Opinião de José Carlos Pereira
Todos sem exceção, em algum momento da nossa vida e carreira profissional, tivemos de fazer uma venda, ou vamos ter de a fazer. Seja uma ideia, uma proposta, um projeto, ou nós mesmos como pessoa. Ou melhor, alguém nos comprou alguma coisa. E para existir uma venda alguém teve de comprar!
E outro dado relevante é que as skills em vendas automóveis são todas passiveis de serem desenvolvidas com treino. E só vai a jogo quem treina. E treinando muito com uma boa direção podemos nos tornar especialistas em vendas.
Deixo o exemplo de um empresário (dono de um concessionário ou marca) que tem de fazer todos os dias 3 vendas – para a sua equipa, para o mercado (clientes) e para ele próprio. Julgo que a grande questão é ter ficado, infelizmente, enraizado ao longo do tempo na cabeça das pessoas, que quem vende está a obrigar alguém a comprar algo que não precisa. E essa é uma falsa questão. Isto quando a venda é integra, honesta e está a ajudar alguém a tomar uma melhor decisão, mais acertada e ajustada às suas necessidades. Um vendedor de automóveis é um consultor de compras que ajuda no processo de decisão de quem tem uma necessidade. E por incrível que pareça todas as várias interações que temos num dia envolvem de alguma forma uma venda.
Como faz parte do meu modelo de abordagem, aqui na revista Green Future e para arrumar melhor as ideias, vou separar alguns temas em 7 ‘gavetas’.
#1 Agir como um vendedor, mas pensar como um cliente: as pessoas compram um carro por duas razões. Ou têm uma necessidade de mobilidade que precisa de ser resolvida, ou têm uma necessidade pessoal que precisa de ser satisfeita (status). A tarefa de quem vende é saber o que está por trás dessa motivação e o que os levará a decidir. Quem se envolver nessa compra e decisão é estudado antes mesmo de preparar uma proposta? Quais as necessidades latentes e escondidas na compra de um carro? Quais são os vários perfis envolvidos na compra (quem compra, decide, paga, influencia, utiliza ou mesmo sabota)? Que perguntas eu posso elaborar para as descobrir? E como posso avaliar aquilo que não é visível, mas vai influir na decisão?
#2 Treinar algumas competências funcionais: quais as pessoas experts em vendas de automóveis que está a seguir como inspiração (outros vendedores)? Que pessoas realmente excelentes em comunicação são referências e que podem ser modeladas a si? Será possível desenvolver competências funcionais, do tipo ir ao ginásio todos os dias com boas práticas, para ganhar músculo em vendas? O treino funcional num ginásio depende de exercícios que imitam as ações em que nos podemos envolver durante o nosso dia-a-dia. Da mesma forma, no treino de vendas podemos procurar atividades nas quais já estamos envolvidos, como sessões práticas, para desenvolver competências em vendas. Já pensou nisto? Será que podemos, então, treinar interação para a relação, empatia para a ‘ligação’, criatividade para encontrar soluções e comunicação para ser mais eficaz? Sim, com um foco intencional e um pouco de planeamento no treino para desenvolver estas skills todos os dias.
#3 Saber esperar por resultados e não procrastinar: mesmo com um bom treino e uma boa direção (aconselhamento, formação e apoio de outros) por vezes os resultados demoram. Por vezes falhamos pois não lemos mais um livro, não visualizamos mais um vídeo ou mais um artigo. A linguagem corporal, por vezes ignorada e com um peso de 60% na nossa comunicação em vendas, é de extrema relevância em todo o processo – vale 4 vezes mais que o conteúdo, as palavras e argumentação. Escutar, mais do que simplesmente ouvir, é uma arte, logo espere pacientemente pela sua vez de entrar em jogo em termos de comunicação num processo de compra. Durante o discurso do comprador estar atento à sua linguagem corporal é muito importante, pois transmite informações para além das palavras. E ter sempre presente que a as palavras podem mentir, mas o corpo não.
#4 Fecho sempre em mente: a venda de um automóvel é um processo de várias etapas, e o fecho é uma delas. O fecho deve ser um processo natural de influência e não uma persuasão bruta. Logo, é uma consequência do processo depois de percorrido um caminho. Interpretar os sinais de compra ajuda a descobrir o momento certo para fechar. Vender é namorar, é flirting entre ambas as partes, e o que melhor dominar as regras à partida vai ter resultados (que devem ser divididos por ambas as partes no processo). A pressão e a força levam ao afastamento e à resistência, e não à aproximação desejada.
#5 Pensar no médio e longo prazo: os números de negócios não fechados será umas 10 vezes superior ao número de negócios realmente conseguidos (10 carros em processo de compra para vender 1, ou menos). A consistência dos resultados é o segredo, mas nem sempre conseguimos estar em cima, para mais quando o enquadramento não nos favorece (caso atual de potencial retração económica e consumo de bens duradouros como os automóveis). A diferença é que vendedores que não conhecem os ciclos facilmente vão abaixo e não têm capacidade de recuperar dos maus resultados emocionalmente, provocando ainda piores performances. Sem confiança não há venda. E estamos em tempos de ‘aguçar’ o engenho. As vendas também obedecem a ciclos, a altos e baixos… o segredo está em ser consistente e tentar estar quase sempre ‘em cima’, pois sempre é utópico.
#6 Mostrar empatia e entender as necessidades: somos energia, e a atitude vale bem mais que as aptidões e o conhecimento. Na compra de um carro as pessoas compram benefícios, sejam eles funcionais, emocionais ou sociais (mais que as características puramente técnicas). Vender é encontrar algo com que as pessoas se importem e beneficiá-las; logo, pense e aja como pessoa – humanize a relação comercial e fale sempre ao coração e às ‘dores’ do seu cliente. Esqueça o que o carro é, e pense mais no que o carro faz (ou que vai fazer pelo cliente…qual será a sua melhor versão, como pessoa, depois de o adquirir?).
#7 Princípios básicos a ter sempre presente: um dos fatores críticos de sucesso em vendas é a capacidade de recolher e fornecer informações num formato tal que o cliente, em potencial, deseje fazer negócios connosco, porque simplesmente reconhece a nossa autoridade no ecossistema automóvel. A nossa proposta de valor, o preço e os benefícios do que oferecemos são relevantes, mas nada disto importa, a menos que consigamos comunicar e nos façamos ouvir por quem compra (de que serve comunicar quando não atingimos quem queremos atingir?). Logo, temos de estar incrivelmente sintonizados (rapport) com o potencial comprador e entender o que ele quer efetivamente quando nos diz algo, ou quando mesmo nada nos disser (por vezes, ler aquilo que não é dito é relevante)! Precisamos de saber como eles se movimentam no processo de decisão, com o que eles realmente se importam da nossa proposta de valor.
O importante para quem quer vender um automóvel não é ter razão, mas sim atingir um certo objetivo. Estando certo que um ‘não’ nunca é pessoal, mas sim circunstancial. Quando não sabemos o que queremos atingir numa venda ou negociação, qualquer caminho serve. Interessante é concentrar a nossa energia naquilo que queremos que aconteça e não naquilo que não queremos, pois grande maioria das pessoas é hábil em nos apresentar uma grande lista do que não quer. Para isso, e para quem ainda não se sentir vendedor antes de o realmente ser, colocar a si mesmo estas questões pode ajudar: O que é que eu quero? Onde é que estou relativamente ao que quero? Como eu chego lá?
José Carlos Pereira é engenheiro do ambiente, com MBA Executivo em Gestão Empresarial. É business expert, consultor, formador e speaker na área comercial e de negócios internacionais.