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Green Future-AutoMagazine

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O planeamento da mobilidade como colete salva-vidas da COVID-19

Artigo de Opinião de Paula Teles

Opinião de Paula Teles, Presidente e Fundadora do Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade (ICVM). 

O mundo nunca mais será o mesmo depois de 2020 e a mobilidade urbana vai ser fundamental nesta nova equação do planeamento das cidades. Sabemos que o planeta nos obrigou a parar para termos a consciência de que tinha atingido o seu limite.

Os dados mostram que o maior número registado de mortes por COVID-19 coincide com as cidades mais poluídas. Há especialistas que referem que vamos ter de viver em permanentes pandemias, de outras origens e formas, cujas frequências terão ciclos de tempo cada vez mais curtos. Por outro lado, também temos registos que evidenciam que mais de um terço do dióxido de carbono libertado para a atmosfera advém dos transportes e mobilidade. Assim, não se pode negligenciar as preocupações com o uso e abuso do automóvel que o tornou o rei das deslocações. Antes da pandemia, havia cidades que estavam engarrafadas todo o dia. E em Portugal, durante décadas as vilas e as cidades foram desenhadas para este modo. Esta situação, veio contribuir de forma inequívoca, para problemas de saúde pública que agora estamos a enfrentar.

Como podemos inverter esta tendência? Só vejo uma maneira: planear as cidades. Planear a mobilidade e integrá-la com o planeamento urbano e o ordenamento do território. Evitar que todos nós tenhamos de fazer longas distâncias, todos os dias, para nos deslocarmos para o trabalho ou escola. Evitar ainda, a construção de espaços urbanos monofuncionais. É da multiplicidade funcional que deverão ser construídos os nossos bairros e as nossas cidades. De resto, muito tenho escrito sobre o tema, sublinhando a necessidade de termos espaços nas cidades onde a escala urbana seja mais humana. Onde as nossas crianças possam voltar a brincar e jogar a bola. Onde as gerações mais velhas possam cuidar das mais novas, sentadas num banco de jardim, debaixo da frescura de uma árvore. Ou seja, urgente planear as cidades para resgatar espaço ao automóvel, apostando nos modos suaves, como andar a pé e de bicicleta para as curtas distâncias e nos transportes públicos para as maiores distâncias e integrando esta mobilidade na estrutura ecológica urbana.

Mas, como incentivar os cidadãos a usarem os transportes públicos se, também, os traçados, horários e frequências, na maior parte das vezes, não estão alinhadas com as múltiplas cadeias de deslocação geradas durante as múltiplas tarefas profissionais e familiares que se têm de conciliar? Para já nem falar no desenho do chão das cidades, repletos de barreiras urbanísticas e arquitetónicas que impedem o acesso às pessoas com mobilidade reduzida. De resto, importa referir que 60% das deslocações em automóvel são efetuadas para distâncias menores que 3 quilómetros e que apenas desenhamos as cidades para 40% dos cidadãos.

O que é preciso fazer? Tomar decisões políticas! As medidas técnicas há muito que estão referenciadas. Apontam a necessidade de inverter esta tendência excessiva de andar de automóvel e apostam na mobilidade mais suave, amiga, inclusiva e sustentável.
Se por um lado a mobilidade urbana tem de responder às análises dos padrões de mobilidade verificados, por outro, tem de responder, com urgência, aos desafios que o nosso planeta nos está a lançar em matéria de descarbonização e alterações climáticas.

Neste momento e depois destes meses de confinamento, as cidades terão de se preparar, para o retorno às atividades e, consequentemente, ao espaço público. Serão medidas simples a tomar, aproveitando os diversos canais que eram dedicados aos automóveis, transformando-os em ciclovias, em corredores BUS/BRT ou de emergência e, ainda, ampliando os passeios, segregando- as por pinturas, mobiliário urbano ou simplesmente através de sinalização temporária, como balizadores. Várias ruas já estão a ser de coexistência, pedonais ou partilhadas e os sentidos de circulação automóvel aproveitam esta oportunidade para serem repensados. Desenham-se, ainda, novos lugares de estadia, ampliam-se as praças e os lugares de vivência, desenhando cidades como se fossem as nossas casas, onde os ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, impostos pelas Nações Unidas, estão integrados.

Em síntese, a par de medidas de teletrabalho que reduzem emissões, soluções de mobilidade recorrendo a soluções de acupuntura urbana são implementadas, de acordo com as estratégias definidas nos Planos de Mobilidade Urbana Sustentável, os únicos documentos técnicos de informação política, que poderão integrar, numa visão holística, todos os layers que compõem os desafios de hoje. Para isso, precisamos de políticos fortes, com determinação, que façam o seu trabalho, que não pensem na questão populista dos votos, mas sim na necessidade de aumentar e democratizar o espaço público, na certeza de que este modo de mobilidade suave, é essencial na melhoria da saúde do nosso planeta.

Licenciada em Engenheira Civil, com especialização em Planeamento do Território (FEUP). Mestre em Planeamento e Projeto do Ambiente Urbano (FEUP/FAUP) e pós-graduada em Estratégias e Metodologias da Gestão Urbanística. Fundadora e CEO da mpt® (2004), empresa de planeamento urbano e gestão urbanística, pioneira em Portugal na área da mobilidade urbana inclusiva.  Consultora autárquica em dezenas de municípios nas áreas dos Transportes, Mobilidade Urbana, Desenho Urbano e acessibilidades e mobilidade para todos.  Professora universitária em várias Universidades portuguesas e europeias, é fundadora e Presidente do Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade (ICVM). É autora e co-autora de um vasto conjunto de publicações em matéria de Acessibilidade e Mobilidade, recentemente lançou a obra “A Cidades das Bicicletas – Gramática para o Desenho de Cidades Cicláveis” (2019). 

 

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