Gosto de viajar a pé. Sim, a pé. Gosto de pegar na mochila e seguir por montes e vales, levando comigo, às costas, o que necessito e dessa forma tenho uma percepção única da viagem, disfrutando dela ao pormenor.
Costumo dizer que nestes momentos tenho tempo de qualidade, para mim, para me escutar, para me sentir, para aprender. Sim, aprendo coisas enquanto caminho. Aprendo a gerir esforço e aprendi, muito importante, que não consigo transportar mais, do que aquilo que posso levar às costas.
Este ensinamento, foi algo que me mudou, que me levou a reflectir e, por isso, entendi que seria importante partilhar esta minha forma de ver e de agir.
Tenho a sorte de estar integrado numa sociedade confortável. Vemos o “ter” como forma de status. Somos compelidos a comprar, porque nos criam a ilusão de que o descascador de ovos a laser, nos melhora exponencialmente a qualidade de vida e coloca-nos de consciência tranquila, pois se guiarmos um carro eléctrico estamos a salvar uma colónia de pinguins na Antártida. Ficamos confortáveis.
Se perguntarmos o que é o conforto a alguém que vive em alguns países menos privilegiados do que o nosso, o conforto passará, certamente por ter água potável próximo, por saber que mais logo vão ter um jantar.
Nós, por cá, temos carne da Argentina, vinho da Austrália e tofu que não se sabe bem de onde veio, mas foi embalado na Tailândia, por exemplo. Ou seja, estamos habituados a ter e esse “ter”, ser a qualquer custo.
Estamos também habituados a entrarmos no carro, se for electrificado ficamos mais descansados, irmos para um centro comercial, que até fica longe e mudarmos o guarda-roupa, quando muda a estação e logo de seguida, como vêm os saldos, compramos mais uma data de roupa, que até está barata e aquele fato polar, criado para suportar temperaturas entre os -20º e os -40º poderá fazer jeito, se no próximo Inverno se alterar a tendência de aquecimento do planeta. São oportunidades que não se podem perder, convencem-nos.
E se isto é um bocadinho assim, então o que dizer da moda actual de comprar online, o tal descascador de ovos a laser, que está barato e se comprar mais um mocho de plástico para afugentar gaivotas e um alimentador de piranhas, com extracto vegetal, oferecem os portes de envio.
Está mal. Digo eu.
Com as alterações climáticas na ordem do dia, parece-me que é altura de se começar, verdadeiramente, a discutir a sustentabilidade e não me parece que o modelo que adoptamos esteja a ser o mais certo.
O modelo actual passa pelo ter muito e barato. Passa pelo descartar e comprar novo.
O modelo actual passa pelas cadeias de distribuição longas, para suprirem necessidades reais, ou não. Passa pelo transporte de matérias-primas, para locais longínquos, onde são processadas e depois transportadas para outros locais longínquos onde recebem uma marca, uma embalagem (que vai ser para descartar) e depois para um centro de distribuição. Daí vão seguir para lojas e, por fim, para o consumidor final, que muitas vezes até mora mesmo ao lado de onde a matéria-prima foi extraída e que, depois de uma volta ao mundo, quase se pode dizer que regressou a casa.
Estas matérias-primas serão conduzidas num dos 278 milhões de veículos comercias pesados que existem actualmente no mundo, que em média, cada um, emite cerca de 120 kg de CO2 para a atmosfera, por hora.
Eventualmente serão depois transportadas por navio, sendo que as emissões de CO2 de um cargueiro médio, por dia, são da ordem das 5,97 mil toneladas, ou seja: 2.18 milhões de toneladas ano, apenas por um dos 60 mil navios mercantes que operam actualmente (!) – revi estes números várias vezes, porque pareciam-me estupidamente elevados.
Eventualmente poderão também recorrer ao avião que, em média, emite 90 Kg de CO2 por quilómetro, que será como quem diz 81 toneladas por hora. Já agora, há qualquer coisa como 100 mil aviões comerciais a voar por dia. E na sequência destes dados, só mais um número para rematar: de 30 de Dezembro de 2024 a 12 de Janeiro de 2025 foram agendados 9,052,990 voos comerciais.
Alguém disse uma vez, que é só fazer as contas…
Já pensaram no custo ambiental que tem aquele descascador de ovos a laser, que só custa €2,99?
Se todos nós, humanos, consumíssemos como a média dos norte-americanos, seriam necessários cinco planetas do tamanho da terra, por ano, para suprir as necessidades de alimento, bens materiais e energia. Do outro lado da realidade está a Eritreia, que nos deixaria uma margem razoável de “planeta excedente”.
Não quero ser eritreu, quero manter grande parte da qualidade de vida que tenho e acho que para isso, antes de mais, preciso de me interrogar sobre o que preciso e como uso o que realmente necessito. Acho que precisamos todos de pensar, mas pensar como deve ser.
E se caminhássemos juntos? Se chegou até aqui, peço-lhe que faça mais um exercício: carregar a sua mochila. Não precisa de sair de casa, carregue uma mochila imaginária e interrogue-se se precisa mesmo de tudo o que acha indispensável. Depois caminhe.
Na elaboração deste artigo baseei-me nas seguintes fontes: UCL Energy Institue, Statista, international concil on clean transportation, OAG – Oficial Airlines Guide, VehicleHelp.com, 800autotalk.com, Centre For Multilateral Affairs, Centiment Climat, Renobables Verdes
Este texto, por opção de autor, não foi escrito de acordo com as regras do novo A.O.