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Green Future-AutoMagazine

O novo portal que leva até si artigos de opinião, crónicas, novidades e estreias do mundo da mobilidade sustentável

Opinião

Artigo de Opinião de José Carlos Pereira - A Mobilidade Elétrica já se tornou adulta?

A mobilidade elétrica já se tornou adulta?

Opinião de José Carlos Pereira

A mobilidade elétrica ainda não atingiu a maioridade. É até bastante jovem; não diria que a dar os primeiros passos, mas ainda com muito caminho a percorrer e muito para amadurecer.

Veja-se, como simples exemplo ilustrativo, que o lançamento do Leaf da Nissan tem apenas 10 anos. Desde aí, seja em modelos seja em tecnologias, a inovação e a aceleração foram assinaláveis: tecnologia das baterias, autonomia dos veículos, potência do carregamento, interfaces/softwares, conectividade, modelos de negócio e comunicação, regulação, integração na rede elétrica, carga automática (sem fios) e muitas outras. 

Uma verdadeira revolução… que, estou certo, vai continuar em inovação acelerada nos próximos anos. Podemos até aproveitar, exportando para o mundo tecnologia desenvolvida por cá – já existem casos bem interessantes!

E, assumidamente, Portugal está na tendência, pois em 2019 foi o 6º país do mundo com maior quota de venda de veículos elétricos e híbridos plug-in conjugados (5,67%, embora a Noruega lidere com 55,93%).

E o que nos diz isso? Que estamos a ‘surfar’ essa tendência, mas que necessitamos de ter melhores condições de financiamento e fiscais, regulação e infraestruturas para que façamos, efetivamente, parte da revolução. 

A evolução da mobilidade elétrica tem duas etapas distintas: uma inicial, de arranque, e uma segunda de massificação. Na fase de arranque, o financiamento foi (ainda é) a criação de estímulos e incentivos para o desenvolvimento do mercado e da infraestrutura de mobilidade elétrica. Hoje, a escala e o crescimento já possibilitam o aparecimento de modelos de negócio economicamente interessantes e sustentáveis.

Visto já estarmos no início da fase de massificação, deverá prevalecer a lógica de mercado, enquadrada por uma regulação forte e eficaz. E a iniciativa privada deve, nesta fase, ter um papel primordial no desenvolvimento e financiamento dos projetos, apostando naqueles que poderão satisfazer os objetivos de ROI (Return On Investment) e de VOI (Value On Investment).

Uma vez que tenho uma veia ligada à formação e qualificação, diagnostico uma carência (logo, oportunidade) na formação de recursos humanos altamente qualificados nesta área da ME (Mobilidade Elétrica), e este recurso será extremamente importante para o sucesso do setor em Portugal. Assim, torna-se necessário que o país tenha a capacidade de, nas várias modalidades formativas, efetuar ajustes que permitam capacitar e formar recursos humanos que respondam às atuais exigências. 

É também fundamental que as universidades, assim como os centros tecnológicos, tenham a capacidade de ajustar alguns dos seus conteúdos (cursos, licenciaturas, pós-graduações, …), lecionando conteúdos ligados à ME, seja ao nível dos materiais e tecnologias produtivas, seja da eletrónica e TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação).

Outra oportunidade, já em curso em algumas empresas, está no setor dos componentes para automóveis (polímeros, metalomecânica, metalurgia, têxteis, eletrónica e sistemas) e dos moldes, pois são setores cuja adaptação deverá ser considerada estratégica neste novo paradigma da ME.

Entretanto, não querendo ser demasiadamente pessimista (ou realista) quanto a balanços energéticos, enquanto o preço do petróleo se mantiver baixo, talvez algumas das soluções não façam sentido para substituir os motores de combustão. Isto por questões de matemática e racionalidade, já que, relativamente às metas de descarbonização da economia ou imposições legais, pode ser um caminho – mas tenho dúvidas se será o caminho certo!

Relembro, também, que o crescimento da mobilidade elétrica veio exigir das redes elétricas de distribuição um maior esforço (sobrecargas nos ramos ou quedas de tensão excessivas) para permitir o carregamento das dezenas de milhares de baterias dos veículos elétricos. E onde serão os maiores picos de consumo? E em que sistema de consumo? Carregamento lento ou rápido? O caminho, pelo que vou verificando, vai ser, muito provavelmente, o smart charging, em que há uma gestão controlada dos carregamentos. 

Sugiro, se me permitem, num toque eletrizante final, que, como opção primária, seja a energia elétrica limpa (solar) a alimentar a mobilidade elétrica! Vamos ser coerentes?

A falácia do impacto zero - Opinião de Pedro Gil de Vasconcelos

A falácia do impacto zero

Opinião de Pedro Gil Vasconcelos

A segunda década do século XXI traz-nos, entenda-se para a sociedade, novos desafios, sendo certamente o maior de todos o abandono dos velhos hábitos.

Que 2020 é o ano em que ‘normalidade’ ganha toda uma nova dimensão, com a rapidez de alterações e a volatilidade de verdades que o não são e logo depois passam a ser e, por fim, tornam-se realidade, ninguém o pode negar. Por vezes mais parece que estamos no prólogo de algo, ou no momento em que somos testados e treinados, para essa tal nova ‘normalidade’. 

Os tempos actuais a isso obrigam.

Mas é igualmente certo, que apesar de todas as viroses e maleitas da humanidade, há processos que têm que ser repensados e a descarbonização, algo que parecia utópico há meia dúzia de anos, é hoje uma realidade em marcha, cada vez mais empurrada pela situação actual e, por isso, com um horizonte cada vez mais curto.

“Na mobilidade nota-se bem. Novas formas de a entender e aplicar, novas ferramentas e, sobretudo, novas atitudes perante o facto de todos termos de nos movimentar e transportar coisas, levam-nos a entender as necessidades e os impactos que têm nos presentes e nos futuros de todos.”

A pandemia veio acelerar o processo. Os confinamentos, a natural desconfiança de transportes públicos em que o distanciamento social não pode e não é respeitado e a necessidade de locomoção, fizeram com que um veículo bem mais antigo do que o automóvel fosse catapultado para um protagonismo que há uma meia dúzia de anos, não era expectável para o cidadão comum.

No entanto, o sector das duas rodas nacional teve a visão para se preparar, para trabalhar no sentido de ir ao encontro do que o mercado iria exigir. Só não foi possível prever que em 2020 seria ‘assim’, mas os meios de produção, as cadeias de distribuição mais curtas e a liderança em termos de tecnologias aplicadas à bicicleta já estavam cá. Só foi preciso entender que o sector ia trabalhar sem a sazonalidade habitual e que a mão de obra ia ser necessária.

Graças a esse entendimento, hoje Portugal é o maior produtor de bicicletas da Europa, o sector é altamente exportador e a necessidade de mão obra especializada faz com que os salários estejam acima da média da indústria. Ou seja, as oportunidades estão, cumpre-nos trazê-las para o nosso terreiro.

Se este é um bom panorama para as ‘duas rodas’ é-o igualmente para o sector extractivo. Descarbonização significa cada vez mais e maiores necessidades de outras matérias-primas como, metais, semi-metais, inertes, terras raras, etc.

Todos nós entendemos que para fazer um carro é necessário aço, alumínio, mas, no entanto, não há a consciência de que é preciso areia… sim, de areia se faz vidro. No entanto, no caso de um carro eléctrico há as necessidades geradas pelas baterias e a pressão em matérias-primas como o lítio, o níquel e o cobalto. Juntam-se as terras raras, fundamentais para os ecrãs, para magnetos e além disso, ainda mais cobre do que num veículo térmico.

Mas estas são também algumas das matérias-primas fundamentais para, por exemplo, a construção de um gerador eólico e aí as contas do peso têm mais dígitos. 

No fundo, a partir do momento em que um macaco desceu da árvore e decidiu partir a primeira pedra, passou a existir uma coisa nova que muitos milénios mais tarde se chamaria ‘impacto ambiental’.

“Qualquer acção que façamos tem impacto no ambiente e como seres pensantes devemos, antes de mais, entender isso e assim poder decidir o futuro que precisamos, mas também o presente que queremos.”

O movimento gerado por uma fábrica, o buraco de uma mina não são agradáveis para quem com eles convive, mas em contrapartida carregar num botão que virtualmente existe num ecrã e falar para o outro lado do mundo, ter comodidade, internet, medicamentos e vacinas, são realidades apenas possíveis de atingir e de manter porque há indústria, porque há matérias primas e gente que pensa e concretiza.

Neste momento estamos numa encruzilhada. Cumpre-nos escolher e aí há duas opções: varrer para debaixo do tapete e assobiar para o lado, ou seguir a via responsável de reduzir os impactos negativos, pois o impacto zero não existe e se as oportunidades estão aí, então o melhor é trazê-las para o nosso terreiro.

Este texto, por opção do autor, não foi escrito de acordo com as regras do novo Acordo Ortográfico.

Pedro Gil de Vasconcelos é licenciado em Cinema e Audiovisuais, tendo sido jornalista da RTP, onde participou e liderou diversos projetos, muitos deles ligados à mobilidade. Atualmente, lidera a Completa Mente – Comunicação e Eventos Lda.

A Mobilidade Sustentável - Paulo Areal

A Mobilidade Sustentável

Por Paulo Areal, Presidente da Associação Nacional de Centros de Inspeção Automóvel (ANCIA)

A mobilidade sustentável é um tema que, face às crescentes preocupações ambientais, tem adquirido elevada preponderância e discussão na nossa sociedade, na verdade, pretende-se que os cidadãos disponham de condições e escolhas de mobilidade que lhes permita circular de uma forma cada vez mais segura, mas com menor impacto ambiental, reforçando, em consequência, a sua qualidade de vida.

Este enquadramento implica, paralelamente, uma nova cultura de mobilidade associada a uma alteração de comportamentos por parte dos cidadãos e a implementação de políticas a favor de uma mobilidade sustentável, com eficiência energética e reduzidos impactos ambientais.

Na verdade, e não obstante os combustíveis derivados do petróleo continuarem dominantes na nossa sociedade, temos assistido nos últimos anos a uma tendência de viragem no que se refere à utilização da eletricidade no transporte rodoviário e a utilização de meios transporte mais adequados e limpos.

Os transportes são, efetivamente, responsáveis por uma grande parte das emissões de gases com efeito de estufa e contribuem significativamente para as alterações climáticas, tendo as emissões um efeito especialmente nefasto na saúde pública, num contexto em que, sendo o setor dos transportes o menos descarbonizado e ainda dependente dos combustíveis fósseis para satisfazer as suas necessidades energéticas, tornando-se urgente inverter esta realidade e reforçar a atuação neste no domínio.

“Existe, apesar dos esforços, ainda um longo caminho a percorrer no que se refere ao objetivo de alcançar zero emissões, sendo necessário que, paralelamente, seja reforçado o controlo das emissões dos veículos em circulação.”

Dado o objetivo de atingir a neutralidade carbónica até 2050, objetivo este que irá implicar uma transformação do setor dos transportes e uma redução drástica das emissões de gases com efeito de estufa, torna-se necessário promover a oferta de soluções acessíveis e saudáveis aos cidadãos, sendo os veículos elétricos uma opção e um contributo para uma mobilidade sem emissões.

Neste enquadramento, a circulação de veículos com menor impacto ambiental assume uma prioridade cada vez mais crescente na nossa sociedade, assumindo os Centros de Inspeção um papel essencial neste domínio ao controlar as emissões dos veículos a combustão, assim como a conformidade dos veículos híbridos e elétricos aquando da sua apresentação nos Centros de Inspeção para realização da inspeção periódica obrigatória.

Considerando, contudo, a necessidade contínua de reduzir as emissões dos veículos e, consequentemente, reforçar e salvaguardar a saúde pública, os Centros de Inspeção podem dar um contributo adicional neste domínio, designadamente, através da realização de um ensaio específico para controlo das emissões, permitindo, deste modo, acompanhar e controlar anualmente as emissões dos veículos, dando assim resposta às crescentes preocupações ambientais.

O caminho a percorrer é, ainda, longo para atingir a neutralidade carbónica no setor dos transportes, no entanto devemos estar todos envolvidos nesta profunda mudança, tornando-se imperativo uma utilização mais eficiente e sustentável dos recursos, em prol da nossa qualidade de vida e das gerações futuras.

Paulo Manuel Dias Areal é, atualmente, o Presidente da Associação Nacional de Centros de Inspeção Automóvel (ANCIA), associação portuguesa representativa das entidades gestoras de centros de inspeção.
É licenciado em Engenharia Mecânica pelo Instituto de Engenharia do Porto e possui uma Pós-graduação em Engenharia de Segurança.
Integrou os Órgãos Sociais da ANCIA, pela primeira vez, em fevereiro 1995, tendo, desde esta data, desempenhado diversos cargos na associação, designadamente, Vice-Presidente da Direção em 1998, Presidente da Direção em 2001, Presidente da Mesa da Assembleia Geral em 2005, tendo sido eleito Presidente da Direção em 2014 e atual Diretor da Revista da ANCIA.
Para além da sua atividade associativa, desempenhou funções como Administrador da ANIVAP – Agrupamento Nacional de Inspeções e da CITV – Centro Técnico de Inspeções a Veículos S.A., exercendo atualmente o cargo de sócio-gerente em diversas empresas, designadamente, na Dourasil – Inspeções Técnicas de Veículos, Lda.
É ainda formador no âmbito da mecânica automóvel, procedimentos de inspeção e sistema de qualidade dos centros de inspeção e tem participado, como orador, em diversos eventos relacionados com a segurança rodoviária e as inspeções técnicas de veículos a motor.

Geração Z - A Geração Móvel

Geração Z – A Geração da Mobilidade

Opinião de Stefan Carsten

Desafio

Como intervenientes principais de um mercado em rápida mudança, os fabricantes de automóveis têm de se interessar pelas necessidades e desejos futuros das pessoas – especialmente dos clientes que estão a chegar ao mercado. Por esta razão, o Zukunftsinstitut – um think tank de estudos sobre o futuro –, comissionado pela Ford, questionou jovens sobre as suas opiniões e atitudes relativamente à mobilidade. O objetivo do Mobility Zeitgeist Study 2020 era entender melhor a Geração Z. Afinal, a interpretação da mobilidade por parte dos jovens que têm hoje entre 18 e 23 anos significa que novos caminhos terão de ser tomados no futuro. Só assim será possível criar serviços de mobilidade com os quais a Geração Z possa viver.

Conclusão do atual inquérito, com mais de 2 000 pessoas selecionadas aleatoriamente: atualmente, a mobilidade é sinónimo de multimodalidade, flexibilidade e liberdade, mas ao mesmo tempo o automóvel permanece altamente relevante no público-alvo de 18 a 23 anos.

Em detalhe, o estudo mostra o tipo de mentalidade da Geração Z em relação a…

  • Importância e significado da mobilidade e automobilidade: o automóvel continua a ser um componente relevante da mobilidade individual.
  • Mobilidade pós-fóssil: no caminho para uma maior sustentabilidade, os motores a gasolina e diesel são rejeitados pela grande maioria.
  • Procura da mobilidade: utilização das múltiplas possibilidades de mobilidade. Os membros da Geração Z são protagonistas da mudança entre tipos de transporte.
  • Mobilidade partilhada: as novas ofertas ainda precisam de tempo. O alto nível de conhecimento de novos produtos e serviços não resulta ainda num alto nível de utilização.
  • Vida facilitada: a mobilidade porta-a-porta integrada em redes é um desejo importante para o futuro.
  • Equilíbrio trabalho-lazer: a mobilidade deve ser facilitadora de uma cooperação equilibrada entre as duas vertentes.
  • Mobilidade conectada: inovações para uma melhor experiência de mobilidade, mas os dados privados devem permanecer seguros.

Conhecer a Geração Z

A mobilidade, entendida como um todo, goza de um estatuto muito elevado na Geração Z. ‘Estar móvel’ é uma base importante no cumprimento dos seus objetivos de vida e da necessidade de liberdade e flexibilidade. Os valores da Geração Z são complexos e bastante sérios. Giram em torno do sucesso profissional e do valor dos amigos e da família. Na busca pela individualidade num mundo global, as principais prioridades dos jovens, além do desejo por um trabalho com significado e gratificante (83%), são “divertir-se e aproveitar a vida” (83%) e “ter tempo para si e para os seus próprios interesses” (85%). A mobilidade é uma pedra angular importante neste equilíbrio entre trabalho e lazer, que 80% da Geração Z procura, porque para eles a mobilidade é sinónimo de flexibilidade (64%), independência (58%) e liberdade (54%).

A importância do automóvel no mix de mobilidade continua elevada

A Geração Z faz uso das muitas possibilidades de mobilidade. Seleciona os seus meios de transporte de acordo com a forma como melhor se adaptam à sua vida quotidiana no momento. Aqui, o automóvel ainda é muito importante, mas deve ser integrado num estilo de vida ativo e ambientalmente consciente (afinal, 71% dos jovens entre os 18 e os 23 anos já têm carta de condução).

Igualmente importantes para a maioria são os custos globais de mobilidade. Sete em cada dez inquiridos gostariam de ver os preços mais baixos possíveis ou mobilidade a baixo custo. Comprar um carro já não é o objetivo principal da geração mais jovem, uma vez que têm acesso ao automóvel: a Geração Z usa o carro da família ou um carro emprestado. Este estatuto geral do carro aqui e os objetivos de vida da Geração Z também se refletem naquilo que exigem de um carro. Dois terços concordam com a afirmação de que “as viagens de carro em conjunto com amigos são divertidas” (67%). Quase tantos concordam, no entanto, que um carro deve ser, antes de mais nada, prático e funcional (64%) e oferecer o maior número possível de formas ​​de utilização através de interiores adaptáveis (56%).

Quão sustentável é realmente o pensamento da Geração Z?

Os chamados valores sustentáveis, como estilos de vida e de consumo socialmente responsáveis, são considerados importantes por (apenas) 58% dos inquiridos. No geral, contudo, a mobilidade verde é uma grande prioridade entre os jovens adultos: 63% da Geração Z considera os altos padrões ambientais e proteção climática e dos recursos como critérios importantes para garantir que a mobilidade responda realmente às necessidades das pessoas, no futuro. Metade dos inquiridos diz que conduzir um carro ecológico produz uma boa sensação (51%) e está convencida de que deveriam haver mais incentivos para produzir, comprar e utilizar carros elétricos amigos do ambiente (50%).

Artigo de Opinião - Ana Gulías Torreiro

Pontevedra, uma transformação do espaço público

Por Ana Gulías Torreiro

Durante anos, a cidade de Pontevedra passou por uma transformação urbana que melhorou a qualidade de vida de seus moradores. Diversas menções e prémios internacionais vêm endossar o sucesso da experiência, bem como outros efeitos associados, como o aumento de 33% da população num contexto de envelhecimento. Com a pandemia global, muitos pedidos chegam à Câmara Municipal para partilhar a nossa experiência. O artigo pretende dar uma contribuição pessoal sobre a chave para a mudança.

A pandemia global define hoje o ritmo e as rotinas das cidades. Ninguém poderia pensar que neste momento, em que tudo o que acontece parece ser um filme de ficção científica, talvez pudéssemos reabrir o debate sobre a utilização do espaço urbano. Numerosas cidades adotaram medidas rápidas e táticas para alargar as suas ruas e calçadas para a população. De repente, todos percebemos que repensar os espaços urbanos a uma nova escala mais sustentável é urgente.

De uma pequena cidade com quase 85 000 habitantes na Galiza, estamos num projeto há anos partilhado pela vizinhança que revolucionou Pontevedra no passado e que a inseriu num novo plano. Com toda a modéstia, mas também com o orgulho de ter feito uma grande transformação que mudou para sempre a cidade que eu coleciono, o que considero essencial para voltar a recuperar a rua e sentirmo-nos seguros/as e protegidos/as.

Os benefícios desta mudança são múltiplos, como veremos agora, e as razões para agir, mas sem dúvida a razão mais importante é a recuperação do espaço público. Espero que aqueles que aguardavam premissas e fórmulas complexas não continuem desapontados. Nada mais há do que manter firme a intenção de defender o espaço público como um direito de todas as pessoas, independentemente da sua condição física, psíquica e social.

É parte da retórica política, o que é que isso realmente implica? Bem, isto significa tomar a iniciativa e repensar o desenho urbano sem medo do eleitoralismo e com uma estratégia que deve ser pensada juntamente com os habitantes. Por outras palavras, ter a clareza da cidade que queremos.

O espaço público é do direito dos cidadãos e de obrigação da administração, tendo uma importância semelhante à da educação ou saúde. Expulsar as pessoas do espaço público para o deixar disponível para os veículos (de qualquer tipo) é o que tem sido feito em quase todas as grandes cidades sem se avaliar as consequências. O tempo mostrou que essas cidades tornaram-se hoje armazéns de carros e com muito poucos espaços visíveis.

“Pontevedra agiu de forma decisiva há vinte anos e hoje, em tempos de incerteza, volta a ser solicitada para falar sobre sua experiência.”

Com base neste princípio básico, adotamos várias medidas, das quais destaco algumas que moldam, dão sentido e precisam do princípio básico da ação política. Qualquer uma das medidas parecem lógicas e consistentes, uma vez que assumimos a premissa inicial e impossível de levar à prática se o fizermos simplesmente seguindo uma determinada tendência ou moda. (1)
Destaco aqui algumas medidas práticas que foram realizadas nos últimos vinte anos em Pontevedra:

  1. Tornar várias áreas da cidade em zonas pedestres. Não apenas o centro da localidade, comportamento adotado em muitas cidades, mas também em zonas dispersas da restante cidade.
  2. Grande extensão dos espaços das ruas e praças destinadas aos peões. Aumento superior a 1.000.000 m2 em espaços dedicados às pessoas, grande parte retirados à circulação de veículos.
  3. Metade da superfície da rua destinada aos peões, quando esta regra previa calçadas com comprimento mínimo de 2,50 metros. Quando for inferior a 2,50 metros, todas as ruas são pedonais.
  4. Facilitar e promover o uso de espaços públicos para todos os tipos de atividades, que apelidamos de uso plural dos espaços públicos.
  5. Incentivar os meninos e meninas a brincar nas praças e ruas.
  6. Criação de uma política de comunicação, para incentivar a caminhada e uma vida ativa e saudável (metrominuto).
  7. Favorecer, nos espaços públicos, as atividades dos peões, das pessoas, que não são estritamente de mobilidade: permanecer, conversar, encontrar.
  8. Direcionar todas as ações para garantir a autonomia, independência e igualdade das oportunidades para as mulheres no acesso e uso dos espaços públicos.
  9. Instalação de 380 travessias elevadas para peões e pequenos planaltos para dar prioridade aos mesmos, neste caso nas encostas das vias para peões e a implantação universal de guias e margens para reduzir as distâncias a percorrer nas faixas dos peões.
  10. Redução da intensidade do tráfego: redução/eliminação do tráfego de circulação, que atravessava a cidade para outro destino, e do trânsito agitado, pela procura por zonas de estacionamento. Introdução ao conceito de tráfego de necessidade: circulação e estacionamento permitidos para quem precisa, independentemente da sua capacidade económica, não apenas para aqueles que podem pagar.
  11. Redução do limite de velocidade: limite máximo de 30 km/h em toda a cidade (autoestrada à parte) e 10 km/h em zonas pedonais.
  12. Acessibilidade universal ao espaço público.
  13. Máximo esforço na manutenção dos espaços públicos e requalificação de elevada qualidade dos mesmos, principalmente cuidando da iluminação e do mobiliário urbano.
  14. Incentivar a participação nas decisões, especialmente das crianças.

Os resultados foram surpreendentes não só no campo da mobilidade, mas também em diversos outros campos. No meio ambiente, conseguimos reduzir o CO2 em 67%. Também na segurança rodoviária, reduzimos para 0 as fatalidades por atropelamento desde 2011. Conseguimos uma maior autonomia das pessoas com diversidade funcional e independência das crianças que se deslocam sozinhas para a escola em locais seguros. E, claro, uma redução do tráfego na cidade de 53% e de 97% no centro.

Juntamente com outras medidas, Pontevedra recebe menções e prémios internacionais que melhoraram a promoção internacional e que fizeram com que centenas de pessoas viessem a conhecer a cidade.

Sempre que se pergunta a receita, voltamos ao mesmo, com a humildade de procurar e aprender com todas as experiências, contudo adaptando-as às suas próprias, é essencial agir sob o princípio que fundamenta tudo e ser consistente até ao fim, ser corajoso para iniciar o processo de devolução da cidade aos seus vizinhos e vizinhas!

(1) Seleção das medidas incluídas no congresso “Mobilidade e transformação urbana em Pontevedra” de César Mosquera, vereador da mobilidade da Câmara Municipal de Pontevedra e vice-presidente do Conselho Provincial de Pontevedra, na conferência ‘Ludantia’ (Pontevedra, 2019).

Licenciada em Ciências Políticas e Administração, Mestre em Desenvolvimento Local e Regional e Doutorada em Processos Políticos Contemporâneos. Tem experiência na alta direção de empresas públicas (foi técnica do Líder para a região Deza-Tabeirós) e privadas (foi gerente da Sermos Galiza). Entre 2011 e 2015 foi porta-voz do BNG em Forcarei. Atualmente é Porta-voz do Governo, na Câmara Municipal, sendo responsável por:
• Sistema interno, organização da administração e canais de relacionamento com os cidadãos
• Gestão do registo da população municipal
• Promoção e gestão dos processos de recrutamento
• Gestão dos fundos EDUSI
• Promoção da cidade e projeção externa da cidade e da Câmara Municipal
• Grandes eventos desportivos
• A inscrição e modificação no registo municipal de animais potencialmente perigosos

Going Full Electric: The e-Motorcycle Experience - Artigo de Marc Amblard

Going Full Electric: A experiência das motas elétricas

Opinião de Marc Amblard

Para o artigo deste mês, pensei em partilhar a minha própria experiência de mobilidade elétrica. Há três anos, alugámos um Chevrolet Bolt, com a sua autonomia EPA de 383 quilómetros a partir de uma bateria de 60 kWh. Gostei realmente do grupo motopropulsor e da própria experiência com o veículo elétrico. Quando o aluguer terminou, recentemente, substituímos o Bolt por um Tesla Model 3, que oferece uma experiência significativamente melhor. Tinha chegado o momento de nos livrarmos do carro a gasolina que restava em nossa casa. Adquiri uma mota elétrica, a Zero SR13 – a minha sétima mota desde os 16 anos.

Fundada em 2006, a Zero Motorcycles desenvolve e produz vários modelos de motas totalmente elétricas perto de Santa Cruz (norte da Califórnia). O meu modelo, a Zero SR13 de 2017, desenvolve ‘apenas’ 70 cavalos, mas um extraordinário binário de 146 Nm, pesando 188 quilos, quer a bateria de 13 kWh esteja carregada ou não! Isto resulta em 3,3 segundos dos 0 ao 100 km/h. Atualmente, o modelo mais poderoso da Zero, a SR/S, desenvolve 110 cavalos e 190 Nm (229 quilos).

Estes valores de binário não só são muito elevados em termos absolutos, como o binário de ‘pico’ está disponível a qualquer velocidade e é entregue instantaneamente, graças às características intrínsecas dos motores elétricos. Estes valores comparam-se muito favoravelmente aos das motas a gasolina. A moto de produção com maior binário, a Triumph Rocket, com o seu motor de 2 500 cc, é ligeiramente mais forte com 220 Nm, mas pesa 291 quilos, mais a gasolina. A Suzuki Hayabusa (1 300 cc) ‘apenas’ desenvolve 158 Nm (266 quilos). E a BMW? A mota com maior binário da marca alemã, a K1600 de seis cilindros, regista 175 Nm.

A autonomia indicada da Zero SR13 é de 160 a 240 quilómetros, dependendo das condições de condução. Tal como um veículo elétrico a bateria, a autonomia de uma e-moto é maior quando a condução inclui uma combinação de acelerações e desacelerações, por causa da travagem regenerativa. Pelo contrário, rodar na autoestrada resulta numa menor autonomia – e é mais aborrecido! Fiz também menos de 160 quilómetros ao andar de forma agressiva em estradas sinuosas. O carregamento é simples. O cabo fornecido é ligado a uma tomada elétrica de 110 V ou 220 V para carregar a 1,5 kW (3 kW para os modelos mais recentes). A Zero disponibiliza um carregador opcional de 6 kW, permitindo carregamentos de nível 2.

Paralelamente, o custo da energia de uma mota elétrica é uma fração de uma equivalente a gasolina. Uma carga completa custa-me 1,5 dólares (taxa noturna: 0,12 dólares por kWh)! Para um consumo de 62 Wh/km, isto corresponde a 0,65 euros por 100 quilómetros, que compara com os 7,40 euros/100 km (ao preço local da gasolina*) para a desportiva Suzuki Katana Sport. Não só o custo da energia representa 1/10 de uma mota a gasolina equivalente, como também as mudanças de óleo (e, em grande medida, dos calços de travão) desapareceram. No entanto, os pneus traseiros das e-motas necessitam provavelmente de serem substituídos com maior frequência, atendendo ao binário impressionante – com o qual posso dizer que brinco, dado o sorriso que me provoca de cada vez que o faço.

Sim, as motas elétricas ainda são mais caras do que as suas irmãs a gasolina. A atual Zero SR/S, de 14 kWh, custa cerca de 20 000 euros, contra os cerca de 15 000 euros da mota a combustível mais aproximada. Contudo, a tendência negativa observada no custo das baterias de iões de lítio (atualmente, cerca de 120 dólares/kWh, contra 1 000 doláres em 2010) significa que a diferença continuará a diminuir.

As motas da marca Zero estão conectadas, até certo ponto como o meu Tesla. Uma aplicação móvel permite a criação de um modo de condução exclusivo (binário máximo, velocidade máxima, regeneração na travagem, etc.), monitorizar o carregamento, e oferece um painel de instrumentos personalizado. A Zero também disponibiliza atualizações over-the-air – embora não tão impactantes ou frequentes como as da Tesla – que são transmitidas através da aplicação móvel.

A Zero não está sozinha na oferta de motas elétricas. Uma série de start-ups surgiram com um propósito semelhante ao da Zero. No geral, oferecem uma variedade ampla de tipos de motas (cruisers, desportivas, dirt bikes, urbanas…) e preços que oscilam entre os 10 000 dólares e mais de 50 000. Nestas start-ups incluem-se a Lighting, a Fuell e a Voltu – a Alta Motors faliu pouco depois do investimento da Harley Davidson. Na Europa, encontramos a Energica e a Tacita em Itália, a Essence em França e a Arc no Reino Unido. A China também está na corrida, com a Evoke e a Socco. Todavia, a Zero é o player dominante, num papel semelhante ao da Tesla.

E quanto às marcas clássicas? A Harley Davidson é, provavelmente, a última que eu esperava que oferecesse uma e-mota. No entanto, esta marca – e a KTM austríaca – foram a primeiras e, até agora, as únicas a fazê-lo. Introduzida no mercado em 2018, a LiveWire não é um produto tão convincente como o seu equivalente da Zero. Por 30 000 dólares, é cerca de 40% mais cara que a Zero SR/F, mais pesada e regista uma autonomia mais curta, mas é mais rápida a chegar aos 100 km/h. A KTM lançou duas dirt bikes elétricas, com preços abaixo de 10 000 dólares, e ainda não disponibilizou as suas equivalentes urbanas.

Surpreendentemente, nem a BMW nem as quatro gigantes japonesas – Honda, Kawasaki, Suzuki e Yamaha – têm uma e-mota no mercado. No ano passado, os quatro concorrentes asiáticos anunciaram uma parceria para desenvolver baterias substituíveis para motocicletas elétricas, o que poderia abrir caminho para uma muito maior e necessária ambição. A BMW apresentou um conceito em 2019, mas ainda não anunciou a produção de uma mota elétrica.

Eu costumava ser ‘viciado em gasolina’ – o segundo carro que comprei foi um Corvette. Porém, o prazer de conduzir ou andar de automóvel ou mota elétrica – que facilmente faz esquecer o som das rotações de um motor –, combinado com a minha dedicação à mobilidade limpa, fez-me trocar a gasolina pelos eletrões. E não volto atrás! A eletrificação das motas está a atrasar-se, relativamente aos veículos de passageiros, mas suspeito que irá recuperar assim que as marcas clássicas colocarem os seus produtos no mercado.

Nota: Este artigo não é patrocinado pela Zero Motorcycles. O valor assumido para o custo da gasolina é de cerca de 1,40 euros/litro, registados na área de Paris.

Fotografia de Marc Amblard

Marc Amblard é mestre em Engenharia pela Arts et Métiers ParisTech e possui um MBA pela Universidade do Michigan. Radicado atualmente em Silicon Valley, é diretor executivo da Orsay Consulting, prestando serviços de consultoria a clientes empresariais e a ‘start-ups’ sobre assuntos relacionados com a transformação profunda do espaço de mobilidade, eletrificação autónoma, veículos partilhados e conectados. Publica mensalmente uma newsletter relacionada com a revolução da mobilidade.

Falemos de Cavalos - Pedro Gil

Falemos de Cavalos

Opinião de Pedro Gil Vasconcelos

Hoje em dia, a discussão entre emissão zero e motores térmicos está mais fraturada do que nunca. De um lado estão os acérrimos defensores da mobilidade descarbonizada, com comportamentos, no extremo, de tribo urbana. Do outro estão os defensores dos motores térmicos, com comportamentos igualmente de tribo. Pelo meio uma serie de consumidores que vão optando por um lado ou por outro, de acordo com as “modas” ou que, cada vez mais esclarecidos e isso acontece com publicações como esta, ou a realização de eventos como o próximo Salão do Automóvel Híbrido e Elétrico, no Porto, optam de forma consciente.

Entendo ainda que há quem perceba que a mobilidade, como estivemos habituados a conhecer, vai ser cada vez mais algo do passado e os comportamentos vão-se alterar, os próprios automóveis vão passar a ser outra coisa e isso não têm que ser necessariamente más notícias para a tribo urbana dos motores térmicos.

Por tudo isto, hoje prefiro falar de cavalos. Não de unidades de potência, mas sim dos animais, pois acho que os automóveis, vão ser cada vez mais como os cavalos… e agora convém explicar.

O cavalo foi a besta que carregou a evolução humana. Dificilmente algum outro animal teve um impacto tão grande ao longo da história e foi o motor de quase tudo o que conhecemos até ao Século XX.

É certo que nesta altura já alguns leitores devem estar a chamar-me nomes, pois o cão é o melhor amigo do homem. No entanto eu contraponho que o cão nunca carregou tanto como um cavalo, nunca puxou um arado, nunca ficou horas e horas a andar à roda para tirar água de um poço, ou levou o homem para a guerra, que ganhou ou perdeu, juntamente com esse homem. O cavalo positivamente puxou e carregou a nossa história.

É igualmente certo que hoje vemos os cavalos como um animal belo, capaz de ser rápido nas pistas, elegante nos concursos, um animal precioso, pois um bom puro-sangue vale milhares e milhares de Euros. No entanto, nem sempre foi assim.

Os cavalos, tal como os nossos avós conheceram, eram as tais bestas de carga, tantas vezes mal tratados, tantas vezes feios e cheios de moscas. Esses desapareceram quase totalmente com o advento do século XX e ficaram os outros, os belos, os puros sangue, os tais que podem, que valem fortunas.

As bestas que carregaram tudo e mais alguma coisa desde o neolítico até há uns oitenta anos, foram rapidamente substituídas por máquinas. Ou seja, em meia dúzia de décadas, desapareceram aqueles que foram os “motores” do desenvolvimento por algumas centenas de séculos e agora estamos a assistir a algo semelhante, mas com outros protagonistas e muito maior rapidez.

O automóvel é apelidado como “a mais bela máquina” e concordo, só não concordo totalmente. Por cada máquina que é de facto verdadeiramente bela, por cada automóvel que nos provoca um arrepio, um eriçar de cabelos da nuca, por cada automóvel que tem um trabalhar digno de uma sinfonia, que tem interiores que fazem inveja às mais luxuosas mansões, há uns mil ferrugentos, ruidosos… fumarentos que se arrastam penosamente pelas nossas estradas.

Ora, a histórias prova-nos que estas revoluções são boas, pois o que sobra é o que é genuinamente bom. São os tais cavalos que competem, que são elegantes, que são belos e isto só podem ser boas notícias para os verdadeiros apreciadores de automóveis. Vá lá façam as pazes com a outra tribo, apesar de tudo vamos ter que nos continuar a mover de um lado para o outro e aquelas máquinas de que gostamos, não vão servir para carregar a nossa civilização às costas.

Pedro Gil de Vasconcelos é licenciado em Cinema e Audiovisuais, tendo sido jornalista da RTP, onde participou e liderou diversos projetos, muitos deles ligados à mobilidade. Atualmente, lidera a Completa Mente – Comunicação e Eventos Lda.

Opinião de José Carlos Pereira

Mobilidade, investimento público, criatividade… E agora?!

Opinião de José Carlos Pereira

O investimento público parece que vai, finalmente, aumentar nesta proposta de orçamento para 2021. Mas note-se que parte de valores absolutos muito baixos nos últimos anos – crescer de uma base baixa é crescer, embora… pouco. Ele está, a título de exemplo, muito abaixo de valores como os de 2010. E eu sempre preferi ‘melhor Estado’ do que ‘mais Estado’. Julgo que não há muito nem pouco: há é o orçamento que seja reprodutível e com efetividade.

Reconheço, no entanto, os valores miseráveis de investimento público dos últimos orçamentos, colocando em causa a própria manutenção de muitas infraestruturas e uma visão futura da mobilidade. E é sobre isso que queria deixar algumas reflexões, pois uma boa fatia desse investimento vai para a mobilidade – são montantes de investimento na área da mobilidade sustentável de mais 450 milhões de euros em 2021. E, pelo menos no plano de intenções, em 2022 o Governo prevê também uma subida para quase 800 milhões de euros de investimento na mobilidade mais suave e sustentável.

Relembro que a nível global, segundo os últimos estudos, as cidades ocupam 2% do nosso planeta; nelas habita mais de metade da população mundial (55%); consomem 75% da energia e são responsáveis por 80% das emissões de dióxido de carbono (CO2). Já refletiu sobre estes números?

“Os principais eixos do novo paradigma para as cidades e mobilidade são: (1) Mobilidade sustentável em cidades mais verdes; (2) Reforço da oferta de soluções de mobilidade ativa nas cidades e reorganização da circulação; e (3) Novas soluções de logística urbana.”

Será que o paradigma da mobilidade nas cidades vai mudar com a eletrificação progressiva da frota automóvel? A crescente utilização de transportes públicos e de bicicletas já é uma tendência – para não falar na menor mobilidade das pessoas com a diminuição de deslocações, isto se alguns hábitos de teletrabalho forem adotados. Além disso, ainda ontem, com um grupo de vendedores de automóveis, se discutia o crescimento gradual da chamada “economia partilhada”, que atrai especialmente as novas gerações, mais inclinadas a pagar para ter acesso a coisas (como um automóvel) do que a serem proprietárias dessas coisas. As mudanças de paradigma podem ser retratadas assim: “Um peixe só dá conta de que precisa de água quando está fora dela”.

E neste ‘novo diferente’, no pós-pandemia, qual será o papel dos veículos elétricos?

Julgo que há muito a fazer, no que diz respeito à sustentabilidade, e quem identificar e conseguir ler as tendências poderá ter grandes oportunidades para aproveitar (as melhores oportunidades surgem da resolução de grandes problemas). A falta de espaço nas cidades é um problema; a mobilidade elétrica não é suficiente como solução, mas a mobilidade partilhada e os transportes públicos podem ser um caminho nesse sentido.

Acredito mesmo que a mobilidade partilhada não seja uma ameaça aos fabricantes, mas tem de ser aproveitada com criatividade. O setor tem de mudar a abordagem, com uma oferta de produtos e serviços inovadora, que siga as tendências e os desejos dos consumidores. Antecipação é a chave! E transformar uma simples transação numa experiência com benefícios para o utilizador também pode ser.

“Os tempos que estamos a viver podem fazer com que utilizemos os nossos recursos de forma mais racional, além de soluções que a tecnologia já nos faculta, mas que não estamos ainda a vislumbrar.”

Acredito que a criatividade é mais relevante que o próprio conhecimento e a tecnologia disponível. Poderemos estar a imprimir, felizmente, algumas mudanças em meses que, em tempos normais, demorariam anos. Aqui a multimodalidade pode também dar cartas – cada vez mais a tendência vai para soluções integradas, que permitem às pessoas conjugar vários meios de transporte complementares, numa mesma viagem, com um título de transporte único. 

Para terminar, deixo-vos uma história na primeira pessoa. No mês passado, e quando se discutia sobre um dos maiores mitos da mobilidade elétrica – que é mais cara, generalizando –, perguntei: “É mais cara comparada com o quê? Isso é um argumento ou um facto?” O meu interlocutor ficou pensativo. Eu respondi com um facto – dei o exemplo de uma empresa que passou toda a sua frota para carros elétricos, aproveitando os incentivos fiscais em vigor, estando neste momento a poupar 50% no seu cash flow.

Vamos mudar a visão de “o que a mobilidade pode fazer por mim” para “o que eu posso fazer com a mobilidade”? 

Opinião de Francisco Albuquerque

As novas oportunidades de negócio das estações de serviço do futuro

Opinião de Francisco Albuquerque, Presidente da Direção da ANAREC – Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis

Vivemos numa época em que a consciencialização sobre a responsabilidade ambiental tem levado, em todo o mundo, mas principalmente no mundo ocidental, a uma discussão generalizada sobre a necessidade de promover uma transição para fontes de energia menos poluentes.

Esta transição energética é já uma realidade, que deve ocorrer de forma gradual e faseada, principalmente no sector dos transportes e dos combustíveis, onde iremos assistir a um impacto direto na rede dos postos de abastecimento, que terá necessariamente que adaptar-se à nova era.

“O posto do futuro será, provavelmente, uma oferta de mix energético e de um mix de serviços.”

A mudança não passará exclusivamente pela eletrificação da mobilidade, mas antes por uma lógica de oferta variada, como é o caso do hidrogénio, do GNV, do GPL, e de combustíveis cada vez menos poluentes, como todos os estudos internacionais indicam.

A realidade portuguesa conta com cerca de 3.500 postos de abastecimento de combustíveis. Destes, 350 vendem GPL Auto, e 10 vendem GNV (GNC e GNL), com tendência a aumentar. O hidrogénio ainda está numa fase muito embrionária em Portugal, com um projeto piloto previsto para 2021. 

Entretanto, há a expetativa, por parte dos operadores, que o Governo venha a apostar nestas energias alternativas, oferecendo benefícios fiscais, à semelhança do elétrico, uma vez que cada vez há mais indicadores que a aposta apenas nesta solução não irá ser viável na prática.

“Considero que ainda estamos numa fase inicial de criação de infraestruturas de postos de carregamento, sendo que os carros movidos apenas a eletricidade representam somente 4% do parque automóvel nacional, embora com tendência a aumentar.”

Relativamente aos serviços, constatamos que atualmente os postos vendem muito mais do que gasolina e gasóleo. Hoje os serviços conexos, como as lojas de conveniência/cafetarias, centros de lavagem automóvel, lavandarias self-service, entre outros, correspondem a uma fatia cada vez mais relevante da rentabilidade dos postos, com novos serviços a surgirem.

Não sendo previsível que haja alterações muito significativas a curto/médio prazo, bem uma alteração do paradigma da mobilidade e a subsequente necessidade de ajuste imediato a uma nova realidade, estamos convictos que esta adaptação (necessária) dos postos de abastecimento traz com ela alguns desafios, mas também várias oportunidades de negócio.

Novas formas de Mobilidade - Stefan Carsten

‘Corona-mobilidade’: o futuro do transporte público

Opinião de Stefan Carsten

A crise do transporte público

Todos os dias, milhões de pessoas utilizam o transporte público para se deslocarem para o trabalho. Estas rotinas diárias foram abruptamente interrompidas pela pandemia do coronavírus – e um regresso à velha normalidade é dificilmente imaginável para muitos. Desde o surto do vírus na Alemanha, as vendas de bilhetes e passes mensais caíram 70 a 90 por cento. O BVG de Berlim, por exemplo, registou uma quebra de 70 a 75 por cento, enquanto o MVV em Munique caiu até 85 por cento. Como resultado, os serviços foram emagrecidos, linhas inteiras de elétrico e de metro foram descontinuadas e a frequência dos serviços foi reduzida. No entanto, mantiveram-se grande parte dos custos fixos; por exemplo, para manter o serviço para o pessoal médico.

Portanto, esta é a questão que se coloca no futuro: como é que o transporte público se pode modernizar depois da crise, se nem as empresas nem as entidades municipais têm fundos para isso? Uma possibilidade é tornar o sistema tarifário mais dinâmico, por exemplo, variando os preços nos horários de maior tráfego, noturnos ou fins-de-semana. Outra é oferecer serviços de mobilidade públicos e privados, integrados e combinados, a preços fixos.

A mobilidade conscienciosa conduz à multimodalidade

Grande parte da nossa cautela atual relativamente a multidões dissipar-se-á com o tempo. Após a gripe espanhola (1918-1920), com uma estimativa de 500 milhões de infetados e 50 milhões de mortos, demorou cerca de cinco a seis anos para as pessoas se acostumarem a viajar de comboio novamente – mas fizeram-no. Mesmo depois da pandemia da COVID-19, o transporte público voltará a ser a espinha dorsal da mobilidade urbana a médio e longo prazo. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas serão mais conscienciosas nas suas decisões de mobilidade: reagirão mais rapidamente, e de forma mais decisiva, à atualidade noticiosa e adaptarão o seu comportamento. Para garantir que os passageiros são transportados em segurança, é necessária uma comunicação abrangente e direcionada da situação de saúde por todos os atores da mobilidade, mas especialmente pelos operadores de transportes públicos e autoridades locais. Sobretudo em tempos de crise, os passageiros terão de poder confiar nas empresas de transporte.

A operadora Keolis, em Lyon, tem-se destacado neste aspeto. Durante a pandemia, a Keolis destacou um grande número de funcionários para apoiar a introdução e implementação das rígidas medidas de higiene nos meios de transporte. A comunicação direta com os passageiros sobre as medidas implementadas conduziu a uma utilização mais eficiente dos transportes públicos e aumentou, de forma sustentada, a confiança dos utilizadores no operador.

No futuro, uma utilização mais conscienciosa da mobilidade também significará renunciar conscientemente à mobilidade – incluindo a utilização do transporte público. Trabalhar a partir de casa tornou-se a norma durante o confinamento, o que originou numa redução drástica do volume de tráfego. A distância média diária percorrida entre o final de fevereiro e o final de março caiu 47 por cento. Mesmo após o fim da crise, muitas empresas continuarão a permitir horários de trabalho no domicílio mais generosos – e, assim, também tornar a situação do trânsito nas cidades um pouco mais amigável. Ao mesmo tempo, mais e mais funcionários exigirão mais horas de trabalho a partir de casa, se considerarem o transporte público inseguro. Assim, a renúncia à mobilidade, que foi forçada durante o período de confinamento, também aumentará os níveis individuais de liberdade na normalidade pós-corona.

O transporte público está a sofrer enormemente com a crise. A ausência de receitas dificultará o investimento das autoridades locais a longo prazo, especialmente numa altura em que os utilizadores se estão a tornar mais cuidadosos na escolha do transporte – as viagens estão a ser suspensas, adiadas ou efetuadas em meios de transporte alternativos. A indústria deve, portanto, pensar mais afincadamente, em termos de empreendimentos cooperativos que envolvam atores privados, a fim de oferecer aos clientes uma cadeia de mobilidade abrangente e segura. Além disso, a visão de um serviço de transporte público gratuito deixará de ser utópica. Quando pararmos de falar sobre as restrições financeiras, e mais sobre o conceito de mobilidade, entenderemos o quão fascinante e ousada é esta visão. Não é mais do que o pré-requisito para criar uma sociedade móvel no futuro.