tornar o assistente de voz MBUX mais natural e adaptável, permitindo maior variação nas saídas de voz”. Obviamente, a GenAI também está a entrar nos escritórios da indústria para aumentar a eficiência.

Por outro lado, as trotinetes partilhadas sofreram um revés significativo em 2023. Os habitantes de Paris votaram a favor da sua proibição na Cidade das Luzes, que tem sido um mercado importante para esta solução. A utilização de trotinetes privadas continua a ser possível, uma vez que não obstruem os passeios e são provavelmente utilizadas por condutores mais experientes e, por conseguinte, mais seguros.

Algumas empresas em fase de arranque merecem ser mencionadas pela sua tecnologia e tração comercial. A Basemark (AR automóvel, Finlândia) está a ser produzida nos BMW iX e i7. As soluções da Sonatus (SW para acelerar o SDV, EUA) já foram implementadas em mais de 1 milhão de veículos. E a UltraSense (interface tátil, EUA) está a entrar em produção com o Genesis da Hyundai, estando previstas outras.

Por último, a angariação de fundos para as empresas em fase de arranque tornou-se mais difícil em 2023 do que já era em 2022. Mobilidade e autotech, como muitos outros setores verticais, experimentaram menos negócios e avaliações mais baixas, em particular para startups em estágio posterior. Isto resultou em despedimentos significativos em empresas tecnológicas de maior dimensão. Além disso, em 2023, os investidores continuaram a centrar-se na eficiência do capital (especialmente devido às elevadas taxas de juro), na geração de receitas e num caminho para a rentabilidade. Isto contrasta largamente com a procura de um crescimento puro, como foi o caso até 2021.

Aconteceram muitas outras coisas dignas de notícia no espaço da mobilidade que não posso abordar aqui. Continuarei a abordar algumas delas no meu boletim mensal, tal como tenho feito nos 82 artigos que publiquei até à data.

Gostaria de terminar esta análise de 2023 com uma nota algo otimista da COP28. Os 196 países reunidos no Dubai concordaram recentemente em fazer uma “transição para longe dos combustíveis fósseis”. No entanto, os líderes mundiais deveriam ter concluído em conjunto a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, um passo que os cientistas dizem ser necessário para atingir o objetivo de 1,5°C do Acordo de Paris de 2015.

Marc Amblard é mestre em Engenharia pela Arts et Métiers ParisTech e possui um MBA pela Universidade do Michigan. Radicado atualmente em Silicon Valley, é diretor-executivo da Orsay Consulting, prestando serviços de consultoria a clientes empresariais e a startups sobre assuntos relacionados com a transformação do espaço de mobilidade, eletrificação autónoma, veículos partilhados e conectados.

A democratização do elétrico

Comentário de Jorge Farromba

Estamos em 2023 e o ano que passou foi aquele em que mais se venderam viaturas elétricas; e não é um acaso. Tal advém de duas causas principais: em primeiro, as normas europeias vieram obrigar a que as marcas tivessem de se reposicionar neste mercado dos automóveis elétricos, investindo em tecnologia, software e novas plataformas (além da componente da comunicação, adaptação, …)  para proporcionarem uma oferta alargada de modelos aos clientes; e, em segundo lugar, uma das (poucas) consequências benéficas da pandemia: o consumidor que se preocupa cada vez mais com a sua saúde e o seu bem-estar, e que passou a equacionar a aquisição de viaturas elétricas.

O mercado automóvel teve, por isso, de se adaptar rapidamente a todo este novo modo de vivermos em sociedade; os atores políticos tiveram de reinventar as cidades para aceitarem esta nova mobilidade e, no plano rodoviário, foi necessário dotar as várias estradas das necessárias condições para proporcionar carregamentos elétricos. A própria rede elétrica nacional teve de se adaptar para que exista eletricidade suficiente para todo o novo potencial de automóveis elétricos que vão circular em Portugal.

E, tal como na pandemia, onde nos focámos em ouvir muito mais a ciência, nos automóveis elétricos está acontecer algo similar, dado que estamos atentos ao papel dos investigadores e programadores que nos vão tentando oferecer cada vez melhores soluções na criação e otimização das baterias, no menor impacto ambiental ou numa nova tecnologia que permita oferecer maior autonomia e longevidade às mesmas.

Hoje já sabemos conversar e opinar sobre baterias líquidas, consumos das mesmas, baterias sólidas. E também que existem novos métodos de construção das mesmas, por exemplo, por módulos. Todo um novo mundo a que não estávamos habituados porque na altura utilizávamos gasóleo, gasolina ou GPL.

Mas esta nova mudança traz desafios. Não devemos/podemos dizer que é fácil uma tal mudança sem falhas, pois faz parte faz parte do setor automóvel (como da aviação, da medicina e tantos outros setores). Faz parte da vida! Têm surgido noticias de algumas situações de marcas, sejam avarias de software ou outros temas, alguns até por má utilização do condutor,  mas que, em nenhum momento, têm colocado a segurança em causa.

Sabemos que os nossos automóveis hoje se baseiam maioritariamente em software, criado por humanos, testado quase sempre por humanos, mas também já por máquinas. Tenta-se por isso ao máximo apostar em zero falhas, mas, tenhamos a certeza de que esse erro mínimo existe sempre, até ao momento em que consigam estabilizar o software e a tecnologia. Foi assim nos tempos passados e será assim sempre.

Por isso mesmo também a tecnologia OTA ajuda imenso na forma como é que é uma marca, assim que deteta um problema de software, o corrige e o distribui por todos os modelos sem necessidade de visita à oficina. E isso leva-nos para outro artigo, que é o de pensarmos como as marcas, no dia de hoje, se vão ter de adaptar para o novo mercado automóvel, onde o stand como o conhecemos pode vir a desaparecer, bem como as oficinas com as revisões tradicionais.

Mas sobre o tema deste artigo, fiquemos com a garantia de que os automóveis elétricos são hoje uma opção segura e em expansão, onde, nos vários milhares de quilómetros já percorridos com vários deles, raramente, reforço a palavra, encontrei registo de bugs, e que nunca beliscaram sequer a segurança.

A transição de uma tecnologia para outra é, e será sempre, acompanhada de oportunidades de melhoria, seja qual for o setor onde se inserem. Saibamos aproveitar o que de bom esta tecnologia tem trazido, em termos de disrupção, inovação, tecnologia, preservação do meio ambiente e de novos modos de estar e viver em sociedade.

Jorge Farromba é IT Project Manager na TAP Air Portugal

Comunidades de energia e autoconsumo colectivo. Que impacto na mobilidade elétrica?

Comentário de António Gonçalves Pereira

Captar, partilhar, descentralizar, democratizar. Estas são as primeiras palavras que me ocorrem, e que utilizo na minha actividade diária de sensibilização, quando penso nestas soluções comunitárias de geração e fornecimento de energia. Mas será que terão um impacto positivo considerável também na mobilidade elétrica?

O ‘trilema’ energético

A transição de energias poluentes e finitas para as limpas e renováveis é um dos temas mais na ordem do dia há já alguns anos. Infelizmente, foi necessário a Terra começar a demonstrar-nos, de forma cada vez mais eloquente, que estávamos a comprometer a nossa sobrevivência enquanto espécie para que se começasse a criar um movimento de evolução de mentalidades e de procedimentos. E se, inicialmente, eram vozes dispersas e com pouca visibilidade a alertar-nos, nos últimos tempos parece finalmente ter-se entrado numa fase em que esta necessidade de evolução é inquestionável. E com isto não quero dizer que não exista ainda quem a continue a negar mas sim que essas vozes conservadoras e anacrónicas já estão completamente esvaziadas de argumentos. E, se inicialmente vinham também de detentores de posições de poder e de decisão, hoje em dia já estão praticamente restritas a ‘Velhos do Restelo’ e eternos viciados em teorias da conspiração ou em crendices às quais já nem de religiosas se pode apelidar.

Assim sendo, tem-se vindo a incentivar, ou até mesmo já a exigir, que a energia de que necessitamos para todos os aspectos da nossa vida deixe de vir de combustíveis de origem fóssil e que se passem a aproveitar as várias fontes de energia sustentável que desde sempre nos rodeiam, como o sol, o vento ou as correntes hídricas.

Uma das ferramentas para incentivar que esta transição seja efectuada de forma rápida mas justa é o índice de ‘Trilema Energético Mundial’, criado em 2010. Trata-se de uma medição anual dos desempenhos dos sistemas nacionais de energia em cada uma de três dimensões e do equilíbrio entre estas. São elas: 

  • Segurança Energética – mede-se a capacidade de uma nação em atender à demanda de energia actual e futura de forma confiável, de resistir e se recuperar rapidamente de choques no sistema com interrupção mínima do fornecimento. Esta dimensão abrange a eficácia da gestão de fontes de energia domésticas e externas, bem como a confiabilidade e resiliência da infraestrutura energética;
  • Equidade Energética – avalia a capacidade de um país de fornecer acesso universal a energia confiável, acessível e abundante para uso doméstico, comercial e industrial. Esta dimensão analisa o acesso básico à eletricidade e a tecnologias e combustíveis limpo, com níveis de consumo de energia que permitam o conforto e a prosperidade;
  • Sustentabilidade Ambiental dos Sistemas de Energia – representa a transição do sistema de energia de um país para mitigar e evitar possíveis danos ambientais e impactos das mudanças climáticas. Esta dimensão foca-se na produtividade e eficiência da geração, transmissão e distribuição, descarbonização e qualidade do ar;

Como se vê, sendo as 3 vertentes necessárias em conjunto, e não a opção entre eles, deveríamos estar a falar de ‘trifactor’ e não de ‘trilemma’. Mantenhamos isso em mente.

Alternativas à rede

Em Portugal os dados actuais apontam para várias centenas de milhares de cidadãos em situação de pobreza energética, aos quais se juntam mais de um milhão em situação de precariedade no que toca a esta necessidade básica. Simultaneamente, continuamos a assistir ao anúncio frequente da construção de megaprojectos energéticos, tanto eólicos como fotovoltaicos. Não híbridos mas de uma ou outra tecnologia, o que, ao que tudo parece indicar, será menos eficaz. Infraestruturas de grandes dimensões e enormes impactos ambientais, mesmo sendo as fontes sustentáveis, desenhadas para alimentar a rede. Ou seja, energia para ser transportada em alta tensão à outra ponta do país, com os inerentes riscos e desperdícios, e não para consumo de proximidade. 

Entretanto, foi aprovada legislação para que existam reais alternativas à rede, como as Comunidades de Energia, o Autoconsumo Colectivo, a Cogeração. Uma vez que não é previsível que haja a breve trecho uma aposta ao nível municipal ou regional em unidades de captação para consumo de proximidade, com todas as vantagens que daí adviriam nas 3 dimensões do ‘trilema’, estas são as soluções que nos podem dar alguma esperança de que poderemos caminhar para uma energia mais segura, democrática e sustentável.

Acresce ainda que, segundo a Agência Internacional de Energia, mais de metade da necessária redução das emissões de gases de efeito estufa até 2050 está dependente, directa ou indirectamente, de escolhas e atitudes individuais. Isto torna ainda mais relevante a necessidade de acções e projectos de escala local. De vila, de bairro, de quarteirão, de condomínio, de comunidade próxima. Ainda assim, a Comissão Europeia estima, talvez algo optimistamente, que nessa data cerca de metade dos seus cidadãos já estarão a produzir a sua própria energia renovável.

Portugal transpôs a lei europeia de uma forma algo diluída conceptualmente, permitindo que os grandes agentes de mercado possam manter as suas práticas predatórias. Ainda assim, e a acrescentar a soluções cooperativas já existentes, começamos a ver nascer estas comunidades, muitas delas também com uma forte vertente solidária. E vai havendo também um muito considerável crescendo de consultas, de pedidos de informação e de sessões de esclarecimento e sensibilização, um pouco por todo o país, o que deverá resultar naturalmente num aumento exponencial de adopção destas soluções. 

Impacto na mobilidade elétrica

Para não correr o risco de que o que aqui escrevo estivesse demasiado influenciado pela minha postura sensibilizadora, alimentadora de esperanças e positivismo, decidi colocar a questão a um painel de especialistas e agentes de mercado, tanto da área da energia como da mobilidade. Com algumas variações de perspectiva e na rapidez dos resultados, esta consulta permitiu-me concluir que a minha percepção inicial deverá estar correcta.

Curiosamente, constata-se que, já antes do aparecimento legal destas soluções colectivas, em muitos casos foi a mobilidade elétrica que teve impacto na adopção de autoconsumo e não o inverso. Ou seja, muitos que compraram um carro elétrico e tinham essa possibilidade, instalaram painéis fotovoltaicos por isso mesmo, passando assim a circular quase, senão mesmo, a custo zero.

É verdade que, na maioria dos casos, a vertente financeira continua a ser a primeira das razões para se avançar para soluções sustentáveis. Felizmente que, até por economia de escala, estas estão cada vez mais competitivas mesmo no curto prazo. E assim, gerou-se uma bola de neve conjunta entre a mobilidade elétrica e a energia sustentável, uma impulsionando a outra, não havendo sempre uma relação causa-efeito linear.

Da consulta resultou consensual que as comunidades de energia sustentável e as de autoconsumo colectivo terão um impacto positivo na mobilidade elétrica, variando as opiniões somente na importância desse impacto e, sobretudo, na rapidez com que possa acontecer. Deverá manter-se a relação já existente entre ambas o que implicará, com o crescimento de uma, o mesmo acontecerá à outra. Por exemplo, num condomínio, tanto pode acontecer avançar-se para uma destas opções colectivas por já haver vários condóminos a ter ou querer ter um veículo elétrico, como o contrário. Ou seja, a solução energética comunitária surgir por questões financeiras e/ou ambientais e isso resultar depois em aquisições de viaturas elétricas.

Também nos muitos casos em que a razão, ou desculpa, para não avançar para a compra de um carro elétrico é a impossibilidade de carregar em casa, estas soluções colectivas poderão ter um papel crucial, sobretudo se no projecto se incluir também estações de carregamento comunitárias.

Estas soluções são, portanto, uma nítida facilitação e democratização do acesso à energia. Parece-me que o seu impacto no crescimento da mobilidade elétrica será muito considerável, sobretudo quando for acompanhado por uma democratização também do lado desta. Ou seja, quando crescer a oferta de gama média-baixa e, sobretudo, quando houver uma aposta na conversão de veículos a combustão para elétricos.

E se não nos focarmos somente nos automóveis mas alargarmos a análise a motociclos, bicicletas ou trotinetas, o impacto na aceleração da evolução para opções elétricas poderá ser ainda muito mais considerável. Assim não permitamos que os grandes operadores, ou um em particular, consigam atrasar este processo de captação partilhada, descentralização e democratização da energia.

António Gonçalves Pereira é Presidente da Ecomood Portugal e Embaixador do Pacto Europeu para o Clima.

O autor não escreve de acordo com as normas do Acordo Ortográfico de 1990.