Opinião de Stefan Carsten
A crise do transporte público
Todos os dias, milhões de pessoas utilizam o transporte público para se deslocarem para o trabalho. Estas rotinas diárias foram abruptamente interrompidas pela pandemia do coronavírus – e um regresso à velha normalidade é dificilmente imaginável para muitos. Desde o surto do vírus na Alemanha, as vendas de bilhetes e passes mensais caíram 70 a 90 por cento. O BVG de Berlim, por exemplo, registou uma quebra de 70 a 75 por cento, enquanto o MVV em Munique caiu até 85 por cento. Como resultado, os serviços foram emagrecidos, linhas inteiras de elétrico e de metro foram descontinuadas e a frequência dos serviços foi reduzida. No entanto, mantiveram-se grande parte dos custos fixos; por exemplo, para manter o serviço para o pessoal médico.
Portanto, esta é a questão que se coloca no futuro: como é que o transporte público se pode modernizar depois da crise, se nem as empresas nem as entidades municipais têm fundos para isso? Uma possibilidade é tornar o sistema tarifário mais dinâmico, por exemplo, variando os preços nos horários de maior tráfego, noturnos ou fins-de-semana. Outra é oferecer serviços de mobilidade públicos e privados, integrados e combinados, a preços fixos.

A mobilidade conscienciosa conduz à multimodalidade
Grande parte da nossa cautela atual relativamente a multidões dissipar-se-á com o tempo. Após a gripe espanhola (1918-1920), com uma estimativa de 500 milhões de infetados e 50 milhões de mortos, demorou cerca de cinco a seis anos para as pessoas se acostumarem a viajar de comboio novamente – mas fizeram-no. Mesmo depois da pandemia da COVID-19, o transporte público voltará a ser a espinha dorsal da mobilidade urbana a médio e longo prazo. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas serão mais conscienciosas nas suas decisões de mobilidade: reagirão mais rapidamente, e de forma mais decisiva, à atualidade noticiosa e adaptarão o seu comportamento. Para garantir que os passageiros são transportados em segurança, é necessária uma comunicação abrangente e direcionada da situação de saúde por todos os atores da mobilidade, mas especialmente pelos operadores de transportes públicos e autoridades locais. Sobretudo em tempos de crise, os passageiros terão de poder confiar nas empresas de transporte.
A operadora Keolis, em Lyon, tem-se destacado neste aspeto. Durante a pandemia, a Keolis destacou um grande número de funcionários para apoiar a introdução e implementação das rígidas medidas de higiene nos meios de transporte. A comunicação direta com os passageiros sobre as medidas implementadas conduziu a uma utilização mais eficiente dos transportes públicos e aumentou, de forma sustentada, a confiança dos utilizadores no operador.
No futuro, uma utilização mais conscienciosa da mobilidade também significará renunciar conscientemente à mobilidade – incluindo a utilização do transporte público. Trabalhar a partir de casa tornou-se a norma durante o confinamento, o que originou numa redução drástica do volume de tráfego. A distância média diária percorrida entre o final de fevereiro e o final de março caiu 47 por cento. Mesmo após o fim da crise, muitas empresas continuarão a permitir horários de trabalho no domicílio mais generosos – e, assim, também tornar a situação do trânsito nas cidades um pouco mais amigável. Ao mesmo tempo, mais e mais funcionários exigirão mais horas de trabalho a partir de casa, se considerarem o transporte público inseguro. Assim, a renúncia à mobilidade, que foi forçada durante o período de confinamento, também aumentará os níveis individuais de liberdade na normalidade pós-corona.
O transporte público está a sofrer enormemente com a crise. A ausência de receitas dificultará o investimento das autoridades locais a longo prazo, especialmente numa altura em que os utilizadores se estão a tornar mais cuidadosos na escolha do transporte – as viagens estão a ser suspensas, adiadas ou efetuadas em meios de transporte alternativos. A indústria deve, portanto, pensar mais afincadamente, em termos de empreendimentos cooperativos que envolvam atores privados, a fim de oferecer aos clientes uma cadeia de mobilidade abrangente e segura. Além disso, a visão de um serviço de transporte público gratuito deixará de ser utópica. Quando pararmos de falar sobre as restrições financeiras, e mais sobre o conceito de mobilidade, entenderemos o quão fascinante e ousada é esta visão. Não é mais do que o pré-requisito para criar uma sociedade móvel no futuro.